goo.gl/GyBnpc | A primeira pergunta é: relacionamentos amorosos são necessários? Muitos têm a resposta fixa que sim, alguns, após inúmeras frustrações dizem que não, e poucos vêm relacionamento como um bônus ao atingir a maturidade.
As frustrações quando superadas e entendidas são boas, pois nos reaproximam de nós mesmos e concedem oportunidades para o autoconhecimento, que possivelmente foi relegado e por isso a escolha do parceiro não foi adequada.
Já os que vivem incansavelmente em busca de um companheiro, não conhecem a beleza da própria companhia e estão emocionalmente vulneráveis. A caçada incansável por uma companhia é a procura por não ficar sozinho consigo mesmo, pois a própria companhia é desagradável ou tem pouco ou quase nada a oferecer. Pessoas que não toleram a solidão acreditam que o outro é responsável pela sua felicidade. Palavras duras? Talvez, mas duro mesmo é o que as pessoas aceitam ou impõem aos outros quando são pedintes afetivos, e isso inclui inúmeras violências - psicológicas, físicas, morais, sexuais e patrimoniais. Sempre escrevo sobre o viés jurídico das relações afetivas e suas violências, mas o melhor é não precisar do Direito Penal para puni-las.
Um dos principais equívocos humanos é acreditar que o outro realizará os nossos sonhos, e depositar a própria felicidade nisso. Mas relacionamento não é sobre necessidade, sobre receber, ser complementado ou completar alguém, relacionamento é doação, é presentear o outro com a sua presença, mas só podemos nos doar quando estamos completos, e só doamos aquilo que temos.
Quando se busca a felicidade - que é algo interno e pessoal, na companhia de outra pessoa - você desvaloriza o que você é, provavelmente porque não se conhece e desacredite de si. A dependência emocional te faz exigir do outro aquilo que você não faz e aquilo que você não é, assim como o aceite de tudo e qualquer tratamento, sentimento e pessoas.
Na busca incansável por companhia, você esquece que a principal, única e absoluta companhia é a sua, e somente ela resolverá os seus problemas e conflitos. Na busca desordenada pelo outro, esquece-se que relacionamento é negociação, mas principalmente, que existem “coisas” que são inegociáveis, entre elas a sua paz e a sua moral. Pela necessidade de parceiro negocia-se tudo em troca de afeto, mas afeto não se pede.
O desespero para ter companhia ou permanecer ao lado de outra pessoa é imenso, e nessa imensidão a pessoa pratica a autocastração, se anula, abre mão da individualidade, abandona os prazeres, e vive em prol do outro. Transforma-se o relacionamento numa fusão, sem saber quem é quem e porque é; perde-se as próprias características, anula-se, e torna-se uma sombra do outro. Posteriormente atinge o estágio da cobrança, e exige que o outro também faça o mesmo e viva em prol da relação, afinal, a pessoa fez o sacrifício – tolo - e que ninguém pediu, do abandono de si mesmo, mas que já começou antes mesmo do relacionamento.
Após a anulação de si, o indivíduo que já começou o relacionamento buscando completar as próprias faltas através do outro, encontra-se ainda mais vulnerável e dependente. Pela ausência de amor próprio e pelo tempo livre, afinal, abandonou a própria vida então o tempo ocioso se estendeu, passa os dias e horas na expectativa de atenção, e quer a todo custo ser importante e presente, assim como o seu “objeto de amor” é na sua vida.
O lazer do outro, que até então não incomodava, passa a ser motivo de vigília constante, assim como os horários, companhias e quando não recebe convite para participar de alguma programação isso vira brigas, ciúmes e acusações de traição e todo tipo de situação que uma mente criativa e desocupada é capaz de criar.
As acusações constantes e cobranças por afeto desgastam o relacionamento e o outro vai embora (e a pessoa fica num vazio ainda maior, pois se fundiu a outrem); o outro não entende as agressões verbais e por vezes físicas e permanece sufocado, prestes a explodir ou o outro se aproveita dessa situação e retribui as acusações e violências – as vezes inconscientemente, pois muitos não compreendem a situação que vivem e vêm as agressões como defesa, e isso vira um ciclo, o pedinte afetivo sufoca e violenta o companheiro e o companheiro as vezes se defende retribuindo as agressões.
