goo.gl/EhfS42 | Prestar concurso público é a saída para muitos que pretendem estabilidade e salários dignos em sua carreira profissional. O rigor dos concursos, no entanto, exige cada vez mais preparo do candidato, que costuma estudar por anos a fio até conseguir a tão almejada aprovação.
No artigo de hoje, traremos de seis direitos dos concurseiros que você deve saber, acompanhados do devido entendimento jurisprudencial. Caso exista ilegalidades, procure advogada especializada no assunto para resolver sua situação e conquistar aprovação!
O STF pôs fim à controvérsia jurídica sobre candidatos tatuados em 2016. Até o julgamento definitivo, eles eram eliminados do certame porque não teriam atendido à exigência do edital. A Corte Suprema entendeu que a liberdade de expressão dos candidatos deve ser preservada, uma vez que tal exigência seria dessarroada e desproporcional, pois em nada impactam sobre o serviço a ser prestado pelo agente público. No entanto, a Corte ressalvou a possibilidade de restrição dos candidatos caso a tatuagem viole “valores constitucionais”. A expressão, de amplo significado, deve ser precisa em edital, caso contrário, a discricionariedade administrativa pode dar azo a ilegalidades.
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 838 DO PLENÁRIO VIRTUAL. TATUAGEM. CONCURSO PÚBLICO. EDITAL. REQUISITOS PARA O DESEMPENHO DE UMA FUNÇÃO PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM LEI FORMAL ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO ART. 37, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DA CORTE. IMPEDIMENTO DO PROVIMENTO DE CARGO, EMPREGO OU FUNÇÃO PÚBLICA DECORRENTE DA EXISTÊNCIA DE TATUAGEM NO CORPO DO CANDIDATO. REQUISITO OFENSIVO A DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CIDADÃOS. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA IGUALDADE, DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DA PROPORCIONALIDADE E DO LIVRE ACESSO AOS CARGOS PÚBLICOS. INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA ESTATAL DE QUE A TATUAGEM ESTEJA DENTRO DE DETERMINADO TAMANHO E PARÂMETROS ESTÉTICOS. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 5º, I, E 37, I E II, DA CRFB/88. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. RESTRIÇÃO. AS TATUAGENS QUE EXTERIORIZEM VALORES EXCESSIVAMENTE OFENSIVOS À DIGNIDADE DOS SERES HUMANOS, AO DESEMPENHO DA FUNÇÃO PÚBLICA PRETENDIDA, INCITAÇÃO À VIOLÊNCIA IMINENTE, AMEAÇAS REAIS OU REPRESENTEM OBSCENIDADES IMPEDEM O ACESSO A UMA FUNÇÃO PÚBLICA, SEM PREJUÍZO DO INAFASTÁVEL JUDICIAL REVIEW. CONSTITUCIONALIDADE. INCOMPATIBILIDADE COM OS VALORES ÉTICOS E SOCIAIS DA FUNÇÃO PÚBLICA A SER DESEMPENHADA. DIREITO COMPARADO. IN CASU, A EXCLUSÃO DO CANDIDATO SE DEU, EXCLUSIVAMENTE, POR MOTIVOS ESTÉTICOS. CONFIRMAÇÃO DA RESTRIÇÃO PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONTRARIEDADE ÀS TESES ORA DELIMITADAS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. O princípio da legalidade norteia os requisitos dos editais de concurso público. 2. O artigo 37, I, da Constituição da República, ao impor, expressamente, que “os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei”, evidencia a frontal inconstitucionalidade de toda e qualquer restrição para o desempenho de uma função pública contida em editais, regulamentos e portarias que não tenham amparo legal. (Precedentes: RE 593198 AgR, Relator Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, DJe 01-10-2013; ARE 715061 AgR, Relator Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 19-06-2013; RE 558833 AgR, Relatora Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe 25-09-2009; RE 398567 AgR, Relator Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ 24-03-2006; e MS 20.973, Relator Min. Paulo Brossard, Plenário, julgado em 06/12/1989, DJ 24-04-1992). 3. O Legislador não pode escudar-se em uma pretensa discricionariedade para criar barreiras legais arbitrárias e desproporcionais para o acesso às funções públicas, de modo a ensejar a sensível diminuição do número de possíveis competidores e a impossibilidade de escolha, pela Administração, daqueles que são os melhores. 4. Os requisitos legalmente previstos para o desempenho de uma função pública devem ser compatíveis com a natureza e atribuições do cargo. (No mesmo sentido: ARE 678112 RG, Relator Min. Luiz Fux, julgado em 25/04/2013, DJe 17-05-2013). 5. A tatuagem, no curso da história da sociedade, se materializou de modo a alcançar os mais diversos e heterogêneos grupos, com as mais diversas idades, conjurando a pecha de ser identificada como marca de marginalidade, mas, antes, de obra artística. 6. As pigmentações de caráter permanente inseridas voluntariamente em partes dos corpos dos cidadãos configuram instrumentos de exteriorização da liberdade de manifestação do pensamento e de expressão, valores amplamente tutelados pelo ordenamento jurídico brasileiro (CRFB/88, artigo 5º, IV e IX). 7. É direito fundamental do cidadão preservar sua imagem como reflexo de sua identidade, ressoando indevido o desestímulo estatal à inclusão de tatuagens no corpo. 