goo.gl/1behuv | Em declarações recentes, o Presidente da República Jair Bolsonaro manifestou seu desejo em retirar a obrigatoriedade do Exame da Ordem dos Advogados do Brasil. Apoiado por setores da sociedade civil, Bolsonaro acredita que a exigência do Exame retira os profissionais do mercado de trabalho, prejudicando a concorrência.
Em contrapartida há aqueles que recebem com preocupação as expressões do Presidente acerca do Exame de Ordem, pois defendem a prova como item fundamental para qualificar os advogados em todo o território nacional. Com isso, a equipe do Justiça Em Foco aproveitou a efervescência desse tema para conversar com o novo presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB/DF), Délio Lins, para avaliar o impacto dessa medida no setor jurídico, no caso de uma possível extinção no Exame da OAB. Como assumiu a presidência da OAB/DF recentemente, Délio Lins falou também de projetos para a sua gestão à frente da instituição.
Como o senhor avalia o posicionamento do Presidente da República em acabar com o Exame da OAB?
Délio Lins: Qualquer iniciativa contrária ao Exame de ordem é avaliada pela OAB como negativa e perigosa, seja pelo presidente Jair Bolsonaro ou por outra autoridade. Toda a Ordem, incluindo as seccionais, vai ter uma atitude no sentido de coibir qualquer ato nesse sentido. Há muito tempo esse tema é levantado e o Bolsonaro não é o único a falar disso.
Agora, imagine a quantidade de bacharéis que existem sem a inscrição na OAB. Não conheço ninguém que saiba ter esse dado quantificado com exatidão. Já ouvi falar de algo entre 01 a 04 milhões. Ninguém tem essa informação com exatidão. Esse problema foi gerado pelo aumento abrupto e descontrolado das faculdades de Direito. Existe sim um contingente parado, esperando entrar para os quadros da OAB e esse dado não sabemos quantificar. Nesse cenário surge um problema grave que é a proteção da sociedade em todo esse contexto, pois o advogado é o braço da sociedade dentro do Poder Judiciário e dos demais poderes. O fato é: o advogado está ali para representar alguém perante os poderes constituídos.
Imagina um advogado que não tem a qualificação necessária, o tamanho do problema que esse profissional pode criar. Então, temos que ter um controle de qualidade desse sistema e a Ordem tem responsabilidade nisso. Acabar o Exame de Ordem é um absurdo, é uma perda no controle de qualidade e consequentemente, traz graves e grandes problemas para a sociedade.
O senhor acredita que o Exame, da maneira como é aplicado hoje, está bom ou precisa de modificações?
Délio Lins: Precisa e pode ter vários ajustes. Eu já fiz parte da comissão, pois a Ordem indica membros para acompanhar a empresa que aplica o Exame de Ordem nas suas diferentes fases. Já participei umas 04 vezes por indicação do Conselho Federal da OAB. Conseguimos ver como é todo o processo de realização do Exame e no modo geral, muita coisa precisa ser melhorada. Dizem que a prova é difícil, mas eu acho que a prova está mais para fácil do que para difícil. Poderia ter um controle mais rígido na própria qualidade do Exame de Ordem no sentido de tornar a prova mais voltada para a advocacia do que ter matérias e questões genéricas. Poderia haver uma melhor maneira de trabalhar a peça, a quantidade de peças à disposição de quem faz a prova. Vivemos em um mercado de trabalho em constante evolução e não faz mais sentido ficar naquela coisa básica de Direito Civil, Direito do Trabalho ou Direito Criminal. Tem outras áreas que poderiam ser disponibilizadas aos advogados para fazerem as provas. Dá para ser trabalhado o formato do Exame, mas acabar com ele é uma loucura.
Se o Exame é fácil, o problema está no ensino?
Délio Lins: O problema crucial é esse. O alto número de faculdades que existem no Brasil e a quantidade de faculdades que existem de baixa qualidade. Veja, o Brasil tem mais faculdades de Direito do que o resto do mundo. Enquanto no mundo existem cerca de 1.200 faculdades de Direito, no Brasil tem mais de 1.300 faculdades. Nas últimas semanas autorizaram mais umas duzentas instituições a lecionarem o curso de Direito, isso é um absurdo.