A verdade é que os nossos relacionamentos são iguais as relações que temos conosco, você se anula, não se respeita, não confia em você e não gosta da própria companhia, logo é exatamente isso que fará e receberá. Você é incompleto, logo encontrará alguém que também é; você está no relacionamento para saciar as suas necessidades e vampirizar o outro, então é isso que receberá. A solidão e ausência de autoconhecimento dá asas aos abusos e violências.
Hostilizar o outro também é comum, como forma de dominação e demonstração de poder, quando existe insegurança. A hostilização é uma das representações dos maus tratos, que é uma violência psicológica, naturalizada, sutil, aceita, difícil de provar, entretanto de danos superiores a violência física, pela capacidade lentamente destrutiva.
A violência psicológica diminui a autoestima, aumenta a dependência, promove a desvalorização pessoal, e o indivíduo que já entrou no relacionamento incompleto, passa a crer que é incapaz de viver sozinho e agride o outro para tentar dominá-lo e enfraquece-lo a ponto de se sentir impotente e que não merece outra pessoa. Consequentemente, meio a tanta agressão, o companheiro já com a autoestima baixa não se sente desejado, e aceita as relações sexuais por medo da perda; tem medo de tomar decisões e desagradar e se omite, pouco a pouco também se castra, mas a agressora continua a responsabilizar o outro pelas frustrações e pratica terrorismos constantes, como reflexo da sua insegurança, com cobranças desmedidas até que o outro acredite nisso e peça desculpas, se humilhe, porém nunca ficará satisfeita, pois ninguém soluciona o vazio alheio.
Pode ocorrer o contrário também, quando a pedinte afetiva se encontra em tamanha vulnerabilidade que aceita toda e qualquer agressão, sem retribuir, simplesmente por se achar incapaz.
A violência começa no namoro, porém é ignorada, aceita e gradativamente aumenta. O indivíduo, dependente afetivo, que se torna agressor, continua violento, pois o outro, também carente e incapaz de viver sozinho aceita; ou o dependente afetivo se torna presa fácil de quem detém o “poder” da relação, mas que também é inseguro, pois necessita de violência para se auto afirmar.
“Mas ela mudou de comportamento de uma hora para a outra”. NÃO!
“Mas ele nunca fez nada nem próximo disso”. NÃO!
“Mas ela estava na TPM”. NÃO!
“Mas ele bebeu um pouco”. NÃO!
“Mas foi só uma vez”. NÃO!
Não, não e não! A agressão não começa do nada, ela é paulatina. Não existe justificativa para tal, nem causas hormonais, que podem ser controladas, nem o uso de álcool e drogas, que apenas “libertam” o que a pessoa omite, e tampouco a agressão – independente da espécie – ocorrerá uma única vez. PARE DE SE ENGANAR E DE ENGANAR O OUTRO!
Mas as violências são relevadas, afinal o status quo de estar num relacionamento é melhor que estar só, segundo o pensamento da maioria.
A principal agressão ocorre quando se busca um relacionamento ausente de conhecimento, sem saber o que pode ou não oferecer, o que agrada ou desagrada e enxerga o outro como válvula de escape para os problemas não resolvidos. Isso é uma receita completa para a frustração, aumento de traumas, sofrimento e violências, sofridas ou perpetradas.
Erroneamente acredita-se que violência afetiva se restringe a violência física, todavia ela também é moral, patrimonial, sexual e psicológica. Culturalmente acredita-se ainda, que apenas a mulher é sujeito passivo da violência conjugal, entretanto, violência não tem gênero e tanto homens quanto mulheres podem e são vítimas – mas ao homem é negado o direito de fala, e proteção legal.
