'Não é culpa da mulher, me sinto um lixo', diz adolescente estuprada no Rio de Janeiro

goo.gl/mHrRom | A adolescente de 16 anos vítima de um estupro coletivo na Zona Oeste do Rio na semana passada afirmou, em entrevista a jornalistas nesta sexta-feira (27), que "queria que as pessoas soubessem que não é culpa da mulher". O jornal "O Globo" divulgou trechos da entrevista, que aconteceu na casa da mãe da jovem.

"Eu queria que eles [estupradores] esperassem a justiça de Deus. Eu queria só isso. E que nunca mais, nunca, nunca, nunca façam isso com ninguém", disse a garota. "Eu me sinto um lixo hoje. Não queria que outra pessoa se sentisse assim."

A adolescente lembrou na entrevista que, na sexta-feira (20), foi até a casa de um rapaz com quem se relacionava havia três anos. O crime ocorreu no sábado (21)

"Eu fui pro baile, aí encontrei o meu ex, fui pra casa dele. Chegou na casa dele, fui dormir. Nisso que dormi, acordei em outra casa, com um flash assim no meu rosto. Olhei assim e dormi de novo. Quando acordei, a luz estava acesa, e um montão de gente em cima de mim."

Sobre o estupro, disse: "O que me lembro foi que acordei pelada. E tinha um montão de gente em volta de mim. Meu amigo chegou dentro da casa e saiu batendo nos garotos e falou: 'Solta ela, solta ela!'. E catou minha roupa e falou: 'Se veste, se veste!'. Aí eu saí".

"Eu chorei. Fiquei batendo neles, e nada de eles saírem. [Diziam] 'Para! Eu sei que você gosta, eu sei que você é safada, você é piranha, essa daí é rata'. Eu me lembro que tinha uma cama, uma geladeira quebrada e uma cômoda, só. Tudo sujo. Tinha barata, tudo sujo, muita coisa suja."

O CRIME

Em depoimento anterior ao policiais, a adolescente afirmou se recordar de que estava a sós na casa do rapaz e que, depois, só se lembra que acordou no domingo, já uma outra casa, na mesma comunidade, cercada por 33 homens armados com fuzis e pistolas. Ela destacou que estava dopada e nua.

A jovem contou aos investigadores que foi para casa de táxi na terça-feira (24).  Ela admitiu que faz uso de drogas, mas afirmou que não utilizou nenhum entorpecente no sábado.

Na terça (24), ela descobriu que imagens suas, sem roupas e desacordada, circulavam na internet. A jovem contou ainda que voltou à comunidade para buscar o celular, que fora roubado. Um agente comunitário foi quem a acolheu, ao perceber como ela estava, e a conduziu para junto da família novamente.

Os parentes só souberam do estupro na quarta-feira (25), após tomarem conhecimento que fotos e vídeos exibindo a adolescente nua, desacordada e ferida estavam sendo compartilhados pelos agressores.

A adolescente passou por exames de corpo de delito no Instituto Médico-Legal nesta quinta (26) e foi levada para o Hospital Souza Aguiar, no Centro, onde passou por exames e tomou um coquetel de medicamentos para evitar a contaminação por doenças sexualmente transmissíveis.

FAMÍLIA ABALADA

Está marcada para segunda-feira (30) uma reunião entre a família e o secretário de Assistência Social do Rio, Paulo Melo, para avaliar se há necessidade de proteção policial.

A família da adolescente está abalada. “Eu e a mãe, a gente chora quando vê o vídeo. O pai dela não aguenta falar que chora muito. Nosso sentimento é de tristeza, de indignação, estamos estarrecidos de ver até que ponto chega a maldade humana, né. A família está, assim, sem palavras, consternada”, desabafou a avó da garota.

Um dos parentes disse que a família ainda se sentiu aliviada pela vida da garota ter sido poupada. “Esse agente comunitário que veio trazê-la [para casa] eu acho que ele foi uma pessoa que salvou a vida dela, porque eles iriam matá-la. Porque é isso que eles fazem, né. Não é normalmente a história que a gente conhece? Eles estupram e matam”, disse a parente da adolescente.

“Um deles é namorado dela, tinha sido namorado dela, que ela conheceu na escola. E isso foi uma vingança dele. Ele fez isso com ela e chamou mais 30 para fazer o mesmo. O pai dela nem aguenta falar que chora muito. Um ser humano que é capaz de fazer isso com uma menina de 16 anos só, cheia de sonho, né? E eles fazem isso. A família está assim, sem palavras”, lamentou o parente da garota.



Jovem vítima de estupro no Rio deixou mensagem em rede social (Foto: Reprodução/Facebook)

DESABAFO NA INTERNET: DÓI NA ALMA

Após a repercussão do caso, a garota fez dois desabafos nas redes sociais. O mais recente foi na manhã desta sexta: "Todas podemos um dia passa e por isso .. Não, não doi o útero e sim a alma por existirem pessoas cruéis sendo impunes!! Obrigada ao apoio", escreveu a menina, que também aderiu à campanha na rede social pelo "fim da cultura do estupro".

Na noite desta quinta (26), ela já havia feito seu primeiro pos sobre o tema. “Venho comunicar que roubaram meu telefone e obrigada pelo apoio de todos. Realmente pensei que seria julgada mal”.

STATUS DAS INVESTIGAÇÕES

O chefe da Polícia Civil do Rio, Fernando Veloso, disse, nesta sexta, que há "indícios veementes" de que houve estupro, mas a corporação ainda investiga detalhes do vídeo, aguarda laudos e depoimentos. Entre as questões, a polícia quer saber se o crime aconteceu no lugar da filmagem e quantos suspeitos teriam participado.

Até a tarde desta sexta, a prisão de nenhum dos suspeitos tinha sido pedida. O chefe da Polícia Civil afirmou que é preciso cautela para, por exemplo, determinar quantos são os envolvidos no crime. Ele comentou ainda que a cautela é a mesma que não permite que a polícia, apenas a partir de fotos de corpos divulgadas em redes sociais, considere que três ou quatro suspeitos tenham sido mortos.

ESTUPROS NO RIO

O Estado do Rio de Janeiro teve uma média de 13 estupros por dia entre 1º de janeiro e 30 de abril deste ano. Segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP), órgão ligado à Secretaria de Estado de Segurança do Rio, foram registrados 1.543 casos de estupro no estado nos primeiros quatro meses de 2016. Ainda não há dados referentes ao mês de maio.

Segundo os dados mais recentes do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foram registrados 47.646 estupros no país em 2014. O número representa uma queda em relação ao registrado em 2013 (50.320) - mas, ainda assim, equivale a um caso a cada 11 minutos, em média, no país. Os números incluem também os estupros de vulnerável, crime cometido contra menores de 14 anos.

Fonte: G1
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