8. O Estado não pode desempenhar o papel de adversário da liberdade de expressão, incumbindo-lhe, ao revés, assegurar que minorias possam se manifestar livremente. 9. O Estado de Direito republicano e democrático, impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada não, apenas, pela sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade. 10. A democracia funda-se na presunção em favor da liberdade do cidadão, o que pode ser sintetizado pela expressão germânica “Freiheitsvermutung” (presunção de liberdade), teoria corroborada pela doutrina norte-americana do primado da liberdade (preferred freedom doctrine), razão pela qual ao Estado contemporâneo se impõe o estímulo ao livre intercâmbio de opiniões em um mercado de idéias (free marktplace of ideas a que se refere John Milton) indispensável para a formação da opinião pública. 11. Os princípios da liberdade e da igualdade, este último com esteio na doutrina da desigualdade justificada, fazem exsurgir o reconhecimento da ausência de qualquer justificativa para que a Administração Pública visualize, em pessoas que possuem tatuagens, marcas de marginalidade ou de inaptidão física ou mental para o exercício de determinado cargo público. 12. O Estado não pode considerar aprioristicamente como parâmetro discriminatório para o ingresso em uma carreira pública o fato de uma pessoa possuir tatuagens, visíveis ou não. 13. A sociedade democrática brasileira pós-88, plural e multicultural, não acolhe a idiossincrasia de que uma pessoa com tatuagens é desprovida de capacidade e idoneidade para o desempenho das atividades de um cargo público. 14. As restrições estatais para o exercício de funções públicas originadas do uso de tatuagens devem ser excepcionais, na medida em que implicam uma interferência incisiva do Poder Público em direitos fundamentais diretamente relacionados ao modo como o ser humano desenvolve a sua personalidade. 15. A cláusula editalícia que cria condição ou requisito capaz de restringir o acesso a cargo, emprego ou função pública por candidatos possuidores de tatuagens, pinturas ou marcas, quaisquer que sejam suas extensões e localizações, visíveis ou não, desde que não representem símbolos ou inscrições alusivas a ideologias que exteriorizem valores excessivamente ofensivos à dignidade dos seres humanos, ao desempenho da função pública pretendida, incitação à violência iminente, ameaças reais ou representem obscenidades, é inconstitucional. 16. A tatuagem considerada obscena deve submeter-se ao Miller-Test, que, por seu turno, reclama três requisitos que repugnam essa forma de pigmentação, a saber: (i) o homem médio, seguindo padrões contemporâneos da comunidade, considere que a obra, tida como um todo, atrai o interesse lascivo; (ii) quando a obra retrata ou descreve, de modo ofensivo, conduta sexual, nos termos do que definido na legislação estadual aplicável, (iii) quando a obra, como um todo, não possua um sério valor literário, artístico, político ou científico. 17. A tatuagem que incite a prática de uma violência iminente pode impedir o desempenho de uma função pública quando ostentar a aptidão de provocar uma reação violenta imediata naquele que a visualiza, nos termos do que predica a doutrina norte-americana das “fighting words”, como, v.g., “morte aos delinquentes”. 18. As teses objetivas fixadas em sede de repercussão geral são: (i) os requisitos do edital para o ingresso em cargo, emprego ou função pública devem ter por fundamento lei em sentido formal e material, (ii) editais de concurso público não podem estabelecer restrição a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais em razão de conteúdo que viole valores constitucionais. 19. In casu, o acórdão recorrido extraordinariamente assentou que “a tatuagem do ora apelado não atende aos requisitos do edital. Muito embora não cubra todo o membro inferior direito, está longe de ser de pequenas dimensões. Ocupa quase a totalidade lateral da panturrilha e, além disso, ficará visível quando utilizados os uniformes referidos no item 5.4.8.3. É o quanto basta para se verificar que não ocorreu violação a direito líquido e certo, denegando-se a segurança”. Verifica-se dos autos que a reprovação do candidato se deu, apenas, por motivos estéticos da tatuagem que o recorrente ostenta. 19.1. Consectariamente o acórdão recorrido colide com as duas teses firmadas nesta repercussão geral: (i) a manutenção de inconstitucional restrição elencada em edital de concurso público sem lei que a estabeleça; (ii) a confirmação de cláusula de edital que restringe a participação, em concurso público, do candidato, exclusivamente por ostentar tatuagem visível, sem qualquer simbologia que justificasse, nos termos assentados pela tese objetiva de repercussão geral, a restrição de participação no concurso público. 19.2. Os parâmetros adotados pelo edital impugnado, mercê de não possuírem fundamento de validade em lei, revelam-se preconceituosos, discriminatórios e são desprovidos de razoabilidade, o que afronta um dos objetivos fundamentais do País consagrado na Constituição da República, qual seja, o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º, IV). 20. Recurso Extraordinário a que se dá provimento.
