goo.gl/85MO9K | O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (27) que os dois acusados de acender e atirar o rojão que matou o cinegrafista Santiago Andrade, em 2014, devem responder por homicídio qualificado e com dolo eventual, quando se assume o risco de matar. Com essa decisão, a dupla deve ir a júri popular pelo crime, em data a ser definida.
Caio Souza e Fábio Raposo, de 24 anos, estão soltos desde 2015 porque a Justiça do Rio entendeu que eles não tiveram intenção na morte – a decisão do STJ contraria esse entendimento. Se condenados, os dois podem pegar até 30 anos de prisão. A filha de Santiago, Vanessa Andrade, acompanhou o julgamento em plenário.
Apesar da decisão contrária aos réus, o tribunal "abrandou" a acusação feita pelo Ministério Público, que listava três agravantes para a morte. O MP pedia que a pena fosse aumentada pelo uso de explosivo, por motivo torpe e pela impossibilidade de defesa do cinegrafista. Desses quesitos, apenas o primeiro foi mantido.
Com isso, os réus continuam respondendo por homicídio qualificado e a punição prevista pelo Código Penal ainda é a mesma, de 12 a 30 anos de prisão. Como a lista de agravantes foi reduzida, a probabilidade de a Justiça aplicar a pena máxima é menor.
O cinegrafista foi atingido por um rojão em fevereiro de 2014, quando trabalhava cobrindo uma manifestação na Central do Brasil, no Centro do Rio. Caio Silva de Souza e Fabio Raposo foram denunciados pelo Ministério Público por explosão e homicídio doloso triplamente qualificado.
A defesa de Souza e Raposo ainda pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar transformar a acusação em homicídio culposo. Com isso, o caso passaria a ser julgado por um único juiz, e não pelo júri popular. O MP informou que não vai ao STF para recompor os três agravantes.
Promotor de Justiça responsável pelo caso, Eduardo Morais Martins afirmou durante o julgamento nesta terça que o MP reconhece o "caráter errático" do rojão. Por isso, segundo ele, a acusação é de dolo eventual (quando alguém assume o risco), e não de dolo direto (quando há intenção explícita).
"Em momento nenhum o MP imputa o dolo direto, nem poderia. Realmente, o elemento errático do morteiro aceso pelos réus é exatamente o indicativo do dolo eventual, de que assumiram o risco de causar inúmeras consequências naquele momento. Não é que o resultado não era previsível, mas era um dos possíveis resultados previstos. Poderiam ter morrido mais", diz Morais.
Segundo os advogados, o rojão utilizado não tinha cabo. Dessa forma, seria muito difícil que alguém conseguisse direcionar ou calcular o trajeto do rojão e o alcance da explosão.
Responsável pela defesa dos dois acusados, Wallace Martins afirmou no julgamento que o uso de rojões nas ruas do Rio de Janeiro é "corriqueiro, apesar de errado", e a única restrição seria a venda a menores de idade. "Todas as torcidas fazem isso, e ninguém é denunciado", disse.
Segundo o advogado, Santiago Andrade estava a sete metros de distância do rojão, e a dupla, a dois metros. Na versão da defesa, o explosivo seguiu uma trajetória acidental até a cabeça do cinegrafista.
"Colocam o rojão no chão, ao invés de subir, ele ganha realmente outro contorno, vai numa espécie de noroeste, 'daqui para lá'. Encontra exatamente a cabeça de Santiago Andrade que, diga-se de passagem, não tinha um único material de defesa. Capacete, colete", declarou Martins.
O cinegrafista Santiago Andrade (Foto: GloboNews/GloboNews)
Ao ler o voto, Mussi comparou o caso ao torcedor Kevin Beltrán Espada, de 14 anos, que morreu ao ser atingido por um sinalizador na arquibancada do jogo San José x Corinthians em 2013, na Bolívia.
O adolescente também foi atingido na cabeça e morreu no local. Um jovem brasileiro de 17 anos assumiu a autoria do disparo à época e, em razão da idade, não foi punido. O caso foi arquivado em agosto de 2013.