A violência psicológica, praticada massivamente pelo sexo feminino e naturalmente aceito na sociedade brasileira, envolve xingamento, agressões verbais, ameaças de infidelidade, humilhação, acusações, constrangimentos em público, desqualificação, privação de contato com a família e amigos, abusos, autoritarismos, chantagens emocionais, vigilâncias e perseguições (pessoalmente ou em redes sociais) e qualquer outra conduta danosa a autoestima ou que controle ações, para causar ciúmes e insegurança. A violência psicológica está contida nas demais formas de violência, e esta principalmente reduz a autoconfiança masculina.
Violência física é a agressão que ofende a saúde ou integridade física, como tapas, pontapés, socos, empurrões, chutes, queimaduras, agressões com instrumentos variados (entre eles, faca, ferro de passar roupa e vassoura), estigmas ungueais (ou arranhões de amor), arremesso de objetos (o preferido das mulheres).
Violência moral, calúnia (art. 138, Código Penal), injúria (art. 140, Código Penal) e difamação (art. 139, Código Penal), com o objetivo de destruir a reputação do outro.
Violência sexual, culturalmente definida como crime impossível a ser praticado por mulheres, essa ocorre com frequência, quando o homem é submetido contra a sua real vontade a tocar a companheira ou ter relações sexuais, tendo sua masculinidade a prova ou o descumprimento do dever conjugal, assim como parceiras que insistem que o companheiro use remédio para aumentar a duração das ereções, sem se importar com a saúde deste; bem como homens que insistem em relações sexuais com as esposas contra a sua vontade. Faz-se mister ressaltar, que a insistência por não usar preservativo, assim como práticas sexuais que desagradam o outro, também é violência sexual.
Violência patrimonial: quebra ou destruição de objetos, usualmente praticado pelas mulheres em estado de descontrole e fúria, celular, som, televisão, porta de carro, bem como a retenção de bens e gastos financeiros que seriam destinados ao pagamento das despesas do casal, utilizado para o deleite da mulher, como forma de punição ou exigência de algo almejado, material ou afetivo; e homens que impedem a parceira de trabalhar e ter independência financeira.
Permanecer na constante violência torna o indivíduo dependente, acostumado as agressões, naturalizando-as e retira-lhe a sensibilidade para o inaceitável e impraticável.
Muitos que vivem relacionamentos abusivos se perguntam porque permanecem nessa situação, e não conseguem um fim, ou sentem-se mal, mas ao mesmo tempo têm a sensação que já se adaptaram ás violências. Para esse tipo de pessoa existe uma metáfora conhecida como “Síndrome do Sapo Fervido”, que diz o seguinte:
“O Sapo quando é colocado numa panela com água quente não suporta aquela temperatura, salta imediatamente conseguindo sobreviver. Entretanto, quando o mesmo sapo é colocado numa panela com água fria e, gradualmente, essa água vai aquecendo, ele não percebe o calor. Fica parado e quieto. Morre, depois de algum tempo, inchado e feliz”.
Assim como o sapo fervido são as pessoas, que se acomodam com a situação destrutiva, não querem sair dela, acreditam em milagres ou creem que não há outra solução. O sapo fervido pode ter as suas necessidades primárias atendidas, mas em breve morrerá. O sapo suporta a temperatura da água durante muito tempo, até o seu limite, assim como as pessoas que se submetem a relacionamentos conturbados até serem completamente vampirizadas e ficarem sem nenhuma energia, correndo perigo constante, mas não viu necessidade de pular da panela, cuja água aquece cada vez mais e queima pouco a pouco, até que não exista energia e força para saltar.
Mas o que mata o sapo não é água fervendo, é a preguiça, medo ou comodismo em não pular, e a água agradável, naquele momento. Talvez seja hora de saltar da panela, enquanto é tempo; talvez você não deva entrar nela. A exploração psicológica, financeira, física e sexual não tem limites e é você que deve colocar um basta ou nem mesmo começar uma relação se está suscetível afetivamente e incompleto. As vezes a solução não é aguentar o desconforto e esperar, mas saltar, saltar enquanto há forças e vida dentro de você.
