goo.gl/YTRL6Q | Certo de que é um homem desde que nasceu, Gabriel Botelho Saldanha da Gama retirou o útero e os seios e começou a fazer tratamento com hormônios masculinos em novembro de 2015, aos 53 anos de idade. Os resultados, no entanto, não foram percebidos apenas no corpo, mas também na conta bancária — e não apenas devido aos gastos para pagar os procedimentos. Filho de um ex-militar da Marinha, ele perdeu o benefício da pensão vitalícia dado assim que apresentou os documentos, com nome masculino, ao atualizar o cadastro, no ano passado.
A explicação do juiz do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), reforçada ontem, em primeira instância, pela Justiça Federal, é que, como não atende mais aos requisitos, ele não tem direito a receber a pensão, devida apenas a “filhas mulheres e solteiras” de militares. “O impetrante deixou de preencher um dos requisitos essenciais para a percepção da pensão, o que autoriza o seu cancelamento”, entendeu o juiz federal Frederico Montedonio Rego.
“Como ele se tornou homem, acabou o fato gerador”, resumiu a advogada especialista em direito previdenciário Jane Berwanger. Para Gabriel, não é tão simples. Ele alega que, mesmo depois do tratamento, continua a ser atendido por uma ginecologista, “o que corrobora com o entendimento que ele ainda é biologicamente uma mulher”.
Para reverter a decisão e resgatar o benefício, ele impetrou um mandado de segurança contra o diretor do Serviço de Inativos e Pensionistas do Comando da Marinha. Invocou os princípios constitucionais da dignidade humana, da legalidade e da razoabilidade. Afirmou, ainda, que a sentença que mudou o gênero dele transitou em julgado em julho de 2016, depois que o pai havia morrido, em 2009. E lembrou que, apesar de ter retirado útero e mamas, não fez a cirurgia de transgenitalição, a chamada “mudança de sexo”.
Apesar dos esforços, nenhum dos argumentos foi aceito nos tribunais. “Não seria de se esperar que a Lei nº 3.765/1960 previsse a mudança de gênero como uma hipótese de cancelamento da pensão, situação que, se hoje é inusitada, àquela época era impensável”, declarou o juiz federal, na sentença. Condicionar a possibilidade de alteração do gênero à operação “seria obrigar o indivíduo a se submeter a uma cirurgia complexa e dolorosa e que, em alguns casos, é contraindicada pelos riscos que impõe”, considerou.
Em depoimento para o TJ, o próprio impetrante havia dito que não fez a cirurgia completa porque ela “impõe riscos à minha saúde e à minha vida”. Por isso, o entendimento do magistrado é que “trata-se de um indivíduo do sexo masculino”, não sendo relevante que não se tenha submetido à transgenitalização e que ainda se consulte com ginecologista.
É importante lembrar que a decisão de oficializar a troca de sexo também altera os demais benefícios previdenciários. “Para um indivíduo que nasce do sexo feminino, mas se considera homem, também muda o tempo de contribuição para aposentadoria. Ele terá que contribuir 35 anos e não mais 30”, explicou a advogada Adriane Bramante.
Desde 2001, as filhas solteiras de militares não têm mais direito a receber pensão vitalícia. Para quem já estava nas Forças Armadas nesta época, como o pai de Gabriel, o direito foi mantido, mas com um requisito: que pagassem 1,5% a mais sobre os rendimentos, por mês, para mantê-lo. Foi o que fez o pai dele. Em vez dos 7,5%, ele passou a pagar 9%, contando com o benefício para a filha. Essa diferença no valor não garante contrapartida. “Não é previdência privada, que paga e depois faz um resgate”, explicou Jane.
Em nota, a Marinha informou que não comenta decisões judiciais e que “vem adotando uma postura segura, repudiando qualquer atitude preconceituosa ou de intolerância no âmbito da Força Naval”.
"Para um indivíduo que nasce do sexo feminino mas se considera homem, também muda o tempo de contribuição para aposentadoria. Ele terá que contribuir por 35 anos e não mais 30”, Adriane Bramante, advogada
Por Alessandra Azevedo
Fonte: www.correiobraziliense.com.br
A explicação do juiz do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), reforçada ontem, em primeira instância, pela Justiça Federal, é que, como não atende mais aos requisitos, ele não tem direito a receber a pensão, devida apenas a “filhas mulheres e solteiras” de militares. “O impetrante deixou de preencher um dos requisitos essenciais para a percepção da pensão, o que autoriza o seu cancelamento”, entendeu o juiz federal Frederico Montedonio Rego.
“Como ele se tornou homem, acabou o fato gerador”, resumiu a advogada especialista em direito previdenciário Jane Berwanger. Para Gabriel, não é tão simples. Ele alega que, mesmo depois do tratamento, continua a ser atendido por uma ginecologista, “o que corrobora com o entendimento que ele ainda é biologicamente uma mulher”.
Para reverter a decisão e resgatar o benefício, ele impetrou um mandado de segurança contra o diretor do Serviço de Inativos e Pensionistas do Comando da Marinha. Invocou os princípios constitucionais da dignidade humana, da legalidade e da razoabilidade. Afirmou, ainda, que a sentença que mudou o gênero dele transitou em julgado em julho de 2016, depois que o pai havia morrido, em 2009. E lembrou que, apesar de ter retirado útero e mamas, não fez a cirurgia de transgenitalição, a chamada “mudança de sexo”.
Apesar dos esforços, nenhum dos argumentos foi aceito nos tribunais. “Não seria de se esperar que a Lei nº 3.765/1960 previsse a mudança de gênero como uma hipótese de cancelamento da pensão, situação que, se hoje é inusitada, àquela época era impensável”, declarou o juiz federal, na sentença. Condicionar a possibilidade de alteração do gênero à operação “seria obrigar o indivíduo a se submeter a uma cirurgia complexa e dolorosa e que, em alguns casos, é contraindicada pelos riscos que impõe”, considerou.
Em depoimento para o TJ, o próprio impetrante havia dito que não fez a cirurgia completa porque ela “impõe riscos à minha saúde e à minha vida”. Por isso, o entendimento do magistrado é que “trata-se de um indivíduo do sexo masculino”, não sendo relevante que não se tenha submetido à transgenitalização e que ainda se consulte com ginecologista.
É importante lembrar que a decisão de oficializar a troca de sexo também altera os demais benefícios previdenciários. “Para um indivíduo que nasce do sexo feminino, mas se considera homem, também muda o tempo de contribuição para aposentadoria. Ele terá que contribuir 35 anos e não mais 30”, explicou a advogada Adriane Bramante.
Desde 2001, as filhas solteiras de militares não têm mais direito a receber pensão vitalícia. Para quem já estava nas Forças Armadas nesta época, como o pai de Gabriel, o direito foi mantido, mas com um requisito: que pagassem 1,5% a mais sobre os rendimentos, por mês, para mantê-lo. Foi o que fez o pai dele. Em vez dos 7,5%, ele passou a pagar 9%, contando com o benefício para a filha. Essa diferença no valor não garante contrapartida. “Não é previdência privada, que paga e depois faz um resgate”, explicou Jane.
Em nota, a Marinha informou que não comenta decisões judiciais e que “vem adotando uma postura segura, repudiando qualquer atitude preconceituosa ou de intolerância no âmbito da Força Naval”.
"Para um indivíduo que nasce do sexo feminino mas se considera homem, também muda o tempo de contribuição para aposentadoria. Ele terá que contribuir por 35 anos e não mais 30”, Adriane Bramante, advogada
Por Alessandra Azevedo
Fonte: www.correiobraziliense.com.br