Dos aspectos processuais na ação incidental de alienação parental – Por Murillo Andrade

goo.gl/Tvg1wz | A Lei 12.318/10[1] é clara e inequívoca, quando afirma que a alienação parental é a interferência na formação psicológica da criança, para que repudie o outro genitor que não tem a guarda ou que cause prejuízos no vínculo paterno filial. Estes atos devem ser apurados de forma enérgica e célere, motivo pelo qual a existência da legislação supramencionada.

“Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.”

Após a promulgação da conhecida Lei da alienação parental, várias situações processuais, tramitaram de formas distintas dentre as varas de família, causando insegurança aos operadores do direito da forma adequada de se proceder na distribuição das ações declaratórios de alienação parental.

O ponto de conflito foram as várias maneiras de se instaurar os procedimentos na referida ação, sendo que alguns magistrados recebiam as demandas de forma incidental, outros como iniciais, em alguns casos nos próprios autos de um procedimento anteriormente distribuído, como por exemplo ação de guarda.

Contudo, a Lei de alienação parental, especificamente em seu art. 4º, prevê expressamente a forma de como se deve impetrar o incidente de alienação parental: “Declarado indício de ato de alienação parental, a requerimento ou de ofício, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso”.

Desta forma, o que se observa é que a legislação possibilita a propositura da ação declaratória de alienação parental já existindo um procedimento anterior em tramite, ou seja, a Lei não impõe de forma imperativa como se deve apresentar a ação, pelo contrário, a legislação autoriza a parte escolher como a impetrará, seja incidentalmente (Processo Apenso/Apartado), ou de forma autônoma (Processo Originário).

Porém a Lei, determinando estas duas formas de se instaurar o procedimento para verificar a existência de alienação parental, restringe a possibilidade da ação declaratória tramitar no bojo de uma ação em trâmite.

Optando a parte pelo incidente processual, este deve ser processado em apartado. A Lei não prevê que o incidente de alienação parental seja processado dentro de outro feito, por conta da prioridade da tramitação e do rito específico.

Assim, a incidental de alienação parental deve correr igualmente aos demais incidentes processuais, ou seja, em apartado.

Ementa: AÇÃO INCIDENTAL DE ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA – PROCESSAMENTO EM AUTOS APARTADOS – RECURSO CABÍVEL- APELAÇÃO – AGRAVO DE INSTRUMENTO – INADEQUAÇÃO – RECURSO NÃO CONHECIDO: A impugnação ao deferimento de pedido de assistência, constituindo em incidente, deve ser processada em autos apartados, segundo os art. 6º e 7º da Lei n.º 1.060/50 … Cuidando-se de equívoco inaceitável, inaplicável o princípio da fungibilidade recursal. Data de publicação: 23/07/2014 – TJ-MG – Agravo de Instrumento Cv AI 10024133857417001 MG (TJ-MG)[2] 

Ementa: PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS À EXUCUÇÃO DE SENTENÇA. PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE. ÔNUS DA PROVA. – EMBARGOS DE DEVEDOR, como AÇÃO INCIDENTAL à executiva, têm condições e pressupostos processuais próprios. SENDO O PROCESSO DEPENDENTE, MAS OS AUTOS APARTADOS, faz-se necessária a juntada por cópia, ou por translado, das peças do processo principal que originaram o pedido. – (…) – Visando o apelante a reforma do “decisum”, deve demonstrar, e não apenas afirmar, o alegado. – Recurso improvido, por unanimidade. TRF-2 – APELAÇÃO CIVEL AC 131688 97.02.04637-8 (TRF-2) – Data de publicação: 18/07/2000[3]

Portanto, sendo distribuído um incidente em apartado, o processo principal deverá ser imediatamente suspenso, até que se apure os fatos alegados, quando ao final, resguardado o contraditório e a ampla defesa, haverá uma sentença declaratória da existência ou não de atos de alienação.

Neste contexto, se em uma ação em que as partes estão pleiteando a guarda dos filhos, existindo um incidente, o processo de guarda deverá ser suspendido, até julgamento daquele, e em caso de se ver declarado atos de alienação parental, com esta sentença declaratória, o magistrado, deverá levar em conta a decisão junto ao processo principal.

Outra questão importante, sobre os aspectos processuais, é o rito do incidente de alienação parental previsto em seu art. 5º, com perícias multidisciplinares específicas, o que acarretará a confecção de quesitos, apresentação de assistentes técnicos pelas partes, ficando o perito obrigado a efetivar a elaboração de estudo minucioso do caso.

“Art. 5º –  Havendo indício da prática de ato de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, o juiz, se necessário, determinará perícia psicológica ou biopsicossocial.

§ 1º – O laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor.

§ 2º – A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

§ 3º – O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo, prorrogável exclusivamente por autorização judicial baseada em justificativa circunstanciada.”

No mesmo sentido, quando a ação declaratória versar sobre abuso sexual, deverá o magistrado observar o que determina o novo art. 699 do CPC: “Quando o processo envolver discussão sobre fato relacionado a abuso ou a alienação parental, o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, deverá estar acompanhado por especialista.”[4]

Portanto, entende-se que, em caso de suprimir nas oitivas do menor, especialista na sala de audiência, este procedimento estará eivado de nulidade.

Insta relembrar que o §2º do art. Art. 5º da Lei 12.318/10 é taxativo ao esclarecer o que venha a ser especialista, ou seja, um profissional habilitado, exigindo do mesmo aptidão comprovada, por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental.