A Ordem dos Advogados perdeu o controle e o Ministério da Educação (MEC) não ouve a OAB. Um parecer da OAB hoje não é lido dentro do MEC para aprovar ou fechar um curso de Direito. Se for lido, é totalmente ignorado. No melhor dos mundos o parecer da OAB deveria se tonar vinculativo para conseguir dar uma regulada nessa abertura de curso.
Temos uma proposta de implementar a criação de uma comissão de controle dos cursos de Direito na OAB/DF, formada por vários profissionais do cenário jurídico. Teremos nesse grupo vários representantes das magistraturas Federal e do DF, composta por: membros dos Ministérios Públicos, das Polícias, das advocacias públicas, advogados privados. Juntos, todos os interessados no mundo jurídico, todos os integrantes do Direito representando diversos setores, possam atuar junto aos órgãos de controle com medidas que melhorem a qualidade desses cursos. Hoje no DF são 31 faculdades de Direito. Se criarmos uma comissão atuante exigindo qualidade do ensino e qualificação dos professores, talvez possamos de uma maneira mais efetiva contribuir para a regulação desse cenário.
Se o Exame fosse aplicado no meio ou durante o curso, poderia ser uma opção de melhorar o desempenho dos estudantes?
Délio Lins: Nesse caso, deveria ter provas parciais. Mas sabemos que em algumas faculdades existe uma certa liberdade na grade acadêmica e não é sempre que as mesmas matérias são aplicadas em um determinado semestre. Sinceramente, acho que uma prova no meio do curso não faria sentido. Nunca tinha pensado nisso e creio que em um primeiro Exame assim não teria lógica.
Como a classe advocatícia pensa em atuar caso ele [Jair Bolsonaro] venha a cancelar a obrigatoriedade do Exame de Ordem?
Délio Lins: Existe uma legislação federal de 1994 que criou o Instituto do Exame de Ordem. Para se acabar com isso terá que revogar a norma atual. Então, temos que separar as coisas. Quando falamos ‘o Presidente Bolsonaro quer acabar com o Exame de Ordem’, ele [Bolsonaro] sozinho não tem o poder para isso. Se fizer por meio de decreto seria uma loucura e a OAB teria que intervir, alegando inconstitucionalidade do decreto. Mas partindo do princípio que ele encaminhe uma proposta do tipo para o Congresso Nacional, essa discussão terá mais força. Temos no Congresso Nacional a bancada da advocacia, com representantes não necessariamente da advocacia, mas de setores que possam eventualmente defender o Exame de Ordem.
O que devemos fazer é um trabalho junto ao Congresso Nacional para demonstrar aos parlamentares a importância do Exame de Ordem e a temeridade que seria extingui-lo. Mostrar inclusive com base em números o perigo que seria para a sociedade acabar com o Exame de Ordem. Temos esse debate no parlamento há anos.
Advocacia é uma profissão de elevado impacto social, correto?
Délio Lins: As autoridades têm que entender é que as prerrogativas do advogado não são vantagens ou benefícios. São elas [prerrogativas] uma forma de proteger a sociedade perante os poderes constituídos. Eu advogado tenho o direito a ter acesso aos dados do meu cliente, porquê? Não por ser melhor que alguém, mas pelo fato de eu ser advogado. Tenho a prerrogativa porque ele [cliente] é uma pessoa da sociedade que procurou a justiça para ter um direito. Ele [advogado] é o representante da sociedade junto aos poderes. Essa prerrogativa tem que ser compreendida pelas autoridades. Tentam mitigar esses direitos dos advogados de diversas formas e fazendo isso, eles tiram o direito da sociedade.
O senhor colocou um quantitativo considerado alto de mulheres na sua chapa de campanha. Como o senhor avalia essa nova política de inserção de mulheres na OAB/DF?
