goo.gl/SiST5c | A recente Súmula 593 do Superior Tribunal de Justiça trouxe à tona, novamente, a discussão acerca da vulnerabilidade, nos crimes contra a dignidade sexual, da vítima menor de 14 anos.
Já havíamos enfrentado a questão em artigo anterior, publicado neste conceituado portal jurídico, oportunidade em que foi esclarecido que a vulnerabilidade estabelecida pela Lei nº 12.015/09 abrange:
a) pessoa menor de 14 anos, para os crimes de estupro, corrupção de menores e satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente;
b) pessoa menor de 18 anos, para o crime de favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual;
c) pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
d) pessoa que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
A recente Súmula 593 dispõe: “O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.”
Embora a citada súmula faça menção apenas à vulnerabilidade pela idade da vítima, é correto afirmar que o mesmo raciocínio se estende à vulnerabilidade por enfermidade ou doença mental, em que a vítima não tem o necessário discernimento para a prática do ato.
A bem da verdade, sempre houve acirrada discussão acerca da presunção de violência (atual vulnerabilidade) estampada no revogado art. 224 do Código Penal, antes da alteração determinada pela Lei nº 12.015/09.
Alguns comentaristas do Código Penal argumentavam que a idade de 14 anos contrariaria o costume de algumas regiões do País, em que meninas abaixo dessa idade já se relacionam sexualmente com seus parceiros, até mesmo engravidando e constituindo família e que o legislador, contrariando o princípio da adequação social, insistia em manter o patamar etário, o que acabou por ocorrer com a Lei nº 12.015/09, que simplesmente substituiu a presunção de violência por vulnerabilidade, prestigiando a proteção da infância e da juventude.
Sim, porque o comando legal visa justamente à proteção da infância e juventude, procurando evitar que crianças e adolescentes sejam expostos prematuramente à sexualidade e à libidinagem.
Daí porque não interessa se a vítima menor de 14 anos tem ou não experiência sexual, ou se consentiu ou não na prática da conjunção carnal ou do ato libidinoso diverso.
O comando legal, repita-se, é destinado aos parceiros ou parceiras da criança ou adolescente, para que não pratiquem conjunção carnal ou atos libidinosos diversos com pessoa menor de 14 anos. Caso assim o façam, responderão criminalmente por seus atos, independentemente, como diz a súmula, de eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.
Nossa posição, já consolidada em outras oportunidades, é a de que a presunção “ope legis” em relação ao menor de 14 anos é absoluta, ou seja, a vulnerabilidade é entendida em seu sentido mais literal, de absoluta intocabilidade do bem jurídico protegido, inexistindo, por conseqüência, vulnerabilidade relativa, tratando-se de norma protetiva da infância e juventude no contexto da proteção integral, carreada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo art. 227 da Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Nesse aspecto, é oportuno mencionar um trecho do acórdão proferido nos autos do Recurso Especial nº 1.480.881-PI, que serviu como precedente da súmula referida, em que o relator Ministro Rogério Schietti Cruz ressalta que “a modernidade, a evolução moral dos costumes sociais e o acesso à informação não podem ser vistos como fatores que se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certos segmentos da população física, biológica, social ou psiquicamente fragilizados. No caso de crianças e adolescentes com idade inferior a 14 anos, o reconhecimento de que são pessoas ainda imaturas – em menor ou maior grau – legitima a proteção penal contra todo e qualquer tipo de iniciação sexual precoce a que sejam submetidas por um adulto, dados os riscos imprevisíveis sobre o desenvolvimento futuro de sua personalidade e a impossibilidade de dimensionar as cicatrizes físicas e psíquicas decorrentes de uma decisão que um adolescente ou uma criança de tenra idade ainda não é capaz de livremente tomar.”
E conclui o venerando acórdão, em perfeita síntese, sustentando que “não afasta a responsabilização penal de autores de crimes a aclamada aceitação social da conduta imputada ao réu por moradores de sua pequena cidade natal, ou mesmo pelos familiares da ofendida, sob pena de permitir-se a sujeição do poder punitivo estatal às regionalidades e diferenças socioculturais existentes em um país com dimensões continentais e de tornar írrita a proteção legal e constitucional outorgada a específicos segmentos da população.”