Assim como a água aumenta a sua temperatura, os ponteiros do relógio passam, e a vida é demasiadamente breve para aceitar o sofrimento, a violência e a própria incompletude. Você só é infeliz se quiser, a felicidade está nas suas mãos, não na presença do outro. Não é o outro que tem que mudar, é você que tem que ter a coragem de saltar; saltar dessa situação, saltar da inercia, saltar do comodismo, saltar das vulgaridades e saltar com todas as suas forças o mais alto que puder, para se conhecer e se completar com as próprias belezas que só você carrega e pode adubar.
Voltando a pergunta inicial: relacionamentos amorosos são necessários? Responderia que não e que são arriscados e danosos aos que não estão prontos para lidar com o mundo do outro, pois não sabem nem mesmo lidar consigo. Companhia é divertido, poder compartilhar momentos, mas relacionamento é para ser leve, e essa leveza só atingimos com maturidade – maturidade que não depende de idade, mas de autoconhecimento.
Relacionamentos são bônus que as vezes temos, as vezes não. Pessoas são coadjuvantes em nossa vida, cujo ator principal é você. Se você for completo, terá algo a oferecer, terá o que doar, e consequentemente será uma pessoa agradável, sem cobranças e pesos, e atrairá outra pessoa assim, disposta a doação e não a exigências, e que poderá dividir alguma época com você, mas quando resolver sair da sua vida, não se sentirá vazio, pois você permaneceu com sua individualidade, mundo, personalidade e diferente da maioria, não se castrou e fundiu ao outro.
O autoconhecimento te mostrará que não deve ser aberto e aceitar qualquer ideia e pessoa, pois isso leva a autodestruição. Você buscará o semelhante, afinal as divergências que eram divertidas no início, com o passar do tempo viram fardos. Você mesmo fará inteligentemente uma lista com as qualidades que gosta e as que repele numa pessoa. Você analisará os efeitos colaterais antes de tomar o remédio, ao invés de ingerir pela simples propaganda. Você terá a paciência de distinguir o que é publicidade do que é interno. Você terá a racionalidade de compreender não o que a pessoa diz de si mesma, mas o que ela combate. Você se reconciliará consigo mesmo ou se encontrará pela primeira vez. Você, quando estiver completo não aceitará menos que o merecido, pois terá paz e não irá se submeter a situações e pessoas que te retire algo tão precioso. Você não ficará numa disputa de poder e autoritarismos, mas delimitará o seu território, pautado no conhecimento de si e sua individualidade, com admiração, respeito e dignidade. Relacionamento demanda racionalidade, assim você não será vítima nem infratora, mas estará pronta para construir lentamente um relacionamento.
Se dê o presente de se conhecer, não peça nada, não cobre nada, doe sorriso, doe atenção. O sentido da vida não é cobrar, quando você se ama não precisa de nada, você está completo e assim pode acrescentar na vida do outro. Amor é ser um presente, e não alguém que usurpe a paz alheia. Amor é serenidade, afeto, ausência de medo, completude, sensatez e respeito, a si e ao mundo do outro, é uma construção gradativa.
Quando você se conhece identifica o que faz mal e as violências precocemente, se afasta e salva a sua vida. Não seja o sapo que espera a água ferver. Tempo é vida e relacionamento demanda autoconhecimento!
Algum dia, em qualquer parte, em qualquer lugar, indefectivelmente, encontrar-te-ás a ti mesmo e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga das tuas horas. – Pablo Neruda
Publicado em: http://www.pensarbemviverbem.com.br/o-desespero-em-busca-de-um-relacionamentoea-sindrome-do-sapo-fervido/
Sara Próton
Graduada em Direito pelo Centro Universitário Newton Paiva; Pós-Graduanda em Ciências Criminais, PUC Minas e Direito da Saúde, Faculdade Arnaldo https://www.instagram.com/saraproton/
Fonte: Jus Brasil
As frustrações quando superadas e entendidas são boas, pois nos reaproximam de nós mesmos e concedem oportunidades para o autoconhecimento, que possivelmente foi relegado e por isso a escolha do parceiro não foi adequada.