Délio Lins: Foi a nossa maior preocupação em montar o conselho que hoje é o Conselho da OAB/DF empossado. Temos lideranças de todos os nichos de advocacia e também da sociedade. E assim temos criminalistas, trabalhistas, tributaristas, além de representantes de diversos setores, incluindo o nicho da advocacia pública, como: Advocacia Geral da União (AGU), empresas públicas, Procuradoria do DF, Defensoria Pública. Ou seja, temos todas as advocacias representadas dentro da nossa equipe. A nossa outra preocupação: conversamos com os movimentos sociais. Hoje, temos dentro do conselho da OAB representantes dos movimentos negros, do movimento LGBT, movimento de PcD (Pessoas com Deficiência). Os movimentos sociais estão representados dentro do nosso conselho.
Por qual motivo? Uma palavra que temos usado muito é a pluralidade. Queremos dentro do Conselho da OAB/DF pessoas que representem efetivamente todos os nichos da sociedade e da advocacia. E isso inclui também a participação feminina. Hoje, as mulheres são mais da metade dos advogados e advogadas do Brasil. Se olharmos para todas as seccionais, incluindo o Conselho Federal, não vemos essa representatividade. Ao montar o nosso “tabuleiro de xadrez”, 50% de homens e mulheres foi o primeiro corte que fizemos e isso é muito representativo no sentido de mostrar que na prática, a OAB quer realmente ser representativa e ter essa pluralidade. E elas não são mulheres apenas por serem mulheres, este não é um rótulo. São mulheres, atuantes, advogadas, que representam de uma forma efetiva a advocacia nos nichos específicos de suas atuações em cargos de destaque.
A vinda desses nichos para a OAB/DF contribui para ações de desburocratização do sistema judiciário?
Délio Lins: Seria muito fácil para mim ter uma chapa formada por 105 pessoas. Mas pelo contrário, tivemos essa preocupação com a pluralidade, em colocar representantes da democracia. E dentro desse conceito entram as várias preocupações, que são as pessoas que representam: a AGU, a Procuradoria do DF, a advocacia criminal, entre outros que juntos, são responsáveis por atuar junto aos poderes constituídos. A desburocratização do judiciário é um ponto importantíssimo, mas não é o único. A OAB tem um braço social tão relevante quanto a defesa institucional da advocacia. A OAB tem que desempenhar todo o seu papel. Hoje, a Ordem dos Advogados não tem o mesmo respeito de tempos atrás e precisamos retornar ao protagonismo. Temos que participar dos grandes debates da sociedade.
Estarmos dentro do Congresso Nacional, da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), vendo as discussões e trazer para a nossa casa e nos posicionarmos, sem esperar manifestação do Ministério Público. A Ordem tem esse papel de defender a sociedade atuando junto ao Judiciário, ao Ministério Público, as Polícias, aos Poderes Executivo e Legislativo, com a missão de trabalhar junto e para a sociedade.
Buscando o apartidarismo, que o senhor vem falando ao longo da sua campanha?
Délio Lins: Este é um problema recorrente da OAB. A Ordem tem o papel político dela? Tem sim, e isso é importante. Mas o papel político no bom sentido. Temos que ser parceiros da sociedade, das instituições, dos poderes públicos nos bons projetos. O nosso papel social é participar desses bons projetos.
Em contrapartida, devemos ter independência suficiente e aí entra o apartidarismo, para não deixar que a nossa casa seja tomada pela política. Nesse caso, a política partidária. Temos que trabalhar em conjunto, mas separando o joio do trigo. Infelizmente esse perigo existe e se torna nefasto para a nossa casa, pois é contra o nosso papel histórico. Sempre tivemos independência, atuando de maneira firme junto aos poderes e temos que continuar dessa maneira.
Justiça Em Foco: Sobre o crescimento no número de advogados, como a OAB/DF planeja em preparar esses bacharéis iniciantes no mundo advocatício?
