Pode haver penhora do único bem imóvel de pessoa solteira? Por Gilmar Fonsêca

goo.gl/Gok6N5 | Em 1990 entrou em vigor a lei nº 8.009, garantindo a impenhorabilidade do imóvel destinado ao bem de família. No entanto, não houve menção quanto ao bem da pessoa solteira, gerando dúvidas com relação aos casos de dívidas. Nesse sentido, o artigo 1.712 do Código Civil preceitua que:

O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicilio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.

Dessa forma, o ordenamento jurídico brasileiro classifica o direito à moradia como um direito fundamental, uma vez que a sua positivação está presente na Constituição Federal, obrigando o Estado a gerar uma proteção através de leis e/ou de políticas públicas.

Em casos de dívidas, portanto, a execução só poderá ser cobrada contra o devedor, não podendo ser transmitida aos demais membros de sua família. Tal dívida, no entanto, pode recair sobre seu patrimônio, excluindo, é claro, os bens de família.

Assim, a lei 8.009/90 preza por uma moradia digna para sobrevivência, incluindo, também, a execução da pessoa solteira, ainda que more sozinho e não exista prole.

No entanto, devedores solteiros, bem como viúvos ou divorciados, ainda perdiam seus bens por causa de penhora. Por isso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) editou a Súmula 364, que dispõe:

O conceito de impenhorabilidade de bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas e viúvas.

Os tribunais, então, passaram a entender da mesma forma, como mostra a jurisprudência abaixo:

TRT-23 – AGRAVO DE PETICAO AP 228200400423001 MT 00228.2004.004.23.00-1 (TRT-23). Ementa: BEM DE FAMÍLIA. DEVEDOR SOLTEIRO. A Lei n. 8009 de 29.03.90 não está a proteger somente a entidade familiar. Segundo uma interpretação teleológica, tem-se a revelação de que o fim social buscado por tal lei é o direito fundamental à moradia, quer seja este direito das pessoas que se agrupam pelo casamento, pela união estável etc, ou quer seja este direito do viúvo, do solteiro etc. (...) A interpretação teleológica do Art. da Lei 8.009/90 revela que a norma não se limita ao resguardo da família. Seu escopo definitivo é a proteção de um direito fundamental da pessoa humana: o direito à moradia. Se assim ocorre, não faz sentido proteger quem vive em grupo e abandonar o indivíduo que sofre o mais doloroso dos sentimentos: a solidão. É impenhorável, por efeito do preceito contido no Art. da Lei 8.009/90, o imóvel em que reside, sozinho, o devedor celibatário. (ERESP 182.223/SP, Relator para acórdão Min. HUMBERTO GOMES DE BARROS, Corte Especial, DJ 07.04.2003).

Vale ressaltar que o imóvel da família só pode ser confiscado em casos específicos determinados por lei, como, por exemplo, pensão alimentícia, dívida com trabalhador doméstico ou débitos do próprio imóvel (financiamento, condomínios, hipotecas, entre outras situações).

Portanto, a lei 8.009/90 precisa ser vista através da ótica social, valorizando a moradia digna, independente do estado civil da pessoa em que nela resida, uma vez que todas as pessoas são humanas e, assim, devem ser tratadas.

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Gilmar Fonsêca Júnior
Pretende ser Defensor Público Estadual.
Estudante, estagiário e aprovado no XXIV Exame da OAB.
Fonte: Jus Brasil
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