Já os que vivem incansavelmente em busca de um companheiro, não conhecem a beleza da própria companhia e estão emocionalmente vulneráveis. A caçada incansável por uma companhia é a procura por não ficar sozinho consigo mesmo, pois a própria companhia é desagradável ou tem pouco ou quase nada a oferecer. Pessoas que não toleram a solidão acreditam que o outro é responsável pela sua felicidade. Palavras duras? Talvez, mas duro mesmo é o que as pessoas aceitam ou impõem aos outros quando são pedintes afetivos, e isso inclui inúmeras violências - psicológicas, físicas, morais, sexuais e patrimoniais. Sempre escrevo sobre o viés jurídico das relações afetivas e suas violências, mas o melhor é não precisar do Direito Penal para puni-las.
1. PESSOAS NÃO REALIZAM OS NOSSOS SONHOS
Um dos principais equívocos humanos é acreditar que o outro realizará os nossos sonhos, e depositar a própria felicidade nisso. Mas relacionamento não é sobre necessidade, sobre receber, ser complementado ou completar alguém, relacionamento é doação, é presentear o outro com a sua presença, mas só podemos nos doar quando estamos completos, e só doamos aquilo que temos.
2. PEDINTE AFETIVO
Quando se busca a felicidade - que é algo interno e pessoal, na companhia de outra pessoa - você desvaloriza o que você é, provavelmente porque não se conhece e desacredite de si. A dependência emocional te faz exigir do outro aquilo que você não faz e aquilo que você não é, assim como o aceite de tudo e qualquer tratamento, sentimento e pessoas.
Na busca incansável por companhia, você esquece que a principal, única e absoluta companhia é a sua, e somente ela resolverá os seus problemas e conflitos. Na busca desordenada pelo outro, esquece-se que relacionamento é negociação, mas principalmente, que existem “coisas” que são inegociáveis, entre elas a sua paz e a sua moral. Pela necessidade de parceiro negocia-se tudo em troca de afeto, mas afeto não se pede.
3. CASTRAÇÃO
O desespero para ter companhia ou permanecer ao lado de outra pessoa é imenso, e nessa imensidão a pessoa pratica a autocastração, se anula, abre mão da individualidade, abandona os prazeres, e vive em prol do outro. Transforma-se o relacionamento numa fusão, sem saber quem é quem e porque é; perde-se as próprias características, anula-se, e torna-se uma sombra do outro. Posteriormente atinge o estágio da cobrança, e exige que o outro também faça o mesmo e viva em prol da relação, afinal, a pessoa fez o sacrifício – tolo - e que ninguém pediu, do abandono de si mesmo, mas que já começou antes mesmo do relacionamento.
4. POSSE, INVASÃO E VIOLÊNCIAS
Após a anulação de si, o indivíduo que já começou o relacionamento buscando completar as próprias faltas através do outro, encontra-se ainda mais vulnerável e dependente. Pela ausência de amor próprio e pelo tempo livre, afinal, abandonou a própria vida então o tempo ocioso se estendeu, passa os dias e horas na expectativa de atenção, e quer a todo custo ser importante e presente, assim como o seu “objeto de amor” é na sua vida.
O lazer do outro, que até então não incomodava, passa a ser motivo de vigília constante, assim como os horários, companhias e quando não recebe convite para participar de alguma programação isso vira brigas, ciúmes e acusações de traição e todo tipo de situação que uma mente criativa e desocupada é capaz de criar.
As acusações constantes e cobranças por afeto desgastam o relacionamento e o outro vai embora (e a pessoa fica num vazio ainda maior, pois se fundiu a outrem); o outro não entende as agressões verbais e por vezes físicas e permanece sufocado, prestes a explodir ou o outro se aproveita dessa situação e retribui as acusações e violências – as vezes inconscientemente, pois muitos não compreendem a situação que vivem e vêm as agressões como defesa, e isso vira um ciclo, o pedinte afetivo sufoca e violenta o companheiro e o companheiro as vezes se defende retribuindo as agressões.
