goo.gl/XFoKQc | Recentemente, li com felicidade uma notícia do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, cujo título era “iniciativa de gabinetes penais leva servidores para conhecer instituições prisionais” (leia aqui).
Acredito que todos que atuam na área criminal deveriam conhecer os estabelecimentos prisionais que podem abrigar os réus dos processos em que atuam, especialmente no Brasil, em que o sistema prisional é mundialmente conhecido por ser um grande violador da lei e de direitos conquistados ao longo de séculos.
Conhecer os estabelecimentos prisionais que custodiam os condenados pelos processos em que atuamos é uma forma de percebermos que tais processos não são apenas um conjunto de folhas de papel ou arquivos digitais. Na verdade, podem decidir a vida (e não raramente a morte) de alguém.
Infelizmente, as letras e os números que integram as peças processuais são banalizados. Quando um Juiz fixa, na dosimetria da pena, uma sanção de 10 anos de reclusão, não imagina como será o dia a dia do condenado durante esses 10 anos.
Entre o “palco” (aquilo que o Juiz vê) e os “bastidores” (aquilo que o apenado realmente sofre) da pena há um abismo. Da mesma forma, quando aumenta a pena em razão de alguma majorante ou agravante, aqueles meses ou anos de acréscimo não são devidamente contextualizados.
Se cada Promotor conhecesse realmente as condições dos presídios brasileiros, passaria a pensar muito antes de denunciar “para tentar provar durante o processo” e teria cuidado quanto à banalização da garantia da ordem pública como fundamento para a prisão preventiva.
O Advogado que conhece os estabelecimentos prisionais para onde podem ser enviados os seus clientes terá, provavelmente, uma atuação muito mais preocupada com o resultado do processo.
Ademais, aqueles que atuam na execução penal (Juízes, Promotores, Defensores, Advogados, servidores, estagiários etc.) perderiam noites de sono (quando ainda têm humanidade) diante do atraso na apreciação de direitos.
Provavelmente, ficariam incomodados com os atrasos para o deferimento de direitos (indulto e livramento condicional, por exemplo) que podem retirar o preso de um sistema perigosíssimo. Obviamente, não pensariam em criar “benefícios”, mas certamente desejariam cumprir a lei em sua integralidade.
Verdadeiramente, poucos crimes no Brasil justificariam o envio de alguém para o falido sistema prisional que mantemos. Mesmo que alguém pratique, por exemplo, 5 furtos, não seria justificável impor-lhe uma pena em estabelecimentos prisionais que resultarão não somente na privação da liberdade, mas também em inúmeras outras consequências, como estupros e perda da integridade física e psíquica.
De qualquer forma, para conhecer um estabelecimento prisional e notar o verdadeiro resultado de uma condenação no processo penal, não basta conhecer uma APAC (Associação para a Proteção e Assistência aos Condenados), que não reflete perfeitamente a realidade problemática do sistema carcerário brasileiro.
Precisamos conhecer os estabelecimentos mais utilizados e que demonstram o caos do sistema, como os presídios, as colônias e as casas de albergado administrados, aparentemente, pelo Estado, ainda que saibamos que há uma privatização implícita em favor das facções.
É imprescindível ver o que as visitas sofrem para entrar em um estabelecimento prisional. Sentir o misto de desespero e alívio quando o visitante encontra o preso.
Da mesma forma, é preciso ver o desespero de um apenado ao receber uma notícia ruim, como o reconhecimento de uma falta grave que jogará seus direitos para muitos meses ou anos adiante ou a negativa de um pedido de progressão ou livramento condicional em razão do exame criminológico.
Deve-se ver o estado de tensão dos presos durante o período de banho de sol, em que alguns presos demonstram uma grande naturalidade (provavelmente pelas idas e vindas no sistema carcerário) enquanto outros presos demonstram um medo do que pode acontecer naquele ambiente em que a classificação (separação dos presos) é praticamente um mito.
Também é importante perceber o medo daqueles que praticaram crimes sem violência ou grave ameaça quando passam por presos condenados por crimes violentos ou ligados às facções.
Enfim, para termos mais preocupação na nossa atuação no processo penal, é imprescindível conhecer os estabelecimentos prisionais para onde podem ir os réus. Contudo, quem ainda mantém um pingo de humanidade poderá perder o sono depois de saber como são os nossos presídios.
