goo.gl/PnNguB | A obrigação que o Marco Civil da Internet impõe às empresas de internet de armazenar os “dados pessoais” e o “conteúdo das comunicações privadas” de seus clientes por um ano deve ser declarada inconstitucional. De acordo com a Frente Parlamentar pela Internet Livre e Sem Limites, é essa regra, descrita no artigo 10 da lei, que dá aos juízes o poder de requisitar dados pessoais de usuários aos provedores de serviços de comunicações pela web.
O grupo, que reúne 211 deputados, argumenta que são essas obrigações que autorizam o Judiciário a suspender as atividades das empresas como forma de puni-las por descumprir ordem judicial. De acordo com os parlamentares, se a lei não determinasse o armazenamento de conversas privadas, juízes não poderiam exigir dos provedores a quebra de sigilo de conversas de terceiros sob a ameaça de lhes impedir o funcionamento.
A argumentação está em petição enviada ao Supremo Tribunal Federal nessa terça-feira (19/7) pela Frente Parlamentar, criada em maio justamente para discutir o Marco Civil da Internet e o mercado de telecomunicações no Congresso. A peça é assinada pelos advogados Rafael Araripe Carneiro e João Otávio Fidanza Frota, do Carneiros Advogados.
O grupo pede para ser amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido da República (PR) contra os incisos III e IV do artigo 12 do Marco Civil, que autorizam o Judiciário a suspender as atividades de empresas que desrespeitarem as requisições das informações do artigo 10. De acordo com a legenda, os incisos do artigo 12 são inconstitucionais por serem desproporcionais e por imporem obrigações a terceiros. A relatora é a ministra Rosa Weber.
Foi com base no artigo 12 que a Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro determinou a suspensão das atividades do WhatsApp, um aplicativo de mensagens. A ordem foi imposta como punição ao suposto desrespeito à ordem de fornecer cópia de mensagens trocadas entre investigados.
No entanto, de acordo com a Frente Parlamentar pela Internet Livre, que concorda com a tese defendida pelo PR, antes de discutir a constitucionalidade das sanções, é preciso discutir se as obrigações cujo desrespeito leva às sanções são constitucionais. E, para os deputados, elas não são.
“Uma das principais maneiras de proteger a intimidade e a vida privada dos indivíduos é justamente garantir o sigilo das comunicações”, argumenta a frente parlamentar. “A Constituição Federal prevê que se mantenham em sigilo as diversas modalidades de comunicação realizadas entre pessoas privadas, a fim de impedir que o Estado ou outros particulares tenham livre acesso a informações atinentes à esfera íntima dos cidadãos, o que seria absolutamente contrário à ordem democrática.”
No entendimento dos deputados, e sob o ponto de vista dos internautas, o artigo 10 do Marco Civil viola até mesmo a essência da lei. Segundo a petição, “a tônica preconizada pelo Marco Civil da Internet foi a proteção das liberdades, a guarda da intimidade e da vida privada”.
Os parlamentares analisam que o Brasil foi um dos primeiros países — e até hoje um dos poucos — a regulamentar o uso da rede mundial de computadores sem se limitar a definir crimes. Também afirmam que o país não seguiu a “moda vigilantista” que acometeu países como Estados Unidos, Espanha e França, que, por meio de leis que aumentaram o controle e vigilância das comunicações, passaram a permitir violações de direitos fundamentais como o da privacidade em nome de direitos difusos como o da segurança nacional.
Ao obrigar que os provedores guardem todo o conteúdo de todas as conversas de todos os usuários durante um ano, a medida cria “problemas de ordem física e econômica, uma vez que suportar a guarda prévia de escritos, de imagens, de sons e de vídeos da totalidade de usuários que se comunicam a todo instante na rede exigiria extraordinária capacidade de servidores que suportassem o astronômico volume de bytes gerado”.