(RE 898450, Relator (a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 17/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-114 DIVULG 30-05-2017 PUBLIC 31-05-2017)
Trata-se de ação afirmativa para estimular o ingresso da população negra, maioria em nosso país e marginalizada historicamente, nos cargos públicos. A Lei n. 12.990/14 determinou a reserva de 20% das vagas do serviço público federal a candidatos negros. Outros entes federativos, como o Município de São Paulo, também criaram norma com idêntico objetivo.
A norma foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, que também determinou sua aplicação para as Forças Armadas.
Ementa: Direito Constitucional. Ação Direta de Constitucionalidade. Reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014. Procedência do pedido. 1. É constitucional a Lei nº 12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, por três fundamentos. 1.1. Em primeiro lugar, a desequiparação promovida pela política de ação afirmativa em questão está em consonância com o princípio da isonomia. Ela se funda na necessidade de superar o racismo estrutural e institucional ainda existente na sociedade brasileira, e garantir a igualdade material entre os cidadãos, por meio da distribuição mais equitativa de bens sociais e da promoção do reconhecimento da população afrodescendente. 1.2. Em segundo lugar, não há violação aos princípios do concurso público e da eficiência. A reserva de vagas para negros não os isenta da aprovação no concurso público. Como qualquer outro candidato, o beneficiário da política deve alcançar a nota necessária para que seja considerado apto a exercer, de forma adequada e eficiente, o cargo em questão. Além disso, a incorporação do fator “raça” como critério de seleção, ao invés de afetar o princípio da eficiência, contribui para sua realização em maior extensão, criando uma “burocracia representativa”, capaz de garantir que os pontos de vista e interesses de toda a população sejam considerados na tomada de decisões estatais. 1.3. Em terceiro lugar, a medida observa o princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão. A existência de uma política de cotas para o acesso de negros à educação superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária ou desproporcional em sentido estrito. Isso porque: (i) nem todos os cargos e empregos públicos exigem curso superior; (ii) ainda quando haja essa exigência, os beneficiários da ação afirmativa no serviço público podem não ter sido beneficiários das cotas nas universidades públicas; e (iii) mesmo que o concorrente tenha ingressado em curso de ensino superior por meio de cotas, há outros fatores que impedem os negros de competir em pé de igualdade nos concursos públicos, justificando a política de ação afirmativa instituída pela Lei nº 12.990/2014. 2. Ademais, a fim de garantir a efetividade da política em questão, também é constitucional a instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação (e.g., a exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do concurso), desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa. 3. Por fim, a administração pública deve atentar para os seguintes parâmetros: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii) os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira funcional do beneficiário da reserva de vagas. 4. Procedência do pedido, para fins de declarar a integral constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014. Tese de julgamento: “É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa”.
(ADC 41, Relator (a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 16-08-2017 PUBLIC 17-08-2017)
Trata-se de ação afirmativa para inserir pessoas com deficiência no serviço público, previsto no art. 37, VIII, da Constituição Federal.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
VIII - a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão; (...).
No plano federal, a Lei n. 8.112/90 determinou a reserva de até 20% das vagas oferecidas no concurso às pessoas com deficiência.
Art. 5o São requisitos básicos para investidura em cargo público:
(...)
§ 2o Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso. (...)
O Decreto n. 3.298/99, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, determina a reserva de no mínimo 5% das vagas. Caso a aplicação do percentual resulte em número fracionado, deverá haver o arredondamento das vagas para o próximo número inteiro.
Art. 37. Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador.
§ 1o O candidato portador de deficiência, em razão da necessária igualdade de condições, concorrerá a todas as vagas, sendo reservado no mínimo o percentual de cinco por cento em face da classificação obtida.
§ 2o Caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subseqüente.
Se o órgão contratar funcionários terceirizados para desempenhar as mesmas ou semelhantes funções do concurso público durante seu prazo de validade, o Judiciário entende que a contratação de terceirizados indica que há vagas e necessidade de mais servidores. Há expectativa de direito ao candidato, o que demonstra seu direito subjetivo de ser convocado. O ato que determinou a contratação de terceirizados é considerado precário e que afronta o art. 37, II, da CF.
APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. EXPECTATIVA DE DIREITO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL TERCEIRIZADO. ILEGALIDADE.
DIREITO ADQUIRIDO "A aprovação em concurso público gera direito subjetivo à nomeação à vaga existente, respeitada a ordem de classificação do candidato aprovado. Tal direito subjetivo afasta a conduta da entidade estatal que traduza preterição direta ou indireta, afastando também a validade da inércia quanto à convocação dos aprovados nas vagas existentes. A decisão de não convocação somente pode ocorrer em situações excepcionais e desde que consistentemente motivadas, fundadas em fatores que se caracterizem, simultaneamente, pela superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade. Não configuradas tais circunstâncias excepcionais e motivadas, porém nítida preferência pela preterição indireta, via terceirização, confere-se procedência aos pleitos exordiais da ação civil pública proposta pelo MPT. Correta, portanto, a decisão recorrida. Agravo de instrumento desprovido (TRT 10ª Região, AIRR - 167700-87.2009.5.06.0003, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 27/11/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: 29/11/2013)".