Cinegrafista da Band Santiago Andrade morreu após ser atingido na cabeça por rojão durante protesto no Centro do Rio em fevereiro de 2014 (Foto: Agência O Globo)
Depois da divulgação das imagens, Fábio Raposo, um dos acusados, se apresentou à polícia. Na época, ele confirmou que passou o rojão ao rapaz que acendeu o artefato que atingiu o cinegrafista.
O segundo acusado, Caio Silva de Souza, foi preso em Feira de Santana, na Bahia, dois dias depois da morte de Santiago Andrade.
Fábio Raposo e Caio Souza ficaram presos preventivamente por 13 meses. Para o Ministério Público, eles cometeram homicídio doloso triplamente qualificado, por motivo torpe, sem possibilidade de defesa e com explosivos. Neste caso, a pena é de até 30 anos de prisão.
No início do mês, Eduardo Morais Martins disse ao G1 que defendia o julgamento de ambos os réus por um júri popular.
“O MP, desde o início, desde a denúncia, entende que há elementos que demonstram que os acusados, ao acenderam o rojão, sabiam pelas circunstâncias que ali estavam, por ser um local com muita gente, por ser uma manifestação, que aquele rojão poderia ferir ou matar, o que acabou acontecendo no fim das contas, alguém faleceu, ainda que não quisessem esse resultado. O dolo eventual é isso: você assume um risco”, disse.
A defesa argumenta que eles não tiveram a intenção de matar o cinegrafista. “Não houve o dolo eventual que sustenta a acusação. Eles agiram com imprudência e negligência, isso sim, porque não poderiam ter soltado um rojão. Mas eles não foram dolosos, eles não foram intencionais”, declarou o advogado de defesa Wallace Martins.
Também no início deste mês, passados 2 anos e 7 meses do crime, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo lamentou a demora e disse que a incapacidade do Judiciário de responsabilizar culpados é um convite a que ameaças e agressões contra a imprensa persistam.
Por Mateus Rodrigues
Fonte: G1
Caio Souza e Fábio Raposo, de 24 anos, estão soltos desde 2015 porque a Justiça do Rio entendeu que eles não tiveram intenção na morte – a decisão do STJ contraria esse entendimento. Se condenados, os dois podem pegar até 30 anos de prisão. A filha de Santiago, Vanessa Andrade, acompanhou o julgamento em plenário.
Apesar da decisão contrária aos réus, o tribunal "abrandou" a acusação feita pelo Ministério Público, que listava três agravantes para a morte. O MP pedia que a pena fosse aumentada pelo uso de explosivo, por motivo torpe e pela impossibilidade de defesa do cinegrafista. Desses quesitos, apenas o primeiro foi mantido.
Com isso, os réus continuam respondendo por homicídio qualificado e a punição prevista pelo Código Penal ainda é a mesma, de 12 a 30 anos de prisão. Como a lista de agravantes foi reduzida, a probabilidade de a Justiça aplicar a pena máxima é menor.
O cinegrafista foi atingido por um rojão em fevereiro de 2014, quando trabalhava cobrindo uma manifestação na Central do Brasil, no Centro do Rio. Caio Silva de Souza e Fabio Raposo foram denunciados pelo Ministério Público por explosão e homicídio doloso triplamente qualificado.
A defesa de Souza e Raposo ainda pode recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para tentar transformar a acusação em homicídio culposo. Com isso, o caso passaria a ser julgado por um único juiz, e não pelo júri popular. O MP informou que não vai ao STF para recompor os três agravantes.
Acusação e defesa
Na denúncia, o MP disse entender que os dois acusados assumiram a responsabilidade da morte quando decidiram soltar um rojão em área de grande movimento. O argumento foi aceito pelo Tribunal de Justiça do Rio, mas a defesa de Souza e Raposo conseguiu reverter a decisão.Promotor de Justiça responsável pelo caso, Eduardo Morais Martins afirmou durante o julgamento nesta terça que o MP reconhece o "caráter errático" do rojão. Por isso, segundo ele, a acusação é de dolo eventual (quando alguém assume o risco), e não de dolo direto (quando há intenção explícita).
"Em momento nenhum o MP imputa o dolo direto, nem poderia. Realmente, o elemento errático do morteiro aceso pelos réus é exatamente o indicativo do dolo eventual, de que assumiram o risco de causar inúmeras consequências naquele momento. Não é que o resultado não era previsível, mas era um dos possíveis resultados previstos. Poderiam ter morrido mais", diz Morais.