Délio Lins: Atualmente, somos aqui no DF 60 mil advogados inscritos. Algo próximo de 40 mil advogados aptos a exercer a profissão e cerca de 33 mil estavam aptos a votar para a escolha do Conselho da OAB/DF e a diferença é por conta da anuidade. Este problema é muito grave e sentimos muito isso durante a campanha e nos primeiros dias de gestão. Hoje o advogado não tem dinheiro e não existe mercado. Além disso, não existe uma chave mágica para resolver essa situação, que é muito grave, pois não é apenas no DF, mas em qualquer lugar do Brasil. Então, temos que trazer total apoio para esses advogados.
Uma das nossas propostas de campanha, já implementada, foi a redução do valor da anuidade para os advogados nos cinco primeiros anos de inscrição. Reduzimos o valor e hoje o advogado vai pagar a taxa de R$ 200 nos dois primeiros anos. A terceira anuidade será no valor de R$ 250. No quarto ano a quantia de R$ 300 e a quinta anuidade vai custar R$ 350. Essa redução foi elaborada pensando exatamente nesses anos que são exatamente os mais difíceis para a classe. Estamos estudando a criação de um Centro de Atendimento ao Advogado Iniciante com a atuação de diversas comissões de maneira integrada para apoiar o advogado que está chegando, com o auxílio de escritórios modelos para ensiná-lo a peticionar de maneira correta e orientar em processos eletrônicos.
Estudamos ainda uma parceria com o Sebrae para trazer cursos de Gestão de Escritório e Comportamental, para ensinar ao advogado como se comportar em uma entrevista ou diante a um juiz, um promotor ou um delegado, desenvolvendo o início da sua carreira o melhor possível, inclusive aqueles que queiram se preparar para o concurso público. A nossa casa está a postos para ajudá-los.
Algo para acrescentar?
Délio Lins: Quero agradecer e colocar a casa à disposição. A porta da Presidência vai estar sempre aberta para todos. Quem quiser pode vir aqui conversar conosco, pois queremos trazer para dentro da OAB toda a sociedade do DF. Eu espero resgatar isso na OAB, o protagonismo na sociedade civil. Um lugar pronto para defender a advocacia e mais do que isso, defender a sociedade. Um porto seguro para a sociedade.
Assista momentos da entrevista: https://www.youtube.com/watch?v=ZKoZTvNvnNg
Fonte: www.justicaemfoco.com.br
Em contrapartida há aqueles que recebem com preocupação as expressões do Presidente acerca do Exame de Ordem, pois defendem a prova como item fundamental para qualificar os advogados em todo o território nacional. Com isso, a equipe do Justiça Em Foco aproveitou a efervescência desse tema para conversar com o novo presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil no Distrito Federal (OAB/DF), Délio Lins, para avaliar o impacto dessa medida no setor jurídico, no caso de uma possível extinção no Exame da OAB. Como assumiu a presidência da OAB/DF recentemente, Délio Lins falou também de projetos para a sua gestão à frente da instituição.
A seguir, trechos do bate-papo:
Como o senhor avalia o posicionamento do Presidente da República em acabar com o Exame da OAB?
Délio Lins: Qualquer iniciativa contrária ao Exame de ordem é avaliada pela OAB como negativa e perigosa, seja pelo presidente Jair Bolsonaro ou por outra autoridade. Toda a Ordem, incluindo as seccionais, vai ter uma atitude no sentido de coibir qualquer ato nesse sentido. Há muito tempo esse tema é levantado e o Bolsonaro não é o único a falar disso.
Agora, imagine a quantidade de bacharéis que existem sem a inscrição na OAB. Não conheço ninguém que saiba ter esse dado quantificado com exatidão. Já ouvi falar de algo entre 01 a 04 milhões. Ninguém tem essa informação com exatidão. Esse problema foi gerado pelo aumento abrupto e descontrolado das faculdades de Direito. Existe sim um contingente parado, esperando entrar para os quadros da OAB e esse dado não sabemos quantificar. Nesse cenário surge um problema grave que é a proteção da sociedade em todo esse contexto, pois o advogado é o braço da sociedade dentro do Poder Judiciário e dos demais poderes. O fato é: o advogado está ali para representar alguém perante os poderes constituídos.