Por Evinis Talon - Mestre em Direito. Professor. Advogado.
Fonte: Canal Ciências Criminais
Acredito que todos que atuam na área criminal deveriam conhecer os estabelecimentos prisionais que podem abrigar os réus dos processos em que atuam, especialmente no Brasil, em que o sistema prisional é mundialmente conhecido por ser um grande violador da lei e de direitos conquistados ao longo de séculos.
Conhecer os estabelecimentos prisionais que custodiam os condenados pelos processos em que atuamos é uma forma de percebermos que tais processos não são apenas um conjunto de folhas de papel ou arquivos digitais. Na verdade, podem decidir a vida (e não raramente a morte) de alguém.
Infelizmente, as letras e os números que integram as peças processuais são banalizados. Quando um Juiz fixa, na dosimetria da pena, uma sanção de 10 anos de reclusão, não imagina como será o dia a dia do condenado durante esses 10 anos.
Entre o “palco” (aquilo que o Juiz vê) e os “bastidores” (aquilo que o apenado realmente sofre) da pena há um abismo. Da mesma forma, quando aumenta a pena em razão de alguma majorante ou agravante, aqueles meses ou anos de acréscimo não são devidamente contextualizados.
Se cada Promotor conhecesse realmente as condições dos presídios brasileiros, passaria a pensar muito antes de denunciar “para tentar provar durante o processo” e teria cuidado quanto à banalização da garantia da ordem pública como fundamento para a prisão preventiva.
O Advogado que conhece os estabelecimentos prisionais para onde podem ser enviados os seus clientes terá, provavelmente, uma atuação muito mais preocupada com o resultado do processo.
Ademais, aqueles que atuam na execução penal (Juízes, Promotores, Defensores, Advogados, servidores, estagiários etc.) perderiam noites de sono (quando ainda têm humanidade) diante do atraso na apreciação de direitos.
Provavelmente, ficariam incomodados com os atrasos para o deferimento de direitos (indulto e livramento condicional, por exemplo) que podem retirar o preso de um sistema perigosíssimo. Obviamente, não pensariam em criar “benefícios”, mas certamente desejariam cumprir a lei em sua integralidade.
Verdadeiramente, poucos crimes no Brasil justificariam o envio de alguém para o falido sistema prisional que mantemos. Mesmo que alguém pratique, por exemplo, 5 furtos, não seria justificável impor-lhe uma pena em estabelecimentos prisionais que resultarão não somente na privação da liberdade, mas também em inúmeras outras consequências, como estupros e perda da integridade física e psíquica.
De qualquer forma, para conhecer um estabelecimento prisional e notar o verdadeiro resultado de uma condenação no processo penal, não basta conhecer uma APAC (Associação para a Proteção e Assistência aos Condenados), que não reflete perfeitamente a realidade problemática do sistema carcerário brasileiro.
Precisamos conhecer os estabelecimentos mais utilizados e que demonstram o caos do sistema, como os presídios, as colônias e as casas de albergado administrados, aparentemente, pelo Estado, ainda que saibamos que há uma privatização implícita em favor das facções.
É imprescindível ver o que as visitas sofrem para entrar em um estabelecimento prisional. Sentir o misto de desespero e alívio quando o visitante encontra o preso.
Da mesma forma, é preciso ver o desespero de um apenado ao receber uma notícia ruim, como o reconhecimento de uma falta grave que jogará seus direitos para muitos meses ou anos adiante ou a negativa de um pedido de progressão ou livramento condicional em razão do exame criminológico.
Deve-se ver o estado de tensão dos presos durante o período de banho de sol, em que alguns presos demonstram uma grande naturalidade (provavelmente pelas idas e vindas no sistema carcerário) enquanto outros presos demonstram um medo do que pode acontecer naquele ambiente em que a classificação (separação dos presos) é praticamente um mito.
Também é importante perceber o medo daqueles que praticaram crimes sem violência ou grave ameaça quando passam por presos condenados por crimes violentos ou ligados às facções.
Enfim, para termos mais preocupação na nossa atuação no processo penal, é imprescindível conhecer os estabelecimentos prisionais para onde podem ir os réus. Contudo, quem ainda mantém um pingo de humanidade poderá perder o sono depois de saber como são os nossos presídios.
Por Evinis Talon - Mestre em Direito. Professor. Advogado.
Fonte: Canal Ciências Criminais