A verdade é que os nossos relacionamentos são iguais as relações que temos conosco, você se anula, não se respeita, não confia em você e não gosta da própria companhia, logo é exatamente isso que fará e receberá. Você é incompleto, logo encontrará alguém que também é; você está no relacionamento para saciar as suas necessidades e vampirizar o outro, então é isso que receberá. A solidão e ausência de autoconhecimento dá asas aos abusos e violências.
5. HOSTILIZAÇÃO E DISPUTA DE PODER
Hostilizar o outro também é comum, como forma de dominação e demonstração de poder, quando existe insegurança. A hostilização é uma das representações dos maus tratos, que é uma violência psicológica, naturalizada, sutil, aceita, difícil de provar, entretanto de danos superiores a violência física, pela capacidade lentamente destrutiva.
A violência psicológica diminui a autoestima, aumenta a dependência, promove a desvalorização pessoal, e o indivíduo que já entrou no relacionamento incompleto, passa a crer que é incapaz de viver sozinho e agride o outro para tentar dominá-lo e enfraquece-lo a ponto de se sentir impotente e que não merece outra pessoa. Consequentemente, meio a tanta agressão, o companheiro já com a autoestima baixa não se sente desejado, e aceita as relações sexuais por medo da perda; tem medo de tomar decisões e desagradar e se omite, pouco a pouco também se castra, mas a agressora continua a responsabilizar o outro pelas frustrações e pratica terrorismos constantes, como reflexo da sua insegurança, com cobranças desmedidas até que o outro acredite nisso e peça desculpas, se humilhe, porém nunca ficará satisfeita, pois ninguém soluciona o vazio alheio.
Pode ocorrer o contrário também, quando a pedinte afetiva se encontra em tamanha vulnerabilidade que aceita toda e qualquer agressão, sem retribuir, simplesmente por se achar incapaz.
6. INÍCIO DAS AGRESSÕES
A violência começa no namoro, porém é ignorada, aceita e gradativamente aumenta. O indivíduo, dependente afetivo, que se torna agressor, continua violento, pois o outro, também carente e incapaz de viver sozinho aceita; ou o dependente afetivo se torna presa fácil de quem detém o “poder” da relação, mas que também é inseguro, pois necessita de violência para se auto afirmar.
“Mas ela mudou de comportamento de uma hora para a outra”. NÃO!
“Mas ele nunca fez nada nem próximo disso”. NÃO!
“Mas ela estava na TPM”. NÃO!
“Mas ele bebeu um pouco”. NÃO!
“Mas foi só uma vez”. NÃO!
Não, não e não! A agressão não começa do nada, ela é paulatina. Não existe justificativa para tal, nem causas hormonais, que podem ser controladas, nem o uso de álcool e drogas, que apenas “libertam” o que a pessoa omite, e tampouco a agressão – independente da espécie – ocorrerá uma única vez. PARE DE SE ENGANAR E DE ENGANAR O OUTRO!
Mas as violências são relevadas, afinal o status quo de estar num relacionamento é melhor que estar só, segundo o pensamento da maioria.
A principal agressão ocorre quando se busca um relacionamento ausente de conhecimento, sem saber o que pode ou não oferecer, o que agrada ou desagrada e enxerga o outro como válvula de escape para os problemas não resolvidos. Isso é uma receita completa para a frustração, aumento de traumas, sofrimento e violências, sofridas ou perpetradas.
7. TIPOS DE VIOLÊNCIA
Erroneamente acredita-se que violência afetiva se restringe a violência física, todavia ela também é moral, patrimonial, sexual e psicológica. Culturalmente acredita-se ainda, que apenas a mulher é sujeito passivo da violência conjugal, entretanto, violência não tem gênero e tanto homens quanto mulheres podem e são vítimas – mas ao homem é negado o direito de fala, e proteção legal.
