goo.gl/j3a9Hs | Após perder diversas batalhas judiciais, o INSS teve que alterar os critérios para concessão de benefícios previdenciários a portadores do vírus HIV. O objetivo é garantir uma avaliação mais global das condições dos soropositivos e uma vida mais digna a quem, por causa da doença, muitas vezes, depende exclusivamente do auxílio pago pela Previdência Social.
Depois de receber muitas reclamações e de perder dezenas de disputas judiciais, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) decidiu mudar as regras para concessão de benefícios previdenciários aos portadores do HIV. Desde meados de 2014, os peritos da autarquia são orientados a seguir critérios mais próximos do que defendem pacientes e especialistas.
Essas orientações foram editadas recentemente em um manual de procedimentos para permitir uma avaliação mais global dos soropositivos.
A mudança veio após um debate de três anos com os envolvidos no tema. Por mais de uma década, no entanto, o principal critério utilizado pelo INSS na análise das condições físicas dos soropositivos era a medição do grau de deficiência da imunidade por meio da contagem do linfócito CD4, espécie de célula de defesa do organismo. Contudo, foi possível perceber que nem sempre uma pessoa com um grande número de linfócitos CD4 no corpo está necessariamente saudável. Por outro lado, pacientes com altos índices do CD4, ainda assim, podem desenvolver doenças oportunistas.
Como o INSS só podia autorizar os benefícios para portadores do vírus com baixa quantidade do linfócito, muitos pacientes precisaram recorrer à Justiça Federal para comprovar que estavam aptos ou não para retornar às suas atividades laborais. Foi o caso do gerente de Tecnologia da Informação, Renato da Matta, de 49 anos. Por quatro anos, ele recebeu auxílio-doença. Quando teve sua alta decretada pelos peritos do INSS, os médicos da empresa onde atuava não o consideraram apto para retomar sua função. “Os laudos foram bem conclusivos, mas mesmo assim fui impedido de retornar ao trabalho. Depois ainda tentei voltar três vezes”, conta.
A maioria dos portadores de HIV chama essa situação de “limbo”, por causa do desamparo causado pela divergência nas avaliações entre médicos do trabalho e peritos da Previdência.
“A Previdência Social tinha uma visão da AIDS como uma doença crônica controlada, em que os pacientes tomavam a medicação e ficava tudo tranquilo”, comenta Renato. Foram situações assim que motivaram a Previdência Social a reconhecer que o método de avaliação das condições dos portadores do vírus HIV pode induzir ao erro e provocar distorções.
“É difícil um protocolo atender a todos, por isso, deve haver falhas. Mas se havia um “limbo”, ele era muito grande e hoje ele é menor. E o INSS está atento para que essa “falha” seja cada vez mais mitigada para que possamos realmente cobrir todos”, afirma o procurador-chefe do INSS, Alessandro Stefanutto. Segundo ele, a autarquia realiza todos os meses, em média, 700 mil perícias. E o novo critério veio dar balizas para o perito poder avaliar o histórico todo e verificar não só o nível de CD4. “Isso é uma evolução, acho que é um sucesso”, avalia.
A médica infectologista e pesquisadora do Laboratório de Pesquisa Clínica em AIDS da Fundação Oswaldo Cruz, Sandra Wagner Cardoso, explica que, como a AIDS é uma doença crônica e viral, mesmo com controle e tratamento, ela gera um estado “inflamado” no doente. “Isso aparentemente tá associado ao envelhecimento precoce em comparação com a população em geral que não tem o HIV. Também é aspecto semelhante ao que acontece com algumas doenças de caráter crônico, como diabetes e hipertensão”, explica.
Esse tipo de complicação é que ainda resiste ao avanço no tratamento da doença e que justifica a criação de regras específicas. Entre os peritos do INSS, a sensação é a de que o novo posicionamento do Instituto deve garantir um melhor atendimento aos portadores do HIV. De acordo com a médica e perita do INSS, Vera Autoun, apesar da qualidade dos métodos de tratamento, a AIDS continua sendo uma doença grave.
“Os critérios podem ser discutidos e até podem não ser os ideais, mas é preciso ter critérios. A instituição tem que arcar com essa função de ter critérios, porque a gente vive num país com uma desigualdade muito grande, que a maioria dos doentes pode ser de pessoas socialmente prejudicadas, com escolaridade baixa, sem profissão definida, sem capacidade de mudar de profissão ou de conseguir se manter no emprego. É uma situação muito delicada”, pondera.
“Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença”, diz a súmula proposta pela juíza federal Kyu Soon Lee. Segundo
a magistrada, o assunto vem sendo reiteradamente enfrentado. No entendimento já pacificado na Turma Nacional, no caso dos portadores do HIV, mesmo os assintomáticos, a incapacidade transcende a mera limitação física, e repercute na esfera social do requerente segregando-o do mercado de trabalho.
“Nessas situações – em que a doença por si só gera um estigma social –, para a caracterização da incapacidade/deficiência, faz-se necessária a avaliação dos aspectos pessoais, econômicos, sociais e culturais. Por outro lado, é importante deixar claro que a doença por si só não acarreta a incapacidade ou deficiência que a Legislação exige para o gozo do benefício”, pontuou Kyu Soon Lee.
Outro ponto destacado pela juíza é o caráter de complementaridade dessa súmula com relação a de nº 77, a qual afirma que “o julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”. “Pode parecer uma contradição, mas, na verdade, a Súmula 78 vem complementar a anterior, posto que, na praxe, a jurisprudência já considerava que a ausência de incapacidade clínica ou física nos casos de doenças de elevada estigma social não era suficiente para a negativa do benefício previdenciário ou assistencial”, explicou a magistrada.
Aposentadoria por invalidez: As pessoas que vivem com HIV/AIDS têm direito a esse benefício, mas precisam passar por perícia médica de dois em dois anos, se não, o benefício é suspenso. A aposentadoria deixa de ser paga quando o segurado recupera a capacidade e volta ao trabalho. Para ter direito ao benefício, o trabalhador tem que contribuir para a Previdência Social por no mínimo 12 meses, no caso de doença. Se for acidente, esse prazo de carência não é exigido, mas é preciso estar inscrito na Previdência Social. Não tem direito à aposentadoria por invalidez quem, ao se filiar à Previdência Social, já tiver doença ou lesão que geraria o benefício, a não ser quando a incapacidade resultar no agravamento da enfermidade.
Benefício de Prestação Continuada: É a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho, que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. Esse benefício independe de contribuições para a Previdência Social. A pessoa para recebê-lo deve dirigir-se ao posto do INSS mais próximo e comprovar sua situação. Essa comprovação pode ser feita com apresentação de Laudo de Avaliação (perícia médica do INSS ou equipe multiprofissional do Sistema Único de Saúde). A renda familiar e o não exercício de atividade remunerada deverão ser declarados pela pessoa que requer o benefício.
Na opinião do diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita, o novo manual de procedimentos do INSS traz um avanço significativo condizente com a mudança do perfil epidemiológico da doença. “Atualmente, permite-se o resgate da capacidade laborativa dos indivíduos, propiciando-os o retorno ao mercado de trabalho, na maioria das vezes, dificultado pelo processo de estigma e discriminação ainda presentes em parte da sociedade”, observa.
Fábio Mesquita acredita que essa mudança de critérios é fundamental, pois considera outros aspectos relevantes para a análise médico-pericial, não se limitando apenas ao bem estar físico, mas principalmente ao estado psíquico e social dos soropositivos. “Essa iniciativa, em plena interação entre a equipe técnica do INSS (peritos médicos, assistentes sociais e orientadores profissionais) com ONGs – como a Pela Vida/Niterói – e com o Ministério da Saúde, foi fundamental para a busca de soluções mais justas frente a cada caso”, pontua o diretor.
Ele chegou a tentar suicídio quando se viu sem dinheiro para pagar as contas e sem ajuda. Passou 15 dias em coma. Nesse período, percebeu que não poderia desistir de lutar.
“A criação de novas diretrizes é só o começo. Esse reconhecimento do INSS foi só um primeiro passo. O grande e maior passo que queremos dar agora é conscientizar e capacitar os médicos peritos para que eles utilizem os novos critérios e os sigam à risca, para ver se conseguimos diminuir a judicialização dessas demandas”, avalia o portador de HIV.
O Exército Brasileiro é uma das instituições que preveem, em seus certames, como obrigatória, a realização do teste de HIV com caráter eliminatório. A polêmica sobre a exigência do exame acabou sendo levada à Justiça Federal. Em Pernambuco, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou, em 2010, uma ação civil pública contra o Ministério da Defesa para solicitar que fosse excluída do edital a exigência de apresentação de teste de HIV.
Em 2011, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) decidiu dispensar os candidatos de concursos públicos em andamento e os dos próximos promovidos pelo Exército Brasileiro da apresentação do exame. Inconformada, a União recorreu da decisão aos Tribunais Superiores e a questão ainda está pendente de julgamento.