Imagina um advogado que não tem a qualificação necessária, o tamanho do problema que esse profissional pode criar. Então, temos que ter um controle de qualidade desse sistema e a Ordem tem responsabilidade nisso. Acabar o Exame de Ordem é um absurdo, é uma perda no controle de qualidade e consequentemente, traz graves e grandes problemas para a sociedade.
O senhor acredita que o Exame, da maneira como é aplicado hoje, está bom ou precisa de modificações?
Délio Lins: Precisa e pode ter vários ajustes. Eu já fiz parte da comissão, pois a Ordem indica membros para acompanhar a empresa que aplica o Exame de Ordem nas suas diferentes fases. Já participei umas 04 vezes por indicação do Conselho Federal da OAB. Conseguimos ver como é todo o processo de realização do Exame e no modo geral, muita coisa precisa ser melhorada. Dizem que a prova é difícil, mas eu acho que a prova está mais para fácil do que para difícil. Poderia ter um controle mais rígido na própria qualidade do Exame de Ordem no sentido de tornar a prova mais voltada para a advocacia do que ter matérias e questões genéricas. Poderia haver uma melhor maneira de trabalhar a peça, a quantidade de peças à disposição de quem faz a prova. Vivemos em um mercado de trabalho em constante evolução e não faz mais sentido ficar naquela coisa básica de Direito Civil, Direito do Trabalho ou Direito Criminal. Tem outras áreas que poderiam ser disponibilizadas aos advogados para fazerem as provas. Dá para ser trabalhado o formato do Exame, mas acabar com ele é uma loucura.
Se o Exame é fácil, o problema está no ensino?
Délio Lins: O problema crucial é esse. O alto número de faculdades que existem no Brasil e a quantidade de faculdades que existem de baixa qualidade. Veja, o Brasil tem mais faculdades de Direito do que o resto do mundo. Enquanto no mundo existem cerca de 1.200 faculdades de Direito, no Brasil tem mais de 1.300 faculdades. Nas últimas semanas autorizaram mais umas duzentas instituições a lecionarem o curso de Direito, isso é um absurdo.
A Ordem dos Advogados perdeu o controle e o Ministério da Educação (MEC) não ouve a OAB. Um parecer da OAB hoje não é lido dentro do MEC para aprovar ou fechar um curso de Direito. Se for lido, é totalmente ignorado. No melhor dos mundos o parecer da OAB deveria se tonar vinculativo para conseguir dar uma regulada nessa abertura de curso.
Temos uma proposta de implementar a criação de uma comissão de controle dos cursos de Direito na OAB/DF, formada por vários profissionais do cenário jurídico. Teremos nesse grupo vários representantes das magistraturas Federal e do DF, composta por: membros dos Ministérios Públicos, das Polícias, das advocacias públicas, advogados privados. Juntos, todos os interessados no mundo jurídico, todos os integrantes do Direito representando diversos setores, possam atuar junto aos órgãos de controle com medidas que melhorem a qualidade desses cursos. Hoje no DF são 31 faculdades de Direito. Se criarmos uma comissão atuante exigindo qualidade do ensino e qualificação dos professores, talvez possamos de uma maneira mais efetiva contribuir para a regulação desse cenário.
Se o Exame fosse aplicado no meio ou durante o curso, poderia ser uma opção de melhorar o desempenho dos estudantes?
Délio Lins: Nesse caso, deveria ter provas parciais. Mas sabemos que em algumas faculdades existe uma certa liberdade na grade acadêmica e não é sempre que as mesmas matérias são aplicadas em um determinado semestre. Sinceramente, acho que uma prova no meio do curso não faria sentido. Nunca tinha pensado nisso e creio que em um primeiro Exame assim não teria lógica.
Como a classe advocatícia pensa em atuar caso ele [Jair Bolsonaro] venha a cancelar a obrigatoriedade do Exame de Ordem?