A violência psicológica, praticada massivamente pelo sexo feminino e naturalmente aceito na sociedade brasileira, envolve xingamento, agressões verbais, ameaças de infidelidade, humilhação, acusações, constrangimentos em público, desqualificação, privação de contato com a família e amigos, abusos, autoritarismos, chantagens emocionais, vigilâncias e perseguições (pessoalmente ou em redes sociais) e qualquer outra conduta danosa a autoestima ou que controle ações, para causar ciúmes e insegurança. A violência psicológica está contida nas demais formas de violência, e esta principalmente reduz a autoconfiança masculina.
Violência física é a agressão que ofende a saúde ou integridade física, como tapas, pontapés, socos, empurrões, chutes, queimaduras, agressões com instrumentos variados (entre eles, faca, ferro de passar roupa e vassoura), estigmas ungueais (ou arranhões de amor), arremesso de objetos (o preferido das mulheres).
Violência moral, calúnia (art. 138, Código Penal), injúria (art. 140, Código Penal) e difamação (art. 139, Código Penal), com o objetivo de destruir a reputação do outro.
Violência sexual, culturalmente definida como crime impossível a ser praticado por mulheres, essa ocorre com frequência, quando o homem é submetido contra a sua real vontade a tocar a companheira ou ter relações sexuais, tendo sua masculinidade a prova ou o descumprimento do dever conjugal, assim como parceiras que insistem que o companheiro use remédio para aumentar a duração das ereções, sem se importar com a saúde deste; bem como homens que insistem em relações sexuais com as esposas contra a sua vontade. Faz-se mister ressaltar, que a insistência por não usar preservativo, assim como práticas sexuais que desagradam o outro, também é violência sexual.
Violência patrimonial: quebra ou destruição de objetos, usualmente praticado pelas mulheres em estado de descontrole e fúria, celular, som, televisão, porta de carro, bem como a retenção de bens e gastos financeiros que seriam destinados ao pagamento das despesas do casal, utilizado para o deleite da mulher, como forma de punição ou exigência de algo almejado, material ou afetivo; e homens que impedem a parceira de trabalhar e ter independência financeira.
Permanecer na constante violência torna o indivíduo dependente, acostumado as agressões, naturalizando-as e retira-lhe a sensibilidade para o inaceitável e impraticável.
8. SÍNDROME DO SAPO FERVIDO
Muitos que vivem relacionamentos abusivos se perguntam porque permanecem nessa situação, e não conseguem um fim, ou sentem-se mal, mas ao mesmo tempo têm a sensação que já se adaptaram ás violências. Para esse tipo de pessoa existe uma metáfora conhecida como “Síndrome do Sapo Fervido”, que diz o seguinte:
“O Sapo quando é colocado numa panela com água quente não suporta aquela temperatura, salta imediatamente conseguindo sobreviver. Entretanto, quando o mesmo sapo é colocado numa panela com água fria e, gradualmente, essa água vai aquecendo, ele não percebe o calor. Fica parado e quieto. Morre, depois de algum tempo, inchado e feliz”.
Assim como o sapo fervido são as pessoas, que se acomodam com a situação destrutiva, não querem sair dela, acreditam em milagres ou creem que não há outra solução. O sapo fervido pode ter as suas necessidades primárias atendidas, mas em breve morrerá. O sapo suporta a temperatura da água durante muito tempo, até o seu limite, assim como as pessoas que se submetem a relacionamentos conturbados até serem completamente vampirizadas e ficarem sem nenhuma energia, correndo perigo constante, mas não viu necessidade de pular da panela, cuja água aquece cada vez mais e queima pouco a pouco, até que não exista energia e força para saltar.
Mas o que mata o sapo não é água fervendo, é a preguiça, medo ou comodismo em não pular, e a água agradável, naquele momento. Talvez seja hora de saltar da panela, enquanto é tempo; talvez você não deva entrar nela. A exploração psicológica, financeira, física e sexual não tem limites e é você que deve colocar um basta ou nem mesmo começar uma relação se está suscetível afetivamente e incompleto. As vezes a solução não é aguentar o desconforto e esperar, mas saltar, saltar enquanto há forças e vida dentro de você.
