MT tem 140 índios na universidade: 'Temos que conhecer as leis'

http://goo.gl/U3EXkg | O índio chiquitano Soilo Urepe Shue, de 32 anos, que cursa o 7º semestre de psicologia na Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), no campus de Cuiabá, se divide entre dois mundos: a cidade e aldeia. '"Estou aqui [na cidade] e lá [na aldeia] ao mesmo tempo, não tem como me desvincular”, disse. A tribo dele fica em Porto Esperidião, município a 358 km de Cuiabá, e a intenção dele é concluir o curso para retornar à aldeia. Ele faz parte de um grupo de 140 indígenas que, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), fazem curso superior.

Ele disse ter se mudado para a cidade diante do desejo de defender os direitos dos indígenas. Nas aldeias, os índios estão sujeitos às leis do 'homem branco', na avaliação do universitário. "Na cidade, temos a oportunidade de conhecer as leis que regem nossos direitos e defendê-los", afirmou. Para ele, houve um retrocesso em relação às questões indígenas no estado.

“Estamos sendo estrangeiros dentro do nosso próprio território. Na Constituição está tudo garantido, mas os interesses econômicos estão sempre tentando acabar com nossos direitos. Só que, enquanto o último guerreiro estiver vivo, estaremos lutando”, declarou.

Os conflitos territoriais é um dos principais desafios a ser vencido. A tribo de Soilo fica em uma região de fronteira com a Bolívia. "Existe muitos conflitos com os fazendeiros e ficamos numa situação muito complicada. Inclusive, a maioria das fazendas pertence a políticos", relatou.

No último mês, a tribo de Soilo foi invadida por um fazendeiro que alegava ser dono do território. Segundo o chiquitano, houve violência durante a ocupação. “Se fosse um indígena que fizesse qualquer coisa desse tipo, esse seria preso  e torturado”, completou.

A princípio, o choque entre os dois mundos assustou o estudante. “A gente passa a viver em dois mundos: o natural, dentro da aldeia; e o outro da cidade. Não é fácil”. Ele conta que na tribo, o silêncio e a tranquilidade são elementos tão importantes quanto o respirar, e o primeiro passo ao chegar na cidade é a adaptação.

Na cidade, Soilo e outros indígenas que estudam em Cuiabá tiveram que driblar o preconceito. “Não vi um índio que não tenha reclamado de preconceito aqui", afirmou. Ele narra um fato vivido por outro índio dentro da sala de aula. "Em um episódio sumiu duas canetas dentro na sala e o professor chegou a pedir que todos os alunos saíssem da sala e o deixasse somente com os indígenas da sala que, em minutos, ele descobriria com qual estava”, afirmou.

O indígena cita a necessidade de corrigir as políticas públicas de permanência na universidade. “Hoje existe esse tipo de política, mas ela não é pontual. Quando chegamos na cidade, temos que alugar casa, temos água e luz para pagar. E quando fazemos um curso integral não há tempo para trabalhar então dependemos das bolsas", contou. Segundo ele, os repasses do auxílio atrasam e causa constrangimento com o dono da casa, por exemplo.

O sonho de Soilo é ver os povos indígenas em paz, de forma especial os da etnia chiquitana que estão em conflito constante, e que os índios se encontrem nas ruas não somente para protestar e reivindicar, mas para festejar e comemorar as conquistas.

Segundo o coordenador regional da Fundação Nacional do Índio (Funai), Benedito César Garcia Araújo, em Mato Grosso existe 36.317 índios de 43 etnias. Dados da instituição apontam que a extensão das terras ocupadas pelos indígenas corresponde a 13% do território do estado.

Para ele, a demarcação de terras é o maior desafio dos índios. “Eles moram numa área onde não se pode plantar com máquinas. Existe a necessidade de políticas públicas voltadas para a utilização da terra para que eles possam sobreviver por conta própria”, afirmou.

Fonte: G1
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