http://goo.gl/PFVznp | A juíza Laurie White, ex-promotora e ex-advogada criminalista, de tanto frequentar prisões, descobriu que os melhores agentes de transformação de presos em pessoas prontas para reingressar na sociedade são aqueles que estão sempre por perto: os outros presos. Mais precisamente, aqueles que têm alguma coisa para ensinar. Curiosamente, os que foram condenados à prisão perpétua.
Junto com um colega, o juiz Arthur Hunter, ela criou um programa de ressocialização de prisioneiros na “Penitenciária de Angola”, considerada a prisão mais “infame e brutal” dos EUA. A penitenciária fica em Louisiana, o estado que tem “a taxa de encarceramento mais alta do mundo”, de acordo com uma entrevista que ela concedeu ao Jornal da ABA (American Bar Association).
O programa se destina apenas a condenados a menos de 10 anos de prisão, porque esses irão voltar para a sociedade mais cedo, sob um alto risco de reincidência no crime, se não estiverem preparados para recomeçar a vida como cidadãos normais.
Ao entrar no programa, o novo prisioneiro recebe um mentor social, um mentor educacional e um mentor vocacional — na maioria, gente que passa algumas horas na prisão e vai embora para casa. Porém, os principais mentores acabam sendo os antigos prisioneiros, muitos deles sem esperança de saírem vivos da prisão.
A teoria da juíza é que, na maioria dos casos, nenhum dos dois — nem o novo prisioneiro, nem seu colega-mentor — tiveram, na vida, uma figura paterna para orientá-los. No decorrer do relacionamento entre os dois, o prisioneiro-mentor acaba se tornando uma figura paterna para o aprendiz.
Além disso, pelo fato dos dois estarem no mesmo barco, a “autoridade” do prisioneiro-mentor é mais facilmente aceita por seu pupilo. “Há um claro respeito por essa nova figura paterna. É muito mais fácil um preso ouvir e aceitar o que outro preso mais experiente lhe diz, do que qualquer outra pessoa de fora”, disse a juíza ao jornal.
O mentor coordena os estudos do pupilo, do primeiro ao segundo grau – uma espécie de curso supletivo, que rende um diploma. E, o principal, se encarrega de um curso profissionalizante, no qual ele é o professor.
Já existem no Presídio de Angola, que abriga cerca de 6,3 mil prisioneiros, mais de 20 cursos profissionalizantes. Entre eles, cursos de mecânica, lanternagem, soldagem, encanamento hidráulico, aquecimento, ventilação e ar condicionado, refrigeração, eletricidade e horticultura. Empresários da região fornecem ferramentas e equipamentos.
O programa é bem “amarrado”, para estimular novos réus a participar dele, desde antes da condenação. Promotores, advogados de defesa e juízes discutem benefícios que poderão conceder ao réu se ele entrar no programa e se preparar para levar uma vida normal e produtiva, ao retornar à sociedade, em vez de voltar ao crime.
O treinamento para ser um “bom cidadão” começa na prisão, junto com os cursos que faz. O preso tem de se tornar um “bom cidadão” em sua comunidade — mesmo que essa comunidade seja a de prisioneiros. Na época da libertação, um conselho de cidadãos, que inclui empresários, ajuda, de alguma forma, o preso a arrumar trabalho.
É claro que o réu também é informado de que perderá privilégios e de que uma próxima condenação será mais dura, em caso de reincidência, se não levar o programa a sério.
Para o público americano, o sucesso do programa dos juízes de Louisiana é uma grande notícia, porque é uma raridade nos Estados Unidos. Em quase todos os presídios do país, o único instrumento “educativo” à disposição do sistema é a solitária, por tempo indeterminado, muitas vezes — um meio para obrigar o preso a se comportar.
O preço que o país paga pela falta de programas de ressocialização é alto: o índice de reincidência no crime é de 77%, de acordo com um estudo do Departamento de Justiça. Entre os prisioneiros que participam do programa, esse índice é de 20%.
A proporção é parecida com o que ocorre no Brasil. Dados de 2014 do Conselho Nacional de Justiça mostraram que o índice de reincidência é de 70%, levando-se em conta apenas os egressos do sistema penitenciário comum. Entre os egressos das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apacs), o índice é de apenas 15%.