Para fazer valer a decisão do TRF5, o MPF resolveu, em junho de 2014, mover uma ação de execução provisória de sentença, que foi julgada em julho. Na 12ª Vara Federal de Pernambuco, o juiz responsável pelo processo determinou o cumprimento da decisão do TRF5 no prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de R$ 100. A iniciativa foi uma vitória para os portadores do vírus do HIV.
Liane da Silva Oliveira, integrante da Casa de Apoio Sempre Viva, afirma que essa é uma decisão, acima de tudo, contra o preconceito. “Não é porque a pessoa tem o vírus que ela é incapaz de fazer qualquer função”, lembra.
Segundo a procuradora da República responsável pela ação de execução, Mona Lisa Ismail, foi uma conquista importante porque tem abrangência sobre todos os concursos realizados pelo Exército no Brasil.
“Só se deve realizar o exame aquele que se sinta à vontade. Por isso, o teste nunca deve ser previsto de forma obrigatória, muito menos com caráter eliminatório. É isto que a gente defende: o direito de acesso aos cargos públicos e o combate a qualquer forma de discriminação”, afirma.
Por Rodrigo Jean Araujo Rosa
Fonte: Jus Brasil
Depois de receber muitas reclamações e de perder dezenas de disputas judiciais, o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) decidiu mudar as regras para concessão de benefícios previdenciários aos portadores do HIV. Desde meados de 2014, os peritos da autarquia são orientados a seguir critérios mais próximos do que defendem pacientes e especialistas.
Essas orientações foram editadas recentemente em um manual de procedimentos para permitir uma avaliação mais global dos soropositivos.
A mudança veio após um debate de três anos com os envolvidos no tema. Por mais de uma década, no entanto, o principal critério utilizado pelo INSS na análise das condições físicas dos soropositivos era a medição do grau de deficiência da imunidade por meio da contagem do linfócito CD4, espécie de célula de defesa do organismo. Contudo, foi possível perceber que nem sempre uma pessoa com um grande número de linfócitos CD4 no corpo está necessariamente saudável. Por outro lado, pacientes com altos índices do CD4, ainda assim, podem desenvolver doenças oportunistas.
Como o INSS só podia autorizar os benefícios para portadores do vírus com baixa quantidade do linfócito, muitos pacientes precisaram recorrer à Justiça Federal para comprovar que estavam aptos ou não para retornar às suas atividades laborais. Foi o caso do gerente de Tecnologia da Informação, Renato da Matta, de 49 anos. Por quatro anos, ele recebeu auxílio-doença. Quando teve sua alta decretada pelos peritos do INSS, os médicos da empresa onde atuava não o consideraram apto para retomar sua função. “Os laudos foram bem conclusivos, mas mesmo assim fui impedido de retornar ao trabalho. Depois ainda tentei voltar três vezes”, conta.
A maioria dos portadores de HIV chama essa situação de “limbo”, por causa do desamparo causado pela divergência nas avaliações entre médicos do trabalho e peritos da Previdência.
“A Previdência Social tinha uma visão da AIDS como uma doença crônica controlada, em que os pacientes tomavam a medicação e ficava tudo tranquilo”, comenta Renato. Foram situações assim que motivaram a Previdência Social a reconhecer que o método de avaliação das condições dos portadores do vírus HIV pode induzir ao erro e provocar distorções.
“É difícil um protocolo atender a todos, por isso, deve haver falhas. Mas se havia um “limbo”, ele era muito grande e hoje ele é menor. E o INSS está atento para que essa “falha” seja cada vez mais mitigada para que possamos realmente cobrir todos”, afirma o procurador-chefe do INSS, Alessandro Stefanutto. Segundo ele, a autarquia realiza todos os meses, em média, 700 mil perícias. E o novo critério veio dar balizas para o perito poder avaliar o histórico todo e verificar não só o nível de CD4. “Isso é uma evolução, acho que é um sucesso”, avalia.
Doença crônica
O procurador do INSS explica ainda que um dos principais aspectos levados em conta nesse processo de redefinição de critérios foi o novo status da AIDS, que hoje é encarada como doença crônica degenerativa. A mortalidade caiu muito, mesmo que ainda haja uma série de sequelas por conta do uso prolongado dos medicamentos. Os estudos mostram, por exemplo, um avanço de 15 anos no processo de envelhecimento dos soropositivos. Uma pessoa com idade cronológica de 45 anos, mesmo fazendo o tratamento de forma correta, biologicamente tem 60 anos.A médica infectologista e pesquisadora do Laboratório de Pesquisa Clínica em AIDS da Fundação Oswaldo Cruz, Sandra Wagner Cardoso, explica que, como a AIDS é uma doença crônica e viral, mesmo com controle e tratamento, ela gera um estado “inflamado” no doente. “Isso aparentemente tá associado ao envelhecimento precoce em comparação com a população em geral que não tem o HIV. Também é aspecto semelhante ao que acontece com algumas doenças de caráter crônico, como diabetes e hipertensão”, explica.