Os parlamentares citam dados do IBGE segundo os quais a internet atinge 54,5% dos brasileiros. E de acordo com as alegações do PR ao Supremo, o país tem cerca de 100 milhões de usuários de aplicativos de mensagens virtuais. “O volume dos dados a serem guardados é abissal, de modo que interpretar aquele dispositivo como sendo fonte da obrigação legal de retenção prévia do teor das mensagens mostra-se extremamente inconveniente e descabido.”
Em 2006, a Comissão Europeia editou a Diretiva 24. Ela obrigava os membros da União Europeia a editarem leis que obrigassem os provedores de serviços na web a armazenar os dados de origem, destino, hora, equipamento usado e localização das comunicações. Proibia expressamente que fossem salvos “quaisquer dados que revelem o conteúdo das comunicações”.
Oito anos depois, em 2014, o Tribunal de Justiça da Europa cassou a diretiva por entender que ela violava a privacidade dos usuários de serviços de tecnologia e comunicações pela internet. Entre a edição da diretiva e sua cassação, diversos países editaram leis locais que foram cassadas pelos respectivos tribunais constitucionais.
O caso mais emblemático foi o da Alemanha, cuja lei foi editada em 2007 e declarada inconstitucional em 2010. A corte entendeu que a diretiva violava o princípio da inviolabilidade e privacidade da correspondência e das telecomunicações, descrito no artigo 10.1 da constituição alemã.
A diretiva falava num tempo de armazenamento que ia de seis meses a dois anos. Segundo a petição enviada ao Supremo nessa terça, a regra foi editada em meio aos debates sobre segurança surgidos depois dos ataques às Torres Gêmeas de Nova York no dia 11 de setembro de 2001.
“Veja-se, portanto, que nem mesmo no contexto da concepção vigilantista surgida na Europa chegou-se a exigir a obrigação drástica de guardar o conteúdo das comunicações privadas virtuais, o que se vem tentando interpretar do artigo 10 do Marco Civil da Internet”, concluem os deputados.
Clique aqui para ler a petição.
ADI 5.527
Fonte: Conjur
O grupo, que reúne 211 deputados, argumenta que são essas obrigações que autorizam o Judiciário a suspender as atividades das empresas como forma de puni-las por descumprir ordem judicial. De acordo com os parlamentares, se a lei não determinasse o armazenamento de conversas privadas, juízes não poderiam exigir dos provedores a quebra de sigilo de conversas de terceiros sob a ameaça de lhes impedir o funcionamento.
A argumentação está em petição enviada ao Supremo Tribunal Federal nessa terça-feira (19/7) pela Frente Parlamentar, criada em maio justamente para discutir o Marco Civil da Internet e o mercado de telecomunicações no Congresso. A peça é assinada pelos advogados Rafael Araripe Carneiro e João Otávio Fidanza Frota, do Carneiros Advogados.
O grupo pede para ser amicus curiae na Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo Partido da República (PR) contra os incisos III e IV do artigo 12 do Marco Civil, que autorizam o Judiciário a suspender as atividades de empresas que desrespeitarem as requisições das informações do artigo 10. De acordo com a legenda, os incisos do artigo 12 são inconstitucionais por serem desproporcionais e por imporem obrigações a terceiros. A relatora é a ministra Rosa Weber.
Foi com base no artigo 12 que a Vara de Execuções Penais do Rio de Janeiro determinou a suspensão das atividades do WhatsApp, um aplicativo de mensagens. A ordem foi imposta como punição ao suposto desrespeito à ordem de fornecer cópia de mensagens trocadas entre investigados.
No entanto, de acordo com a Frente Parlamentar pela Internet Livre, que concorda com a tese defendida pelo PR, antes de discutir a constitucionalidade das sanções, é preciso discutir se as obrigações cujo desrespeito leva às sanções são constitucionais. E, para os deputados, elas não são.