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. CONCURSO PÚBLICO. EXISTÊNCIA DE CANDIDATO APROVADO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL TERCEIRIZADO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO: PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(STF, ARE 820899 RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 19 ago. 2014).
A investigação social do candidato deve seguir o princípio da presunção da inocência. Isso significa que as informações colhidas durante a investigação que digam respeito a procedimentos que ainda estejam pendentes de recursos administrativos ou judiciais não podem prejudicar o candidato. A pesquisa do órgão contratante deve ser criteriosa e objetiva. Ou seja, a discricionariedade administrativa não é absoluta, pois se sujeita aos ditames constitucionais.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. ATENDENTE, ESPECIALISTA E TÉCNICO DE REINTEGRAÇÃO SOCIOEDUCATIVO. SINDICÂNCIA DE VIDA PREGRESSA E INVESTIGAÇÃO SOCIAL. PROCESSOS CIVIS E PENAIS. CANDIDATO FIGURA COMO VÍTIMA. EXCLUSÃO. CERTAME. ILEGALIDADE. APLICAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA, DA CULPABILIDADE E DA RAZOABILIDADE.
1. Alegalidade do ato administrativo, incluído a observância aos princípios constitucionais e administrativos, está sujeita a controle judicial, sem que implique em usurpação de competência ou infração ao princípio da separação de poderes.
2. Não se refuta a legalidade da exigência editalícia de que os candidatos a provimento dos cargos públicos de Atendente de Reintegração Socioeducativa de Especialista e Técnico Socieducativo demonstrem procedimento irrepreensível e idoneidade moral inatacável, mormente quando suas atividades estarão diretamente relacionadas à guarda, à vigilância, ao acompanhamento e à segurança de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de privação de liberdade e de restrição de direitos.
3. Nada obstante, tal exigência, embora recomendável para o provimento de qualquer cargo público, deve ser pautada pela observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sob pena de violação do princípio da presunção de inocência, disposto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, o qual estabelece que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
4. No caso sub judice, constata-se que o autor foi considerado inapto na sindicância de vida pregressa por constarem, em seu nome, alguns registros policiais e duas ações judiciais, sendo que em todas as ocorrências figura como vítima.
5. A mera existência de registros criminais e de ações judiciais não torna o candidato objetivamente desprovido de idoneidade moral para o exercício de cargo público e não pode, por si só, implicar em sua exclusão de concurso público, sob pena de violação aos princípios da presunção de inocência, da culpabilidade e da razoabilidade.
6. Remessa necessária admitida e desprovida.
TJ/DF, 3ª TURMA CÍVEL, Rel. Min. Maria de Lourdes Abreu, j. 4 abr. 2018.
“Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público.”, eis o teor da Súmula Vinculante n. 44, aprovada em 08/04/2015. Dessa forma, se somente o edital exigir o exame psicotécnico como requisito para habilitação do candidato, tem-se violação ao princípio da legalidade.
Publicado originalmente no blog do Ferreira Nunes Advocacia em 15 abr. 2018.
Alynne Nayara Ferreira Nunes é advogada fundadora do Ferreira Nunes Advocacia. E-mail para contato: alynne@ferreiranunesadvocacia.com.br. Contate-nos, também, via Whatsapp: 11 9 7049-1696.
Por Alynne Nunes
Fonte: Jus Brasil
No artigo de hoje, traremos de seis direitos dos concurseiros que você deve saber, acompanhados do devido entendimento jurisprudencial. Caso exista ilegalidades, procure advogada especializada no assunto para resolver sua situação e conquistar aprovação!
1. Candidatos tatuados não podem ser eliminados
O STF pôs fim à controvérsia jurídica sobre candidatos tatuados em 2016. Até o julgamento definitivo, eles eram eliminados do certame porque não teriam atendido à exigência do edital. A Corte Suprema entendeu que a liberdade de expressão dos candidatos deve ser preservada, uma vez que tal exigência seria dessarroada e desproporcional, pois em nada impactam sobre o serviço a ser prestado pelo agente público. No entanto, a Corte ressalvou a possibilidade de restrição dos candidatos caso a tatuagem viole “valores constitucionais”. A expressão, de amplo significado, deve ser precisa em edital, caso contrário, a discricionariedade administrativa pode dar azo a ilegalidades.
