Tribunal nega guarda unilateral a genitor que não comprovou ocorrência de alienação parental

goo.gl/PZt2vb | A 12ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR), por unanimidade de votos, negou provimento a Agravo de Instrumento interposto por um pai que, embora tenha o laudo psicológico da criança afastado qualquer indício de maus tratos, alegava que a filha estava sendo vítima de alienação parental grave e, em razão disso, pedia a guarda unilateral da menor.

Leia a íntegra do acórdão: 

AGRAVO DE INSTRUMENTO N. XXXXXXXXXX

JUÍZO DE DIREITO DA VARA DE FAMÍLIA E SUCESSÕES DO FORO REGIONAL DE XXXXXXXXXX DA COMARCA DA REGIÃO METROPOLITANA DE XXXXXXXXXX.

AGRAVANTE: XXXXXXXXXX

AGRAVADA: XXXXXXXXXX

RELATOR: DESEMBARGADOR MÁRIO LUIZ RAMIDOFF

DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE MODIFICAÇÃO DE CLÁUSULA DE VISITAÇÃO. REVERSÃO DA GUARDA UNILATERAL ATRIBUÍDA À GENITORA. ALIENAÇÃO PARENTAL. ART. 2º DA LEI N. 12.318/2010. INOCORRÊNCIA. INAPLICABILIDADE DO § 11 DO ART. 85 DA LEI N. 13.105/2015.

1. O art. 4º da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) tem por orientação a doutrina da proteção integral, para, assim, assegurar à criança e ao adolescente um regime especial de garantia (prioridade absoluta), àqueles que se encontram na condição humana peculiar de desenvolvimento.

2. O ato de alienação parental é caracterizado pela interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que as tenham sob a sua autoridade, guarda ou vigilância, para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este – art. 2º da Lei n. 12.318/2010.

3. A inexistência de elementos probatórios suficientes a justificar a reversão – excepcional – do regime de guarda vigente, desautoriza o exercício da guarda unilateral pelo genitor ou até mesmo em sua forma compartilhada.

4. No caso vertente, restou consignado no relatório psicológico a inexistência de alienação parental perpetrada por qualquer uma das Partes.

5. Recurso de agravo de instrumento conhecido e não provido.

VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS.

1. RELATÓRIO

Da análise dos autos, verifica-se que XXXXXXXXXX interpôs agravo de instrumento em face da decisão interlocutória, proferida nos Autos de Ação de Modificação de Cláusula de Visitação n. XXXXXXXXXX, na qual indeferiu o pedido de tutela antecipada para a reversão de guarda, nos seguintes termos:

XXXXXXXXXX.

Em suas razões recursais, o Agravante arguiu que fora constatada alienação parental grave, de modo que os indícios de maus tratos, então, afastados pelo laudo psicológico, são suficientes a ensejar o provimento do vertente recurso para o fim de lhe seja concedida a guarda unilateral da criança. A douta Procuradoria de Justiça do Ministério Público do Estado do Paraná, pronunciou-se pelo conhecimento do recurso, e, no mérito, pelo seu desprovimento. Em síntese, é o relatório.

2. FUNDAMENTOS

2.1 ASPECTOS PROCEDIMENTAIS

De acordo com a atual processualística civil, entende-se que o interposto recurso de agravo de instrumento preenche os pressupostos intrínsecos (cabimento, legitimidade, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo) e extrínsecos (tempestividade, regularidade formal e preparo) de admissibilidade. Portanto, ante inexistência de vícios de ordem pública a serem reconhecidos e/ou declarados, senão, que, tendo sido observados os requisitos objetivos e subjetivos para a admissibilidade recursal, entende-se que o presente recurso de agravo de instrumento deva ser conhecido. Contudo, igual sorte não assiste à pretensão recursal deduzida, consoante a seguir fundamentadamente restará demonstrado.

3. GUARDA

A doutrina da proteção integral pode muito bem ser identificada como a conjugação de saberes/conhecimentos que teóricopragmaticamente se destina à criação, interpretação e aplicação das liberdades públicas, isto é, de direitos individuais e de garantias fundamentais especificamente pertinentes à proteção da criança e do adolescente, com o intuito de promover-lhes a emancipação subjetiva.