Intromissão
Para os usuários dos serviços, o artigo 10 do Marco Civil fere os direitos à intimidade, à vida privada e à inviolabilidade das comunicações. Isso porque ele obriga o provedor, que não participa das trocas de mensagens, das conversas e nem das trocas de arquivos, a acessar essas comunicações, salvar e armazenar esses dados durante um ano.“Uma das principais maneiras de proteger a intimidade e a vida privada dos indivíduos é justamente garantir o sigilo das comunicações”, argumenta a frente parlamentar. “A Constituição Federal prevê que se mantenham em sigilo as diversas modalidades de comunicação realizadas entre pessoas privadas, a fim de impedir que o Estado ou outros particulares tenham livre acesso a informações atinentes à esfera íntima dos cidadãos, o que seria absolutamente contrário à ordem democrática.”
No entendimento dos deputados, e sob o ponto de vista dos internautas, o artigo 10 do Marco Civil viola até mesmo a essência da lei. Segundo a petição, “a tônica preconizada pelo Marco Civil da Internet foi a proteção das liberdades, a guarda da intimidade e da vida privada”.
Os parlamentares analisam que o Brasil foi um dos primeiros países — e até hoje um dos poucos — a regulamentar o uso da rede mundial de computadores sem se limitar a definir crimes. Também afirmam que o país não seguiu a “moda vigilantista” que acometeu países como Estados Unidos, Espanha e França, que, por meio de leis que aumentaram o controle e vigilância das comunicações, passaram a permitir violações de direitos fundamentais como o da privacidade em nome de direitos difusos como o da segurança nacional.
Irreal
Do ponto de vista das empresas, afirma a petição, o artigo 10 impõe “ônus excessivamente oneroso”.Ao obrigar que os provedores guardem todo o conteúdo de todas as conversas de todos os usuários durante um ano, a medida cria “problemas de ordem física e econômica, uma vez que suportar a guarda prévia de escritos, de imagens, de sons e de vídeos da totalidade de usuários que se comunicam a todo instante na rede exigiria extraordinária capacidade de servidores que suportassem o astronômico volume de bytes gerado”.
Os parlamentares citam dados do IBGE segundo os quais a internet atinge 54,5% dos brasileiros. E de acordo com as alegações do PR ao Supremo, o país tem cerca de 100 milhões de usuários de aplicativos de mensagens virtuais. “O volume dos dados a serem guardados é abissal, de modo que interpretar aquele dispositivo como sendo fonte da obrigação legal de retenção prévia do teor das mensagens mostra-se extremamente inconveniente e descabido.”
Lá fora
A petição também lembra que a Europa já tentou obrigar as empresas de internet a armazenar dados de usuários, mas não deu certo. Ainda que a medida europeia tenha sido, na opinião dos parlamentares, menos grave que a brasileira.Em 2006, a Comissão Europeia editou a Diretiva 24. Ela obrigava os membros da União Europeia a editarem leis que obrigassem os provedores de serviços na web a armazenar os dados de origem, destino, hora, equipamento usado e localização das comunicações. Proibia expressamente que fossem salvos “quaisquer dados que revelem o conteúdo das comunicações”.
Oito anos depois, em 2014, o Tribunal de Justiça da Europa cassou a diretiva por entender que ela violava a privacidade dos usuários de serviços de tecnologia e comunicações pela internet. Entre a edição da diretiva e sua cassação, diversos países editaram leis locais que foram cassadas pelos respectivos tribunais constitucionais.
O caso mais emblemático foi o da Alemanha, cuja lei foi editada em 2007 e declarada inconstitucional em 2010. A corte entendeu que a diretiva violava o princípio da inviolabilidade e privacidade da correspondência e das telecomunicações, descrito no artigo 10.1 da constituição alemã.
A diretiva falava num tempo de armazenamento que ia de seis meses a dois anos. Segundo a petição enviada ao Supremo nessa terça, a regra foi editada em meio aos debates sobre segurança surgidos depois dos ataques às Torres Gêmeas de Nova York no dia 11 de setembro de 2001.
“Veja-se, portanto, que nem mesmo no contexto da concepção vigilantista surgida na Europa chegou-se a exigir a obrigação drástica de guardar o conteúdo das comunicações privadas virtuais, o que se vem tentando interpretar do artigo 10 do Marco Civil da Internet”, concluem os deputados.
Clique aqui para ler a petição.
ADI 5.527
Fonte: Conjur