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 838 DO PLENÁRIO VIRTUAL. TATUAGEM. CONCURSO PÚBLICO. EDITAL. REQUISITOS PARA O DESEMPENHO DE UMA FUNÇÃO PÚBLICA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO EM LEI FORMAL ESTADUAL. IMPOSSIBILIDADE. OFENSA AO ART. 37, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. REAFIRMAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA PACÍFICA DA CORTE. IMPEDIMENTO DO PROVIMENTO DE CARGO, EMPREGO OU FUNÇÃO PÚBLICA DECORRENTE DA EXISTÊNCIA DE TATUAGEM NO CORPO DO CANDIDATO. REQUISITO OFENSIVO A DIREITOS FUNDAMENTAIS DOS CIDADÃOS. VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA IGUALDADE, DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA, DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DA PROPORCIONALIDADE E DO LIVRE ACESSO AOS CARGOS PÚBLICOS. INCONSTITUCIONALIDADE DA EXIGÊNCIA ESTATAL DE QUE A TATUAGEM ESTEJA DENTRO DE DETERMINADO TAMANHO E PARÂMETROS ESTÉTICOS. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 5º, I, E 37, I E II, DA CRFB/88. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. RESTRIÇÃO. AS TATUAGENS QUE EXTERIORIZEM VALORES EXCESSIVAMENTE OFENSIVOS À DIGNIDADE DOS SERES HUMANOS, AO DESEMPENHO DA FUNÇÃO PÚBLICA PRETENDIDA, INCITAÇÃO À VIOLÊNCIA IMINENTE, AMEAÇAS REAIS OU REPRESENTEM OBSCENIDADES IMPEDEM O ACESSO A UMA FUNÇÃO PÚBLICA, SEM PREJUÍZO DO INAFASTÁVEL JUDICIAL REVIEW. CONSTITUCIONALIDADE. INCOMPATIBILIDADE COM OS VALORES ÉTICOS E SOCIAIS DA FUNÇÃO PÚBLICA A SER DESEMPENHADA. DIREITO COMPARADO. IN CASU, A EXCLUSÃO DO CANDIDATO SE DEU, EXCLUSIVAMENTE, POR MOTIVOS ESTÉTICOS. CONFIRMAÇÃO DA RESTRIÇÃO PELO ACÓRDÃO RECORRIDO. CONTRARIEDADE ÀS TESES ORA DELIMITADAS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. 1. O princípio da legalidade norteia os requisitos dos editais de concurso público. 2. O artigo 37, I, da Constituição da República, ao impor, expressamente, que “os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei”, evidencia a frontal inconstitucionalidade de toda e qualquer restrição para o desempenho de uma função pública contida em editais, regulamentos e portarias que não tenham amparo legal. (Precedentes: RE 593198 AgR, Relator Min. Dias Toffoli, Primeira Turma, julgado em 06/08/2013, DJe 01-10-2013; ARE 715061 AgR, Relator Min. Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 19-06-2013; RE 558833 AgR, Relatora Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, DJe 25-09-2009; RE 398567 AgR, Relator Min. Eros Grau, Primeira Turma, DJ 24-03-2006; e MS 20.973, Relator Min. Paulo Brossard, Plenário, julgado em 06/12/1989, DJ 24-04-1992). 3. O Legislador não pode escudar-se em uma pretensa discricionariedade para criar barreiras legais arbitrárias e desproporcionais para o acesso às funções públicas, de modo a ensejar a sensível diminuição do número de possíveis competidores e a impossibilidade de escolha, pela Administração, daqueles que são os melhores. 4. Os requisitos legalmente previstos para o desempenho de uma função pública devem ser compatíveis com a natureza e atribuições do cargo. (No mesmo sentido: ARE 678112 RG, Relator Min. Luiz Fux, julgado em 25/04/2013, DJe 17-05-2013). 5. A tatuagem, no curso da história da sociedade, se materializou de modo a alcançar os mais diversos e heterogêneos grupos, com as mais diversas idades, conjurando a pecha de ser identificada como marca de marginalidade, mas, antes, de obra artística. 6. As pigmentações de caráter permanente inseridas voluntariamente em partes dos corpos dos cidadãos configuram instrumentos de exteriorização da liberdade de manifestação do pensamento e de expressão, valores amplamente tutelados pelo ordenamento jurídico brasileiro (CRFB/88, artigo 5º, IV e IX). 7. É direito fundamental do cidadão preservar sua imagem como reflexo de sua identidade, ressoando indevido o desestímulo estatal à inclusão de tatuagens no corpo. 8. O Estado não pode desempenhar o papel de adversário da liberdade de expressão, incumbindo-lhe, ao revés, assegurar que minorias possam se manifestar livremente. 9. O Estado de Direito republicano e democrático, impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada não, apenas, pela sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade. 10. A democracia funda-se na presunção em favor da liberdade do cidadão, o que pode ser sintetizado pela expressão germânica “Freiheitsvermutung” (presunção de liberdade), teoria corroborada pela doutrina norte-americana do primado da liberdade (preferred freedom doctrine), razão pela qual ao Estado contemporâneo se impõe o estímulo ao livre intercâmbio de opiniões em um mercado de idéias (free marktplace of ideas a que se refere John Milton) indispensável para a formação da opinião pública. 