Assim como a água aumenta a sua temperatura, os ponteiros do relógio passam, e a vida é demasiadamente breve para aceitar o sofrimento, a violência e a própria incompletude. Você só é infeliz se quiser, a felicidade está nas suas mãos, não na presença do outro. Não é o outro que tem que mudar, é você que tem que ter a coragem de saltar; saltar dessa situação, saltar da inercia, saltar do comodismo, saltar das vulgaridades e saltar com todas as suas forças o mais alto que puder, para se conhecer e se completar com as próprias belezas que só você carrega e pode adubar.
9. OBSERVAÇÃO E AUTOCONHECIMENTO
Voltando a pergunta inicial: relacionamentos amorosos são necessários? Responderia que não e que são arriscados e danosos aos que não estão prontos para lidar com o mundo do outro, pois não sabem nem mesmo lidar consigo. Companhia é divertido, poder compartilhar momentos, mas relacionamento é para ser leve, e essa leveza só atingimos com maturidade – maturidade que não depende de idade, mas de autoconhecimento.
Relacionamentos são bônus que as vezes temos, as vezes não. Pessoas são coadjuvantes em nossa vida, cujo ator principal é você. Se você for completo, terá algo a oferecer, terá o que doar, e consequentemente será uma pessoa agradável, sem cobranças e pesos, e atrairá outra pessoa assim, disposta a doação e não a exigências, e que poderá dividir alguma época com você, mas quando resolver sair da sua vida, não se sentirá vazio, pois você permaneceu com sua individualidade, mundo, personalidade e diferente da maioria, não se castrou e fundiu ao outro.
O autoconhecimento te mostrará que não deve ser aberto e aceitar qualquer ideia e pessoa, pois isso leva a autodestruição. Você buscará o semelhante, afinal as divergências que eram divertidas no início, com o passar do tempo viram fardos. Você mesmo fará inteligentemente uma lista com as qualidades que gosta e as que repele numa pessoa. Você analisará os efeitos colaterais antes de tomar o remédio, ao invés de ingerir pela simples propaganda. Você terá a paciência de distinguir o que é publicidade do que é interno. Você terá a racionalidade de compreender não o que a pessoa diz de si mesma, mas o que ela combate. Você se reconciliará consigo mesmo ou se encontrará pela primeira vez. Você, quando estiver completo não aceitará menos que o merecido, pois terá paz e não irá se submeter a situações e pessoas que te retire algo tão precioso. Você não ficará numa disputa de poder e autoritarismos, mas delimitará o seu território, pautado no conhecimento de si e sua individualidade, com admiração, respeito e dignidade. Relacionamento demanda racionalidade, assim você não será vítima nem infratora, mas estará pronta para construir lentamente um relacionamento.
Se dê o presente de se conhecer, não peça nada, não cobre nada, doe sorriso, doe atenção. O sentido da vida não é cobrar, quando você se ama não precisa de nada, você está completo e assim pode acrescentar na vida do outro. Amor é ser um presente, e não alguém que usurpe a paz alheia. Amor é serenidade, afeto, ausência de medo, completude, sensatez e respeito, a si e ao mundo do outro, é uma construção gradativa.
Quando você se conhece identifica o que faz mal e as violências precocemente, se afasta e salva a sua vida. Não seja o sapo que espera a água ferver. Tempo é vida e relacionamento demanda autoconhecimento!
Algum dia, em qualquer parte, em qualquer lugar, indefectivelmente, encontrar-te-ás a ti mesmo e essa, só essa, pode ser a mais feliz ou a mais amarga das tuas horas. – Pablo Neruda
Publicado em: http://www.pensarbemviverbem.com.br/o-desespero-em-busca-de-um-relacionamentoea-sindrome-do-sapo-fervido/
Sara Próton
Graduada em Direito pelo Centro Universitário Newton Paiva; Pós-Graduanda em Ciências Criminais, PUC Minas e Direito da Saúde, Faculdade Arnaldo https://www.instagram.com/saraproton/
Fonte: Jus Brasil