Segundo os advogados, o rojão utilizado não tinha cabo. Dessa forma, seria muito difícil que alguém conseguisse direcionar ou calcular o trajeto do rojão e o alcance da explosão.
Responsável pela defesa dos dois acusados, Wallace Martins afirmou no julgamento que o uso de rojões nas ruas do Rio de Janeiro é "corriqueiro, apesar de errado", e a única restrição seria a venda a menores de idade. "Todas as torcidas fazem isso, e ninguém é denunciado", disse.
Segundo o advogado, Santiago Andrade estava a sete metros de distância do rojão, e a dupla, a dois metros. Na versão da defesa, o explosivo seguiu uma trajetória acidental até a cabeça do cinegrafista.
"Colocam o rojão no chão, ao invés de subir, ele ganha realmente outro contorno, vai numa espécie de noroeste, 'daqui para lá'. Encontra exatamente a cabeça de Santiago Andrade que, diga-se de passagem, não tinha um único material de defesa. Capacete, colete", declarou Martins.
O cinegrafista Santiago Andrade (Foto: GloboNews/GloboNews)
Votação
Relator do recurso, o ministro do STJ Jorge Mussi afirmou haver "ao menos indícios de atuação dolosa dos recorridos [réus]" suficientes para que eles respondam ao tribunal do júri.Ao ler o voto, Mussi comparou o caso ao torcedor Kevin Beltrán Espada, de 14 anos, que morreu ao ser atingido por um sinalizador na arquibancada do jogo San José x Corinthians em 2013, na Bolívia.
O adolescente também foi atingido na cabeça e morreu no local. Um jovem brasileiro de 17 anos assumiu a autoria do disparo à época e, em razão da idade, não foi punido. O caso foi arquivado em agosto de 2013.
Morte trágica
Santiago foi atingido na cabeça por um rojão durante uma manifestação no dia 6 de fevereiro de 2014. Ele teve morte cerebral quatro dias depois, aos 49 anos. A explosão foi registrada por fotógrafos, cinegrafistas e câmeras de vigilância perto da Central do Brasil.Cinegrafista da Band Santiago Andrade morreu após ser atingido na cabeça por rojão durante protesto no Centro do Rio em fevereiro de 2014 (Foto: Agência O Globo)
Depois da divulgação das imagens, Fábio Raposo, um dos acusados, se apresentou à polícia. Na época, ele confirmou que passou o rojão ao rapaz que acendeu o artefato que atingiu o cinegrafista.
O segundo acusado, Caio Silva de Souza, foi preso em Feira de Santana, na Bahia, dois dias depois da morte de Santiago Andrade.
Fábio Raposo e Caio Souza ficaram presos preventivamente por 13 meses. Para o Ministério Público, eles cometeram homicídio doloso triplamente qualificado, por motivo torpe, sem possibilidade de defesa e com explosivos. Neste caso, a pena é de até 30 anos de prisão.
No início do mês, Eduardo Morais Martins disse ao G1 que defendia o julgamento de ambos os réus por um júri popular.
“O MP, desde o início, desde a denúncia, entende que há elementos que demonstram que os acusados, ao acenderam o rojão, sabiam pelas circunstâncias que ali estavam, por ser um local com muita gente, por ser uma manifestação, que aquele rojão poderia ferir ou matar, o que acabou acontecendo no fim das contas, alguém faleceu, ainda que não quisessem esse resultado. O dolo eventual é isso: você assume um risco”, disse.
A defesa argumenta que eles não tiveram a intenção de matar o cinegrafista. “Não houve o dolo eventual que sustenta a acusação. Eles agiram com imprudência e negligência, isso sim, porque não poderiam ter soltado um rojão. Mas eles não foram dolosos, eles não foram intencionais”, declarou o advogado de defesa Wallace Martins.
Também no início deste mês, passados 2 anos e 7 meses do crime, a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo lamentou a demora e disse que a incapacidade do Judiciário de responsabilizar culpados é um convite a que ameaças e agressões contra a imprensa persistam.
Por Mateus Rodrigues
Fonte: G1