11. Os princípios da liberdade e da igualdade, este último com esteio na doutrina da desigualdade justificada, fazem exsurgir o reconhecimento da ausência de qualquer justificativa para que a Administração Pública visualize, em pessoas que possuem tatuagens, marcas de marginalidade ou de inaptidão física ou mental para o exercício de determinado cargo público. 12. O Estado não pode considerar aprioristicamente como parâmetro discriminatório para o ingresso em uma carreira pública o fato de uma pessoa possuir tatuagens, visíveis ou não. 13. A sociedade democrática brasileira pós-88, plural e multicultural, não acolhe a idiossincrasia de que uma pessoa com tatuagens é desprovida de capacidade e idoneidade para o desempenho das atividades de um cargo público. 14. As restrições estatais para o exercício de funções públicas originadas do uso de tatuagens devem ser excepcionais, na medida em que implicam uma interferência incisiva do Poder Público em direitos fundamentais diretamente relacionados ao modo como o ser humano desenvolve a sua personalidade. 15. A cláusula editalícia que cria condição ou requisito capaz de restringir o acesso a cargo, emprego ou função pública por candidatos possuidores de tatuagens, pinturas ou marcas, quaisquer que sejam suas extensões e localizações, visíveis ou não, desde que não representem símbolos ou inscrições alusivas a ideologias que exteriorizem valores excessivamente ofensivos à dignidade dos seres humanos, ao desempenho da função pública pretendida, incitação à violência iminente, ameaças reais ou representem obscenidades, é inconstitucional. 16. A tatuagem considerada obscena deve submeter-se ao Miller-Test, que, por seu turno, reclama três requisitos que repugnam essa forma de pigmentação, a saber: (i) o homem médio, seguindo padrões contemporâneos da comunidade, considere que a obra, tida como um todo, atrai o interesse lascivo; (ii) quando a obra retrata ou descreve, de modo ofensivo, conduta sexual, nos termos do que definido na legislação estadual aplicável, (iii) quando a obra, como um todo, não possua um sério valor literário, artístico, político ou científico. 17. A tatuagem que incite a prática de uma violência iminente pode impedir o desempenho de uma função pública quando ostentar a aptidão de provocar uma reação violenta imediata naquele que a visualiza, nos termos do que predica a doutrina norte-americana das “fighting words”, como, v.g., “morte aos delinquentes”. 18. As teses objetivas fixadas em sede de repercussão geral são: (i) os requisitos do edital para o ingresso em cargo, emprego ou função pública devem ter por fundamento lei em sentido formal e material, (ii) editais de concurso público não podem estabelecer restrição a pessoas com tatuagem, salvo situações excepcionais em razão de conteúdo que viole valores constitucionais. 19. In casu, o acórdão recorrido extraordinariamente assentou que “a tatuagem do ora apelado não atende aos requisitos do edital. Muito embora não cubra todo o membro inferior direito, está longe de ser de pequenas dimensões. Ocupa quase a totalidade lateral da panturrilha e, além disso, ficará visível quando utilizados os uniformes referidos no item 5.4.8.3. É o quanto basta para se verificar que não ocorreu violação a direito líquido e certo, denegando-se a segurança”. Verifica-se dos autos que a reprovação do candidato se deu, apenas, por motivos estéticos da tatuagem que o recorrente ostenta. 19.1. Consectariamente o acórdão recorrido colide com as duas teses firmadas nesta repercussão geral: (i) a manutenção de inconstitucional restrição elencada em edital de concurso público sem lei que a estabeleça; (ii) a confirmação de cláusula de edital que restringe a participação, em concurso público, do candidato, exclusivamente por ostentar tatuagem visível, sem qualquer simbologia que justificasse, nos termos assentados pela tese objetiva de repercussão geral, a restrição de participação no concurso público. 19.2. Os parâmetros adotados pelo edital impugnado, mercê de não possuírem fundamento de validade em lei, revelam-se preconceituosos, discriminatórios e são desprovidos de razoabilidade, o que afronta um dos objetivos fundamentais do País consagrado na Constituição da República, qual seja, o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (art. 3º, IV). 20. Recurso Extraordinário a que se dá provimento.
(RE 898450, Relator (a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 17/08/2016, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-114 DIVULG 30-05-2017 PUBLIC 31-05-2017)
2. Cotas raciais
Trata-se de ação afirmativa para estimular o ingresso da população negra, maioria em nosso país e marginalizada historicamente, nos cargos públicos. A Lei n. 12.990/14 determinou a reserva de 20% das vagas do serviço público federal a candidatos negros. Outros entes federativos, como o Município de São Paulo, também criaram norma com idêntico objetivo.
A norma foi declarada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, que também determinou sua aplicação para as Forças Armadas.
