Preso e com salário de R$ 21 mil, delegado recebe gratificação proibida por estatuto

goo.gl/niNXYU | Preso preventivamente desde 25 de novembro de 2017, o delegado de Polícia Civil Gustavo Sotero segue recebendo uma Gratificação do Exercício Policial (GEP) superior a R$ 13 mil, contrariando o que prevê o Estatuto da Polícia Civil. Sotero está preso por matar o advogado Wilson Justo Filho, após uma briga no bar Porão do Alemão, localizado na Zona Oeste de Manaus.  Ele responde por homicídio triplamente qualificado.

O artigo 221 do Estatuto da Polícia Civil (Lei 2.271/94) determina que o policial preso preventivamente fica extralotado, ou seja, sob o controle direto do Departamento de Administração do órgão, e perde o direito à GEP, mantendo os seus vencimentos.  Do salário bruto recebido por Sotero em janeiro deste ano - R$ 21.053,79 - , R$ 13.367,18 eram referentes  à gratificação por atividade policial, algo que ele não vem fazendo pois está preso na Delegacia Geral.  O salário bruto de Sotero consta no Portal da Transparência, e o valor da GEP foi obtido após questionamentos feitos à Polícia Civil.

Segundo a corporação, o salário-base de um delegado de 4ª classe, como é o caso de Sotero, é de R$ 16.237,85, sendo que, deste valor, R$ 2.870,67 são especificados como vencimento e o restante como GEP. Conforme o estatuto da corporação, o vencimento deveria ser mantido, e a GEP, suspensa. Mas o entendimento do órgão é divergente do que diz a Lei 2.271/94, criada para normatizar o regime jurídico peculiar dos funcionários da Polícia Civil do Amazonas.

 A Polícia Civil sustenta que a manutenção do pagamento integral a Sotero tem como base uma emenda constitucional feita, em dezembro de 2013, ao artigo 115, da Constituição do Estado do Amazonas. A referida emenda garante, aos delegados de polícia integrantes das carreiras jurídicas do Estado, "a isonomia com as demais carreiras jurídicas e a independência funcional no exercício do cargo, garantindo-lhes: a) vitaliciedade, que será adquirida após 03 (três) anos de efetivo exercício, não podendo perder o cargo senão por sentença judicial transitada em julgado; b) inamovibilidade, salvo por motivo de interesse público; e c) irredutibilidade de vencimentos".

O órgão defende, com base no artigo, a irredutibilidade dos vencimentos dos delegados de polícia em casos do tipo. E inclui, neste entendimento, a GEP dentro dos vencimentos.

O que diz a lei




Artigo 221 da Lei Nº 2.271/94. Fonte: Sead/AM



Artigo 222 da Lei 2.271/94. Fonte: Sead/AM

Outros benefícios


Em seu salário referente a janeiro de 2018, Sotero teve mantida a GEP e também teve mais dois acréscimos aos seus ganhos. Ele recebeu 25% de gratificação por conta de uma pós-graduação em Administração Pública, concluído em 2004, na Universidade Federal do Piauí. Esta gratificação é recebida pelo delegado desde 2012.

O outro “bônus salarial” é referente a adicionais noturnos pela jornada no mês de novembro, quando ele atuava como delegado plantonista do 1º Distrito Integrado de Polícia. Segundo a Polícia Civil, os valores devidos ao delegado preso foram pagos com atraso de dois meses, e por isso foram para a folha somente no mês de janeiro.

Valor elevado


Em levantamento feito no Portal da Transparência, é possível constatar que, ao longo de 2017 inteiro, quando trabalhou por 11 meses quase que completos,  Sotero recebeu salários maiores que o de janeiro de 2018 em apenas três ocasiões.

No mês de janeiro de 2017, ele teve salário bruto de R$ 30.687,06. Em junho, recebeu R$ 31.246,26. E em novembro, mês em que disparou contra o advogado Wilson Justo Filho, ele teve um salário de R$ 23.161,93. Em todos os outros nove meses de 2017, ele recebeu valores abaixo dos R$ 21.053,79 pagos este ano por um mês em que ele estava recluso.

Legislações distintas


A Constituição do Estado do Amazonas dá às policias Civil e Militar a possibilidade de serem regidas por estatutos próprios. Por conta disso, cada uma dessas corporações tem seus regimes específicos, que, de acordo com a Constituição, definem “estruturas e competências, bem como, direitos e garantias, deveres e prerrogativas de seus integrantes de modo a assegurar a eficiência de suas atividades e atuações harmônicas”.

A Lei 1762/86, que é conhecida como o Estatuto do Funcionário Público, prevê que um servidor estadual preso preventivamente perca um terço de seus vencimentos. A medida não atinge policiais civis por conta do estatuto próprio, que determina a manutenção dos vencimentos e o corte apenas da gratificação.

Três meses do crime


Gustavo Sotero foi preso em flagrante no dia 25 de novembro após disparar contra o advogado Wilson Justo Filho, durante uma briga no Porão do Alemão. No mesmo dia, a prisão dele foi convertida em preventiva depois de uma audiência de custódia.

Em depoimento, o delegado afirmou que agiu em legítima defesa, após receber um soco de Wilson. Além da vítima fatal, os tiros disparados por Sotero deixaram outras três pessoas feridas: a esposa de Wilson, Fabíola Rodrigues Pinto de Oliveira, Mauricio Carvalho Rocha e Iuri José Paiva Dácio de Souza.

A audiência de instrução do delegado foi agendada para o próximo dia 14 de junho, segundo o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM).  Durante a sessão, as testemunhas serão ouvidas e o réu interrogado. Depois da audiência de instrução, são anexados documentos para a comprovação das teses, tanto da acusação, como da defesa.

Por Dante Graça
Fonte: www.acritica.com
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