Por Ricardo Antonio Andreucci
Fonte: emporiododireito.com.br
Já havíamos enfrentado a questão em artigo anterior, publicado neste conceituado portal jurídico, oportunidade em que foi esclarecido que a vulnerabilidade estabelecida pela Lei nº 12.015/09 abrange:
a) pessoa menor de 14 anos, para os crimes de estupro, corrupção de menores e satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente;
b) pessoa menor de 18 anos, para o crime de favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual;
c) pessoa que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato;
d) pessoa que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
A recente Súmula 593 dispõe: “O crime de estupro de vulnerável se configura com a conjunção carnal ou prática de ato libidinoso com menor de 14 anos, sendo irrelevante eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.”
Embora a citada súmula faça menção apenas à vulnerabilidade pela idade da vítima, é correto afirmar que o mesmo raciocínio se estende à vulnerabilidade por enfermidade ou doença mental, em que a vítima não tem o necessário discernimento para a prática do ato.
A bem da verdade, sempre houve acirrada discussão acerca da presunção de violência (atual vulnerabilidade) estampada no revogado art. 224 do Código Penal, antes da alteração determinada pela Lei nº 12.015/09.
Alguns comentaristas do Código Penal argumentavam que a idade de 14 anos contrariaria o costume de algumas regiões do País, em que meninas abaixo dessa idade já se relacionam sexualmente com seus parceiros, até mesmo engravidando e constituindo família e que o legislador, contrariando o princípio da adequação social, insistia em manter o patamar etário, o que acabou por ocorrer com a Lei nº 12.015/09, que simplesmente substituiu a presunção de violência por vulnerabilidade, prestigiando a proteção da infância e da juventude.
Sim, porque o comando legal visa justamente à proteção da infância e juventude, procurando evitar que crianças e adolescentes sejam expostos prematuramente à sexualidade e à libidinagem.
Daí porque não interessa se a vítima menor de 14 anos tem ou não experiência sexual, ou se consentiu ou não na prática da conjunção carnal ou do ato libidinoso diverso.
O comando legal, repita-se, é destinado aos parceiros ou parceiras da criança ou adolescente, para que não pratiquem conjunção carnal ou atos libidinosos diversos com pessoa menor de 14 anos. Caso assim o façam, responderão criminalmente por seus atos, independentemente, como diz a súmula, de eventual consentimento da vítima para a prática do ato, sua experiência sexual anterior ou existência de relacionamento amoroso com o agente.
Nossa posição, já consolidada em outras oportunidades, é a de que a presunção “ope legis” em relação ao menor de 14 anos é absoluta, ou seja, a vulnerabilidade é entendida em seu sentido mais literal, de absoluta intocabilidade do bem jurídico protegido, inexistindo, por conseqüência, vulnerabilidade relativa, tratando-se de norma protetiva da infância e juventude no contexto da proteção integral, carreada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo art. 227 da Constituição Federal e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
Nesse aspecto, é oportuno mencionar um trecho do acórdão proferido nos autos do Recurso Especial nº 1.480.881-PI, que serviu como precedente da súmula referida, em que o relator Ministro Rogério Schietti Cruz ressalta que “a modernidade, a evolução moral dos costumes sociais e o acesso à informação não podem ser vistos como fatores que se contrapõem à natural tendência civilizatória de proteger certos segmentos da população física, biológica, social ou psiquicamente fragilizados. No caso de crianças e adolescentes com idade inferior a 14 anos, o reconhecimento de que são pessoas ainda imaturas – em menor ou maior grau – legitima a proteção penal contra todo e qualquer tipo de iniciação sexual precoce a que sejam submetidas por um adulto, dados os riscos imprevisíveis sobre o desenvolvimento futuro de sua personalidade e a impossibilidade de dimensionar as cicatrizes físicas e psíquicas decorrentes de uma decisão que um adolescente ou uma criança de tenra idade ainda não é capaz de livremente tomar.”
E conclui o venerando acórdão, em perfeita síntese, sustentando que “não afasta a responsabilização penal de autores de crimes a aclamada aceitação social da conduta imputada ao réu por moradores de sua pequena cidade natal, ou mesmo pelos familiares da ofendida, sob pena de permitir-se a sujeição do poder punitivo estatal às regionalidades e diferenças socioculturais existentes em um país com dimensões continentais e de tornar írrita a proteção legal e constitucional outorgada a específicos segmentos da população.”
Por Ricardo Antonio Andreucci
Fonte: emporiododireito.com.br