Ementa: Direito Constitucional. Ação Direta de Constitucionalidade. Reserva de vagas para negros em concursos públicos. Constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014. Procedência do pedido. 1. É constitucional a Lei nº 12.990/2014, que reserva a pessoas negras 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública federal direta e indireta, por três fundamentos. 1.1. Em primeiro lugar, a desequiparação promovida pela política de ação afirmativa em questão está em consonância com o princípio da isonomia. Ela se funda na necessidade de superar o racismo estrutural e institucional ainda existente na sociedade brasileira, e garantir a igualdade material entre os cidadãos, por meio da distribuição mais equitativa de bens sociais e da promoção do reconhecimento da população afrodescendente. 1.2. Em segundo lugar, não há violação aos princípios do concurso público e da eficiência. A reserva de vagas para negros não os isenta da aprovação no concurso público. Como qualquer outro candidato, o beneficiário da política deve alcançar a nota necessária para que seja considerado apto a exercer, de forma adequada e eficiente, o cargo em questão. Além disso, a incorporação do fator “raça” como critério de seleção, ao invés de afetar o princípio da eficiência, contribui para sua realização em maior extensão, criando uma “burocracia representativa”, capaz de garantir que os pontos de vista e interesses de toda a população sejam considerados na tomada de decisões estatais. 1.3. Em terceiro lugar, a medida observa o princípio da proporcionalidade em sua tríplice dimensão. A existência de uma política de cotas para o acesso de negros à educação superior não torna a reserva de vagas nos quadros da administração pública desnecessária ou desproporcional em sentido estrito. Isso porque: (i) nem todos os cargos e empregos públicos exigem curso superior; (ii) ainda quando haja essa exigência, os beneficiários da ação afirmativa no serviço público podem não ter sido beneficiários das cotas nas universidades públicas; e (iii) mesmo que o concorrente tenha ingressado em curso de ensino superior por meio de cotas, há outros fatores que impedem os negros de competir em pé de igualdade nos concursos públicos, justificando a política de ação afirmativa instituída pela Lei nº 12.990/2014. 2. Ademais, a fim de garantir a efetividade da política em questão, também é constitucional a instituição de mecanismos para evitar fraudes pelos candidatos. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação (e.g., a exigência de autodeclaração presencial perante a comissão do concurso), desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa. 3. Por fim, a administração pública deve atentar para os seguintes parâmetros: (i) os percentuais de reserva de vaga devem valer para todas as fases dos concursos; (ii) a reserva deve ser aplicada em todas as vagas oferecidas no concurso público (não apenas no edital de abertura); (iii) os concursos não podem fracionar as vagas de acordo com a especialização exigida para burlar a política de ação afirmativa, que só se aplica em concursos com mais de duas vagas; e (iv) a ordem classificatória obtida a partir da aplicação dos critérios de alternância e proporcionalidade na nomeação dos candidatos aprovados deve produzir efeitos durante toda a carreira funcional do beneficiário da reserva de vagas. 4. Procedência do pedido, para fins de declarar a integral constitucionalidade da Lei nº 12.990/2014. Tese de julgamento: “É constitucional a reserva de 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos no âmbito da administração pública direta e indireta. É legítima a utilização, além da autodeclaração, de critérios subsidiários de heteroidentificação, desde que respeitada a dignidade da pessoa humana e garantidos o contraditório e a ampla defesa”.
(ADC 41, Relator (a): Min. ROBERTO BARROSO, Tribunal Pleno, julgado em 08/06/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-180 DIVULG 16-08-2017 PUBLIC 17-08-2017)
3. Cotas para pessoas com deficiência
Trata-se de ação afirmativa para inserir pessoas com deficiência no serviço público, previsto no art. 37, VIII, da Constituição Federal.
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...)
VIII - a lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão; (...).
No plano federal, a Lei n. 8.112/90 determinou a reserva de até 20% das vagas oferecidas no concurso às pessoas com deficiência.
Art. 5o São requisitos básicos para investidura em cargo público:
(...)
§ 2o Às pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso. (...)
O Decreto n. 3.298/99, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência, determina a reserva de no mínimo 5% das vagas. Caso a aplicação do percentual resulte em número fracionado, deverá haver o arredondamento das vagas para o próximo número inteiro.
Art. 37. Fica assegurado à pessoa portadora de deficiência o direito de se inscrever em concurso público, em igualdade de condições com os demais candidatos, para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis com a deficiência de que é portador.
§ 1o O candidato portador de deficiência, em razão da necessária igualdade de condições, concorrerá a todas as vagas, sendo reservado no mínimo o percentual de cinco por cento em face da classificação obtida.
§ 2o Caso a aplicação do percentual de que trata o parágrafo anterior resulte em número fracionado, este deverá ser elevado até o primeiro número inteiro subseqüente.
4. Contratação de terceirizados gera convocação
Se o órgão contratar funcionários terceirizados para desempenhar as mesmas ou semelhantes funções do concurso público durante seu prazo de validade, o Judiciário entende que a contratação de terceirizados indica que há vagas e necessidade de mais servidores. Há expectativa de direito ao candidato, o que demonstra seu direito subjetivo de ser convocado. O ato que determinou a contratação de terceirizados é considerado precário e que afronta o art. 37, II, da CF.