Por João Ozorio de Melo
Fonte: Conjur
Junto com um colega, o juiz Arthur Hunter, ela criou um programa de ressocialização de prisioneiros na “Penitenciária de Angola”, considerada a prisão mais “infame e brutal” dos EUA. A penitenciária fica em Louisiana, o estado que tem “a taxa de encarceramento mais alta do mundo”, de acordo com uma entrevista que ela concedeu ao Jornal da ABA (American Bar Association).
O programa se destina apenas a condenados a menos de 10 anos de prisão, porque esses irão voltar para a sociedade mais cedo, sob um alto risco de reincidência no crime, se não estiverem preparados para recomeçar a vida como cidadãos normais.
Ao entrar no programa, o novo prisioneiro recebe um mentor social, um mentor educacional e um mentor vocacional — na maioria, gente que passa algumas horas na prisão e vai embora para casa. Porém, os principais mentores acabam sendo os antigos prisioneiros, muitos deles sem esperança de saírem vivos da prisão.
A teoria da juíza é que, na maioria dos casos, nenhum dos dois — nem o novo prisioneiro, nem seu colega-mentor — tiveram, na vida, uma figura paterna para orientá-los. No decorrer do relacionamento entre os dois, o prisioneiro-mentor acaba se tornando uma figura paterna para o aprendiz.
Além disso, pelo fato dos dois estarem no mesmo barco, a “autoridade” do prisioneiro-mentor é mais facilmente aceita por seu pupilo. “Há um claro respeito por essa nova figura paterna. É muito mais fácil um preso ouvir e aceitar o que outro preso mais experiente lhe diz, do que qualquer outra pessoa de fora”, disse a juíza ao jornal.
O mentor coordena os estudos do pupilo, do primeiro ao segundo grau – uma espécie de curso supletivo, que rende um diploma. E, o principal, se encarrega de um curso profissionalizante, no qual ele é o professor.
Já existem no Presídio de Angola, que abriga cerca de 6,3 mil prisioneiros, mais de 20 cursos profissionalizantes. Entre eles, cursos de mecânica, lanternagem, soldagem, encanamento hidráulico, aquecimento, ventilação e ar condicionado, refrigeração, eletricidade e horticultura. Empresários da região fornecem ferramentas e equipamentos.
O programa é bem “amarrado”, para estimular novos réus a participar dele, desde antes da condenação. Promotores, advogados de defesa e juízes discutem benefícios que poderão conceder ao réu se ele entrar no programa e se preparar para levar uma vida normal e produtiva, ao retornar à sociedade, em vez de voltar ao crime.
O treinamento para ser um “bom cidadão” começa na prisão, junto com os cursos que faz. O preso tem de se tornar um “bom cidadão” em sua comunidade — mesmo que essa comunidade seja a de prisioneiros. Na época da libertação, um conselho de cidadãos, que inclui empresários, ajuda, de alguma forma, o preso a arrumar trabalho.
É claro que o réu também é informado de que perderá privilégios e de que uma próxima condenação será mais dura, em caso de reincidência, se não levar o programa a sério.
Para o público americano, o sucesso do programa dos juízes de Louisiana é uma grande notícia, porque é uma raridade nos Estados Unidos. Em quase todos os presídios do país, o único instrumento “educativo” à disposição do sistema é a solitária, por tempo indeterminado, muitas vezes — um meio para obrigar o preso a se comportar.
O preço que o país paga pela falta de programas de ressocialização é alto: o índice de reincidência no crime é de 77%, de acordo com um estudo do Departamento de Justiça. Entre os prisioneiros que participam do programa, esse índice é de 20%.
A proporção é parecida com o que ocorre no Brasil. Dados de 2014 do Conselho Nacional de Justiça mostraram que o índice de reincidência é de 70%, levando-se em conta apenas os egressos do sistema penitenciário comum. Entre os egressos das Associações de Proteção e Assistência aos Condenados (Apacs), o índice é de apenas 15%.
Por João Ozorio de Melo
Fonte: Conjur