É pacificado ainda que, para a configuração de atos de alienação parental através de perícia, não se prestam para a sua aferição os laudos de estudos psicossociais forenses (utilizados para verificação social, econômica e emocional das partes), por isso a necessidade de perícia, a ser procedida por profissional adequando nos termos do § 2º do art. 5º.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE ALIENAÇÃO PARENTAL. ESTUDO SOCIAL E PSICOLÓGICO. INDICAÇÃO DE ASSISTENTE TÉCNICO. NÃO CABIMENTO, POR NÃO SE TRATAR, TECNICAMENTE DE PERÍCIA, NO CASO. O “estudo social e psicológico” determinado pelo juízo de origem não se configura exatamente como a “perícia” a que se refere o art. 5º da Lei 12.318/2010. Tanto que foi solicitada sua realização às municipalidades onde residem os litigantes, sem que tenha havido a específica designação de peritos da confiança do juízo, com a formação exigida no § 2º do art. 5º da Lei em foco. Por isso, no caso específico, não se justifica a designação de assistente técnico. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70058752627, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 05/06/2014) (TJ-RS – AI: 70058752627 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 05/06/2014, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 11/06/2014).[5]

AGRAVO DE INSTRUMENTO – GUARDA DE MENOR – DISPUTA ENTRE OS GENITORES. ALTO GRAU DE BELIGERÂNCIA. ACUSAÇÕES RECÍPROCAS. ABUSO SEXUAL E ALIENAÇÃO PARENTAL. NECESSIDADE DE EXAME PSICOSSOCIAL POR PROFISSIONAL ESPECIALIZADO. INTELIGÊNCIA DO ART. 5º, § 2º DA LEI Nº 12.318/2010. (…) 1 – A alienação parental ou implantação de falsas memórias é tão grave quanto o abuso sexual, seja porque põe em risco a saúde emocional da criança, seja porque causa drásticas repercussões no desenvolvimento psicológico do indivíduo alienado, acarretando-lhes severos danos no presente e no futuro, devendo ambos receber o mesmo tratamento por parte do Poder Judiciário (…) 6 – Recurso Provido. À maioria de votos, vencido o relator. (TJ-PE – AI: 3186765 PE, Relator: Stênio José de Sousa Neiva Coêlho, Data de Julgamento: 19/02/2014, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 25/02/2014)[6]

Destarte conforme os entendimentos jurisprudenciais apresentados e balizados nos exatos termos do art. 4º da Lei 12.318/10, as ações declaratórias de alienação parental devem ser processadas de forma autônoma (inicial) ou quando já existindo um processo, ser distribuída incidentalmente em apartados, jamais, em hipótese alguma, dentro de um processo anteriormente em tramite.

Por fim, temos outra questão que causa grande tumulto processual evidenciado em ações declaratórias, envolvendo as partes e os pedidos.

Voltamos ao exemplo do processo de guarda. Imaginem neste caso as partes, ou seja, de um lado o Genitor (pai) que busca a guarda, seja unilateral ou compartilhada, e de outro lado o menor (filho), representado pela genitora (mãe). O pedido do pai seria a guarda do menor.

Noutro exemplo, temos as ações declaratórias de alienação parental, com a seguinte situação: de um lado o Genitor (pai) e do outro, a Genitora (mãe). O pedido é de se ver declarada atos de alienação parental praticados pela mãe.

Desta forma, é claro que nos dois exemplos as partes são distintas e os pedidos antagônicos. Porém em alguns casos, os magistrados, indeferem as ações declaratórias sobe o argumento de que na ação de principal (ex.: ação de guarda) a parte alegou a existência de alienação parental.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. INCIDENTE DE ALIENAÇÃO PARENTAL. AÇÃO ORDINÁRIA. Embora haja identidade de partes, não há identidade de pedido e causa de pedir entre as demandas, não se justificando o apensamento. Ademais, a demanda de alienação parental, cujo trâmite é prioritário, nos termos no art. 4º da Lei 12.318/2010, demandará instrução diferenciada, na medida em que deverá ser procedida a realização de perícias psicológica e/ou psiquiátrica para verificar a ocorrência de tais atos. (…) DERAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70056012792, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 28/11/2013) (TJ-RS – AI: 70056012792 RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Julgamento: 28/11/2013, Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 03/12/2013)[7]

A questão é facilmente resolvida, tendo em vista que, mesmo que nas ações principais se aleguem atos de alienação como “pano de fundo”, não existe pedido específico para ser declarado a alienação parental.

Consequentemente é um erro processual grasso, indeferir as ações declaratórias sob o capenga argumento de existência de fatos levantados de alienação parental em outros processos.

Como esclarecido, mesmo que se alegue em um processo de guarda o possível ato alienatório, deve-se impetrar procedimento próprio de forma incidental, tendo em vista o rito especifico, e por conseguinte, o pedido diverso da outra ação.

Assim, entendemos que existe a impossibilidade de se investigar atos de alienação parental dentro de um procedimento em tramite, primeiro, por causar tumulto processual, sendo as partes distintas e procedimentos específicos e próprios.

No mesmo sentido, aceitar o tramite da ação declaratória dentro de outro procedimento, seria impedir a apuração adequada em processo próprio, desrespeitando e inobservando as perícias e os ritos determinados pela legislação, ferindo os princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.

Notas e Referências:

[1] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12318.htm

[2] http://tj-mg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/129089028/agravo-de-instrumento-cv-ai-10024133857417001-mg

[3] http://trf-2.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/808377/apelacao-civel-ac-131688

[4] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm

[5] http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/123312033/agravo-de-instrumento-ai-70058752627-rs/inteiro-teor-123312043

[6] http://tj-pe.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/159617613/agravo-de-instrumento-ai-3186765-pe

[7] http://tj-rs.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/113547358/agravo-de-instrumento-ai-70056012792-rs/inteiro-teor-113547367

Por Murillo Andrade
Fonte: emporiododireito
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