APROVAÇÃO EM CONCURSO PÚBLICO. EXPECTATIVA DE DIREITO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL TERCEIRIZADO. ILEGALIDADE.
DIREITO ADQUIRIDO "A aprovação em concurso público gera direito subjetivo à nomeação à vaga existente, respeitada a ordem de classificação do candidato aprovado. Tal direito subjetivo afasta a conduta da entidade estatal que traduza preterição direta ou indireta, afastando também a validade da inércia quanto à convocação dos aprovados nas vagas existentes. A decisão de não convocação somente pode ocorrer em situações excepcionais e desde que consistentemente motivadas, fundadas em fatores que se caracterizem, simultaneamente, pela superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade. Não configuradas tais circunstâncias excepcionais e motivadas, porém nítida preferência pela preterição indireta, via terceirização, confere-se procedência aos pleitos exordiais da ação civil pública proposta pelo MPT. Correta, portanto, a decisão recorrida. Agravo de instrumento desprovido (TRT 10ª Região, AIRR - 167700-87.2009.5.06.0003, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, Data de Julgamento: 27/11/2013, 3ª Turma, Data de Publicação: 29/11/2013)".
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. CONCURSO PÚBLICO. EXISTÊNCIA DE CANDIDATO APROVADO. CONTRATAÇÃO DE PESSOAL TERCEIRIZADO. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO: PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.
(STF, ARE 820899 RJ, Rel. Min. Cármen Lúcia, j. 19 ago. 2014).
5. Observância da presunção de inocência na fase de investigação social
A investigação social do candidato deve seguir o princípio da presunção da inocência. Isso significa que as informações colhidas durante a investigação que digam respeito a procedimentos que ainda estejam pendentes de recursos administrativos ou judiciais não podem prejudicar o candidato. A pesquisa do órgão contratante deve ser criteriosa e objetiva. Ou seja, a discricionariedade administrativa não é absoluta, pois se sujeita aos ditames constitucionais.
CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PROCESSO CIVIL. CONCURSO PÚBLICO. ATENDENTE, ESPECIALISTA E TÉCNICO DE REINTEGRAÇÃO SOCIOEDUCATIVO. SINDICÂNCIA DE VIDA PREGRESSA E INVESTIGAÇÃO SOCIAL. PROCESSOS CIVIS E PENAIS. CANDIDATO FIGURA COMO VÍTIMA. EXCLUSÃO. CERTAME. ILEGALIDADE. APLICAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA, DA CULPABILIDADE E DA RAZOABILIDADE.
1. Alegalidade do ato administrativo, incluído a observância aos princípios constitucionais e administrativos, está sujeita a controle judicial, sem que implique em usurpação de competência ou infração ao princípio da separação de poderes.
2. Não se refuta a legalidade da exigência editalícia de que os candidatos a provimento dos cargos públicos de Atendente de Reintegração Socioeducativa de Especialista e Técnico Socieducativo demonstrem procedimento irrepreensível e idoneidade moral inatacável, mormente quando suas atividades estarão diretamente relacionadas à guarda, à vigilância, ao acompanhamento e à segurança de adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas de privação de liberdade e de restrição de direitos.
3. Nada obstante, tal exigência, embora recomendável para o provimento de qualquer cargo público, deve ser pautada pela observância dos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, sob pena de violação do princípio da presunção de inocência, disposto no art. 5º, LVII, da Constituição Federal, o qual estabelece que "ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória".
4. No caso sub judice, constata-se que o autor foi considerado inapto na sindicância de vida pregressa por constarem, em seu nome, alguns registros policiais e duas ações judiciais, sendo que em todas as ocorrências figura como vítima.
5. A mera existência de registros criminais e de ações judiciais não torna o candidato objetivamente desprovido de idoneidade moral para o exercício de cargo público e não pode, por si só, implicar em sua exclusão de concurso público, sob pena de violação aos princípios da presunção de inocência, da culpabilidade e da razoabilidade.
6. Remessa necessária admitida e desprovida.
TJ/DF, 3ª TURMA CÍVEL, Rel. Min. Maria de Lourdes Abreu, j. 4 abr. 2018.
6. Somente a lei pode exigir exame psicotécnico
“Só por lei se pode sujeitar a exame psicotécnico a habilitação de candidato a cargo público.”, eis o teor da Súmula Vinculante n. 44, aprovada em 08/04/2015. Dessa forma, se somente o edital exigir o exame psicotécnico como requisito para habilitação do candidato, tem-se violação ao princípio da legalidade.
Publicado originalmente no blog do Ferreira Nunes Advocacia em 15 abr. 2018.
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Alynne Nayara Ferreira Nunes é advogada fundadora do Ferreira Nunes Advocacia. E-mail para contato: alynne@ferreiranunesadvocacia.com.br. Contate-nos, também, via Whatsapp: 11 9 7049-1696.
Por Alynne Nunes
Fonte: Jus Brasil