Neste sentido, tem-se admitida a utilização de todos os meios e facilidades (art. 3º da Lei n. 8.069/90) para a efetivação dos direitos individuais e das garantias fundamentais pertinentes à cidadania infantojuvenil, vale dizer, a melhoria da qualidade de vida individual e coletiva da criança e do adolescente.

A criança e ao adolescente são, por isso mesmo, considerados sujeitos de Direito, e, portanto, titulares de garantias que lhes asseguram tratamento jurídico-legal diferenciados.

O art. 4º da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) possui como base a proteção integral das crianças e adolescentes, para garantir-lhes um regime especial de proteção, por se acharem na peculiar condição de pessoas em desenvolvimento.

Assim, o poder familiar, decorrente da autoridade parental, afastou-se do conceito de exercício de poder dos pais sobre os filhos e assumiu os contornos de múnus compartilhado pelos pais, no interesse dos filhos, empregando todos os esforços necessários para o seu pleno desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social.

Nada obstante, em se tratando de tutela de interesse de criança e adolescente, cogente é a aplicabilidade da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, ratificada pelo Brasil e promulgada por meio do Decreto n. 99.710 de 21 de novembro de 1990, impondo-se, assim, a observância da doutrina da proteção integral [1], então, objetivamente, consolidada no art. 227 da Constituição da República de 1988, e, regulamentada na Lei 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).

A doutrina da proteção integral da criança deve nortear todas as ações a este direcionadas, de maneira a se adotar a melhor solução, segundo as circunstâncias do caso e a se garantir os cuidados básicos e necessários ao seu pleno desenvolvimento.

Dos elementos de cognição constantes dos Autos, vê-se que a filha infante permaneceu sob os cuidados da mãe, desde a separação de fato das Partes.

Pois, como se viu, a filha-infante está sendo muito bem atendida por sua mãe, senão, é o que restou claramente evidenciado através do laudo psicossocial produzido, senão, veja-se:

XXXXXXXXXX.

Bem por isso, entende-se que não há qualquer elemento probatório, em Direito, admitido, nos Autos, que pudesse legitimamente autorizar, e, mesmo, justificar a alteração – diga-se: excepcional – do regime de guarda, então, judicialmente estabelecido.

3.1 ALIENAÇÃO PARENTAL

De outro lado, observa-se que fora suscitada a ocorrência de alienação parental, a qual, no entanto, requer a presença de situações concretas conforme o que se encontra expressamente regulamentado na Lei n. 12.318/2010, a qual descreve esse instituto jurídico-legal como:

Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Neste aspecto, afigura-se – de igual maneira –, ausente qualquer, prova em Direito admitida, de que a Agravada tenha cometido qualquer ato de alienação parental, então, atestado no laudo psicossocial, in verbis:

Não foram observados atos que configurassem alienação parental na relação entre XXXXXXXXXX e o genitor XXXXXXXXXX.

Não há qualquer indício de que a Agravada não esteja adequadamente cumprindo as funções maternas de maneira responsável, ou, mesmo, de que não possua capacidade pessoal, psicológica, afetiva, social e econômico-financeira para cuidar educar, criar e assistir a sua filha. Sobre a questão versada, pronunciou-se a douta Procuradoria de Justiça do Ministério do Estado do Paraná, in verbis:

Demais disso, não há fatos que indiquem que a mãe não possa zelar pelos cuidados para com a filha, sob sua guarda ou qualquer elemento desabonador da conduta do pai que o impeça de passar algumas horas em sua companhia, mantendo os laços paternofilial. O que se mostra salutar é que as partes tenham maturidade quanto a seus atos e responsabilidades, a fim de que não venham prejudicar o desenvolvimento da filha comum.

Desta maneira, entende-se que a decisão judicial, aqui, objurgada, deve ser mantida por seus próprios e bem lançados fundamentos de fato e de Direito, uma vez que se pautou claramente nas orientações civilizatórias e humanitárias decorrentes da doutrina da proteção integral, então, recepcionada constitucional e estatutariamente pelo ordenamento jurídico brasileiro.

4. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS

Em relação à eventual majoração de honorários advocatícios sucumbenciais, em sede recursal, então, prevista no § 11 do art. 85 da Lei n. 13.105/2015, entende-se que, no vertente caso legal, não se afigura legitimamente plausível, haja vista que a decisão judicial, aqui, objurgada, é legalmente classificada como interlocutória em que não se estipulou verba honorária sucumbencial.