Esse tipo de complicação é que ainda resiste ao avanço no tratamento da doença e que justifica a criação de regras específicas. Entre os peritos do INSS, a sensação é a de que o novo posicionamento do Instituto deve garantir um melhor atendimento aos portadores do HIV. De acordo com a médica e perita do INSS, Vera Autoun, apesar da qualidade dos métodos de tratamento, a AIDS continua sendo uma doença grave.
“Os critérios podem ser discutidos e até podem não ser os ideais, mas é preciso ter critérios. A instituição tem que arcar com essa função de ter critérios, porque a gente vive num país com uma desigualdade muito grande, que a maioria dos doentes pode ser de pessoas socialmente prejudicadas, com escolaridade baixa, sem profissão definida, sem capacidade de mudar de profissão ou de conseguir se manter no emprego. É uma situação muito delicada”, pondera.
Estigmatização da doença é alvo de súmula da TNU
Em setembro do ano passado, a Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais Federais (TNU) aprovou a redação da Súmula 78, que uniformiza o tratamento judicial de demandas que questionam a concessão de benefícios por incapacidade. O texto avança sobre a questão da perícia ao determinar que sejam examinadas não apenas as condições físicas do segurado com AIDS.“Comprovado que o requerente de benefício é portador do vírus HIV, cabe ao julgador verificar as condições pessoais, sociais, econômicas e culturais, de forma a analisar a incapacidade em sentido amplo, em face da elevada estigmatização social da doença”, diz a súmula proposta pela juíza federal Kyu Soon Lee. Segundo
a magistrada, o assunto vem sendo reiteradamente enfrentado. No entendimento já pacificado na Turma Nacional, no caso dos portadores do HIV, mesmo os assintomáticos, a incapacidade transcende a mera limitação física, e repercute na esfera social do requerente segregando-o do mercado de trabalho.
“Nessas situações – em que a doença por si só gera um estigma social –, para a caracterização da incapacidade/deficiência, faz-se necessária a avaliação dos aspectos pessoais, econômicos, sociais e culturais. Por outro lado, é importante deixar claro que a doença por si só não acarreta a incapacidade ou deficiência que a Legislação exige para o gozo do benefício”, pontuou Kyu Soon Lee.
Outro ponto destacado pela juíza é o caráter de complementaridade dessa súmula com relação a de nº 77, a qual afirma que “o julgador não é obrigado a analisar as condições pessoais e sociais quando não reconhecer a incapacidade do requerente para a sua atividade habitual”. “Pode parecer uma contradição, mas, na verdade, a Súmula 78 vem complementar a anterior, posto que, na praxe, a jurisprudência já considerava que a ausência de incapacidade clínica ou física nos casos de doenças de elevada estigma social não era suficiente para a negativa do benefício previdenciário ou assistencial”, explicou a magistrada.
Tipos de benefícios previdenciários concedidos a portadores do HIV
Auxílio-doença: Qualquer cidadão brasileiro tem direito, desde que seja segurado e que não possa trabalhar por conta de doença ou acidente por mais de 15 dias consecutivos. A pessoa que vive com HIV/AIDS terá direito ao benefício sem a necessidade de cumprir o prazo mínimo de contribuição. O auxílio-doença deixa de ser pago quando o segurado recupera a capacidade e retorna ao trabalho ou quando o benefício se transforma em aposentadoria por invalidez. Nesses casos, a concessão de auxílio-doença ocorrerá após comprovação da incapacidade em exame médico pericial da Previdência Social.Aposentadoria por invalidez: As pessoas que vivem com HIV/AIDS têm direito a esse benefício, mas precisam passar por perícia médica de dois em dois anos, se não, o benefício é suspenso. A aposentadoria deixa de ser paga quando o segurado recupera a capacidade e volta ao trabalho. Para ter direito ao benefício, o trabalhador tem que contribuir para a Previdência Social por no mínimo 12 meses, no caso de doença. Se for acidente, esse prazo de carência não é exigido, mas é preciso estar inscrito na Previdência Social. Não tem direito à aposentadoria por invalidez quem, ao se filiar à Previdência Social, já tiver doença ou lesão que geraria o benefício, a não ser quando a incapacidade resultar no agravamento da enfermidade.
