Demora de empregado em buscar tratamento médico reduz valor de indenização a viúva e filha

goo.gl/V9nt7P | A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Construtora Norberto Odebrecht S.A. a pagar indenização por danos morais e materiais à viúva e à filha de um encarregado que morreu em decorrência de malária contraída no período em que trabalhou para a empreiteira em Angola. No arbitramento do valor da condenação, a Turma considerou que o descuido do empregado com a doença caracterizou a chamada culpa concorrente da vítima, o que reduz o valor final da indenização.

Segundo relatado pela família na reclamação trabalhista, os sintomas da doença apareceram no Brasil, durante licença remunerada periódica de 15 dias. O encarregado faleceu dias depois, aos 28 anos.

O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região (BA) indeferiu a indenização por entender que o empregado não adotou as medidas informadas pela empresa por ocasião do aparecimento dos primeiros sintomas. O acórdão do TRT registra que, segundo o depoimento de colegas de trabalho, ele já apresentava sintomas em Angola, mas se recusou a procurar apoio médico por ter viagem marcada para o Brasil. Ao chegar ao Rio de Janeiro, permaneceu na cidade com a esposa por três dias e, ao chegar a Salvador (BA), procurou um hospital e foi diagnosticado com virose. Ele ainda viajou para o interior da Bahia, apresentando sintomas graves da doença, ocasião em que a família entrou em contato com o escritório local da empresa. “A essa altura ele já estava em coma cerebral e não havia mais nada a fazer”, disse a testemunha.

TST


No exame de recurso de revista da viúva e da filha do encarregado, o relator, ministro Alexandre Agra Belmonte, destacou que a atividade econômica era exercida em ambiente inóspito e insalubre, com risco acentuado à integridade física do empregado, e que a empresa deveria indenizar a família pela morte do empregado. Ao fixar a indenização, no entanto, ressaltou que era necessário considerar que a morte poderia ter sido evitada caso a doença tivesse sido tratada corretamente, o que dependia de atitude proativa do trabalhador. “Mesmo verificando que apresentava os sintomas da malária há oito dias, ele se recusou a procurar apoio médico porque já tinha viagem marcada para o Brasil e, ao chegar ao país, não procurou auxílio imediato, mas somente após três dias”, assinalou.

O ministro considerou também que a empresa forneceu instruções constantes do programa de conscientização cultural, no qual constavam as doenças da localidade e meios de preveni-las, e dispunha de equipes médicas preparadas para prestar socorro aos empregados que apresentassem sintomas da doença. “Diante desse contexto, não é possível desconsiderar a culpa concorrente do trabalhador por negligência, apesar de estar consciente do risco e de ter sido aconselhado, inclusive por colegas, para que procurasse auxílio médico”, enfatizou.

Por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso e condenou a Odebrecht ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 50 mil e de diferença de indenização do seguro de vida, considerando que o óbito adveio de acidente de trabalho. A título de danos materiais, a reparação foi fixada na modalidade pensão mensal, tendo como parâmetro 2/3 da maior remuneração do empregado multiplicados pelo número de meses da data do óbito até a data em que o empregado completaria 73 anos de idade (expectativa de vida conforme o IBGE). Ao resultado, aplicou-se o redutor de 50% referente à responsabilidade da vítima e de 20% relativo ao pagamento em parcela única.

Processo: RR-172-91.2010.5.05.0012

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. TRABALHO EXERCIDO EM REGIÃO ENDÊMICA DA MALÁRIA. ÓBITO. Diante de possível violação do art. 927, parágrafo único, do CCB, dá-se provimento ao agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista. Agravo de instrumento conhecido e provido. II - RECURSO DE REVISTA. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. TRABALHO EXERCIDO EM REGIÃO ENDÊMICA DA MALÁRIA. ÓBITO. Infere-se do v. acórdão regional que o de cujus trabalhava a serviço da empresa em Angola, região endêmica da malária, tendo contraído a doença, em razão da qual veio a óbito. Em que pese a não haver norma expressa a disciplinar a responsabilidade objetiva do empregador nas relações de trabalho, esta Corte Superior firmou o entendimento de que a regra prevista no artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal deve ser interpretada de forma sistêmica aos demais direitos fundamentais, e, a partir dessa compreensão, admite a adoção da teoria do risco (artigo 927, parágrafo único, do Código Civil), para as chamadas atividades de risco empresarial. Assim, prevalece no Direito do Trabalho a Teoria do Risco Negocial, que enseja a atribuição da responsabilidade objetiva ao empregador, impondo a este a obrigação de indenizar os danos sofridos pelo empregado, independentemente de culpa, quando a atividade da empresa propicie, por si só, riscos à integridade física do empregado. No caso, não há dúvida de que a atividade econômica era exercida em ambiente inóspito e insalubre, oferecendo risco acentuado à integridade física do trabalhador. O quantum da indenização por dano moral deve se adequar às particularidades do caso concreto, de forma moderada e proporcional à extensão da lesão sofrida pelo empregado. No presente caso, é necessário considerar que o óbito era passível de ter sido evitado através do correto tratamento. E este dependia de atitude proativa do de cujus, o qual, mesmo verificando que apresentava os sintomas da malária há oito dias, se recusou a procurar apoio médico, porque já tinha viagem marcada para o Brasil, e mesmo tendo chegado neste país, não procurou auxílio imediato, mas somente após três dias. Ressalto-se que a ré ministrou palestra ao de cujus com instruções constantes do programa de conscientização cultural, no qual constam as doenças da localidade, recebendo o participante repelentes e instruções para o programa de prevenção da malária, fornecendo equipes médicas instruídas ao socorro dos empregados que apresentassem sintomas da doença. Logo, deve ser reconhecida a responsabilidade objetiva da ré e a minorante da culpa concorrente na fixação do valor das indenizações. Recurso de revista conhecido por possível violação do art. 927, parágrafo único, do CCB e provido.

Fonte: TST - Tribunal Superior do Trabalho
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