A colenda 15ª (Décima Quinta) Câmara Cível do egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná já firmou entendimento a respeito da temática, aqui, vertida, in verbis:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO INDENIZATÓRIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO. DESCONTOS INDEVIDOS EM CONTA CORRENTE. HONORÁRIOS RECURSAIS NÃO FIXADOS. ALEGADA OMISSÃO. VÍCIO NÃO CONFIGURADO. Não houve inovação no Código de Processo Civil de 2015 quanto à fixação de honorários em sede de agravo de instrumento, não obstante a novel previsão de honorários advocatícios nos recursos, na medida em que a majoração em sede recursal pressupõe a sua fixação anterior, inexistente no caso apreciado. EMBARGOS REJEITADOS. (TJPR – 15ª Câm. Cível – Embargos de Declaração n. 1.567.248- 7/01 – Rel.: Des. Hayton Lee Swain Filho – Unanimidade – j. 23.11.2016)

Mutatis mutandis, o egrégio Superior Tribunal de Justiça já tem firmado entendimento sobre a temática, aqui, vertida, nos seguintes termos:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO QUE, EM PROCESSO DE EXECUÇÃO, ACOLHEU PARCIALMENTE A EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE E DECLAROU A PRESCRIÇÃO DE PARTE DA DÍVIDA EXECUTADA, SEM POR FIM AO PROCESSO. NATUREZA DE DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. RECURSO CABÍVEL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. INTERPOSIÇÃO DE APELAÇÃO. ERRO GROSSEIRO. PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE RECURSAL. INAPLICABILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. […] VII. Não procede o pedido formulado, pela parte agravada – com fundamento no art. 85, § 11, do CPC/2015 e no Enunciado Administrativo 7/STJ –, para que haja condenação da agravante em honorários advocatícios recursais, porquanto aquele dispositivo legal prevê que “o tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente”. Porém, nos presentes autos, não foram anteriormente fixados honorários de advogado, em face da sucumbência recíproca, seja na decisão de 1º Grau, seja no acórdão recorrido. VIII. Agravo interno improvido. (STJ – 2ª Turma – AgInt no REsp. n. 1.517.815/SP – Rel.: Min. Assusete Magalhães – j. em 18/08/2016 – DJe 01/09/2016)

Bem por isso, entende-se que não se afigura juridicamente plausível a majoração de honorários advocatícios sucumbenciais, em sede recursal, prevista no § 11 do art. 85 da Lei n. 13.105/2015 (Código de Processo Civil), uma vez que, sequer, fora judicial estipulada verba honorária, no primeiro grau de jurisdição, pois, afigura-se incabível, haja vista mesmo que se trata de decisão judicial interlocutória

5. CONCLUSÃO

Assim, encaminha-se proposta de voto no sentido de conhecer do recurso de Agravo de Instrumento, e, no mérito, não prover com tutela jurisdicional a pretensão recursal deduzida, confirmando-se, assim, a tutela de urgência, mediante a manutenção da respeitável decisão judicial, aqui, vergastada, por seus próprios e bem lançados fundamentos de fato e de Direito.

6. DISPOSITIVO

ACORDAM os integrantes da 12ª (Décima Segunda) Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em conhecer do recurso de Agravo de Instrumento, e, no mérito, negar-lhe provimento, nos termos do voto do Relator. O julgamento foi presidido pela Excelentíssima Senhora Desembargadora XXXXXXXXXX, bem como dele participaram os Excelentíssimos Senhores Desembargadores XXXXXXXXXX.

Curitiba (PR), 24 de maio de 2017 (quarta-feira)

DESEMBARGADOR MÁRIO LUIZ RAMIDOFF

RELATOR

Notas e Referências:

[1] RAMIDOFF, Mário Luiz. Direito da criança e do adolescente: teoria jurídica da proteção integral. Curitiba: Vicentina. 2008. p. 19. “A doutrina da proteção integral é decorrente da assunção interna de valores humanos afetos especificamente à infância e à juventude disputados tanto no âmbito interno, quanto no âmbito internacional, isto é, somente com o advento da Constituição da República de 1988 estabelece-se, no Brasil, um sistema teórico-pragmático calcado em valores densificados internacionalmente como diretrizes, as quais, por certo, não se encontravam apenas especificados nas declarações, convenções e tratados internacionais”.

Fonte: emporiododireito
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