Benefício de Prestação Continuada: É a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa incapacitada para a vida independente e para o trabalho, que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem tê-la provida por sua família. Esse benefício independe de contribuições para a Previdência Social. A pessoa para recebê-lo deve dirigir-se ao posto do INSS mais próximo e comprovar sua situação. Essa comprovação pode ser feita com apresentação de Laudo de Avaliação (perícia médica do INSS ou equipe multiprofissional do Sistema Único de Saúde). A renda familiar e o não exercício de atividade remunerada deverão ser declarados pela pessoa que requer o benefício.
Na opinião do diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita, o novo manual de procedimentos do INSS traz um avanço significativo condizente com a mudança do perfil epidemiológico da doença. “Atualmente, permite-se o resgate da capacidade laborativa dos indivíduos, propiciando-os o retorno ao mercado de trabalho, na maioria das vezes, dificultado pelo processo de estigma e discriminação ainda presentes em parte da sociedade”, observa.
Fábio Mesquita acredita que essa mudança de critérios é fundamental, pois considera outros aspectos relevantes para a análise médico-pericial, não se limitando apenas ao bem estar físico, mas principalmente ao estado psíquico e social dos soropositivos. “Essa iniciativa, em plena interação entre a equipe técnica do INSS (peritos médicos, assistentes sociais e orientadores profissionais) com ONGs – como a Pela Vida/Niterói – e com o Ministério da Saúde, foi fundamental para a busca de soluções mais justas frente a cada caso”, pontua o diretor.
Batalha diária
Até que o INSS chegasse à conclusão de que era necessário mudar os critérios para concessão de benefícios, uma longa batalha de ideias foi travada. O gerente de Tecnologia da Informação, Renato da Matta, participou das discussões promovidas pela Previdência Social. A intenção dele era evitar que histórias como a dele se repetissem.Ele chegou a tentar suicídio quando se viu sem dinheiro para pagar as contas e sem ajuda. Passou 15 dias em coma. Nesse período, percebeu que não poderia desistir de lutar.
“A criação de novas diretrizes é só o começo. Esse reconhecimento do INSS foi só um primeiro passo. O grande e maior passo que queremos dar agora é conscientizar e capacitar os médicos peritos para que eles utilizem os novos critérios e os sigam à risca, para ver se conseguimos diminuir a judicialização dessas demandas”, avalia o portador de HIV.
Exército é proibido de exigir teste de HIV
Há pelo menos duas décadas, a legislação brasileira proíbe o empregador de exigir que os candidatos apresentem teste de HIV para provar que não tem o vírus. Apesar do sigilo do diagnóstico estar presente em portaria do Ministério da Saúde e em dispositivos de organizações internacionais, ainda há quem desrespeite a regra. Alguns concursos públicos, principalmente na área de segurança, costumam exigir o exame.O Exército Brasileiro é uma das instituições que preveem, em seus certames, como obrigatória, a realização do teste de HIV com caráter eliminatório. A polêmica sobre a exigência do exame acabou sendo levada à Justiça Federal. Em Pernambuco, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou, em 2010, uma ação civil pública contra o Ministério da Defesa para solicitar que fosse excluída do edital a exigência de apresentação de teste de HIV.
Em 2011, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) decidiu dispensar os candidatos de concursos públicos em andamento e os dos próximos promovidos pelo Exército Brasileiro da apresentação do exame. Inconformada, a União recorreu da decisão aos Tribunais Superiores e a questão ainda está pendente de julgamento.
Para fazer valer a decisão do TRF5, o MPF resolveu, em junho de 2014, mover uma ação de execução provisória de sentença, que foi julgada em julho. Na 12ª Vara Federal de Pernambuco, o juiz responsável pelo processo determinou o cumprimento da decisão do TRF5 no prazo de 30 dias, sob pena de multa diária de R$ 100. A iniciativa foi uma vitória para os portadores do vírus do HIV.
Liane da Silva Oliveira, integrante da Casa de Apoio Sempre Viva, afirma que essa é uma decisão, acima de tudo, contra o preconceito. “Não é porque a pessoa tem o vírus que ela é incapaz de fazer qualquer função”, lembra.
Segundo a procuradora da República responsável pela ação de execução, Mona Lisa Ismail, foi uma conquista importante porque tem abrangência sobre todos os concursos realizados pelo Exército no Brasil.
“Só se deve realizar o exame aquele que se sinta à vontade. Por isso, o teste nunca deve ser previsto de forma obrigatória, muito menos com caráter eliminatório. É isto que a gente defende: o direito de acesso aos cargos públicos e o combate a qualquer forma de discriminação”, afirma.
Por Rodrigo Jean Araujo Rosa
Fonte: Jus Brasil