Délio Lins: Existe uma legislação federal de 1994 que criou o Instituto do Exame de Ordem. Para se acabar com isso terá que revogar a norma atual. Então, temos que separar as coisas. Quando falamos ‘o Presidente Bolsonaro quer acabar com o Exame de Ordem’, ele [Bolsonaro] sozinho não tem o poder para isso. Se fizer por meio de decreto seria uma loucura e a OAB teria que intervir, alegando inconstitucionalidade do decreto. Mas partindo do princípio que ele encaminhe uma proposta do tipo para o Congresso Nacional, essa discussão terá mais força. Temos no Congresso Nacional a bancada da advocacia, com representantes não necessariamente da advocacia, mas de setores que possam eventualmente defender o Exame de Ordem.
O que devemos fazer é um trabalho junto ao Congresso Nacional para demonstrar aos parlamentares a importância do Exame de Ordem e a temeridade que seria extingui-lo. Mostrar inclusive com base em números o perigo que seria para a sociedade acabar com o Exame de Ordem. Temos esse debate no parlamento há anos.
Advocacia é uma profissão de elevado impacto social, correto?
Délio Lins: As autoridades têm que entender é que as prerrogativas do advogado não são vantagens ou benefícios. São elas [prerrogativas] uma forma de proteger a sociedade perante os poderes constituídos. Eu advogado tenho o direito a ter acesso aos dados do meu cliente, porquê? Não por ser melhor que alguém, mas pelo fato de eu ser advogado. Tenho a prerrogativa porque ele [cliente] é uma pessoa da sociedade que procurou a justiça para ter um direito. Ele [advogado] é o representante da sociedade junto aos poderes. Essa prerrogativa tem que ser compreendida pelas autoridades. Tentam mitigar esses direitos dos advogados de diversas formas e fazendo isso, eles tiram o direito da sociedade.
Sobre o cenário local
O senhor colocou um quantitativo considerado alto de mulheres na sua chapa de campanha. Como o senhor avalia essa nova política de inserção de mulheres na OAB/DF?
Délio Lins: Foi a nossa maior preocupação em montar o conselho que hoje é o Conselho da OAB/DF empossado. Temos lideranças de todos os nichos de advocacia e também da sociedade. E assim temos criminalistas, trabalhistas, tributaristas, além de representantes de diversos setores, incluindo o nicho da advocacia pública, como: Advocacia Geral da União (AGU), empresas públicas, Procuradoria do DF, Defensoria Pública. Ou seja, temos todas as advocacias representadas dentro da nossa equipe. A nossa outra preocupação: conversamos com os movimentos sociais. Hoje, temos dentro do conselho da OAB representantes dos movimentos negros, do movimento LGBT, movimento de PcD (Pessoas com Deficiência). Os movimentos sociais estão representados dentro do nosso conselho.
Por qual motivo? Uma palavra que temos usado muito é a pluralidade. Queremos dentro do Conselho da OAB/DF pessoas que representem efetivamente todos os nichos da sociedade e da advocacia. E isso inclui também a participação feminina. Hoje, as mulheres são mais da metade dos advogados e advogadas do Brasil. Se olharmos para todas as seccionais, incluindo o Conselho Federal, não vemos essa representatividade. Ao montar o nosso “tabuleiro de xadrez”, 50% de homens e mulheres foi o primeiro corte que fizemos e isso é muito representativo no sentido de mostrar que na prática, a OAB quer realmente ser representativa e ter essa pluralidade. E elas não são mulheres apenas por serem mulheres, este não é um rótulo. São mulheres, atuantes, advogadas, que representam de uma forma efetiva a advocacia nos nichos específicos de suas atuações em cargos de destaque.
A vinda desses nichos para a OAB/DF contribui para ações de desburocratização do sistema judiciário?
Délio Lins: Seria muito fácil para mim ter uma chapa formada por 105 pessoas. Mas pelo contrário, tivemos essa preocupação com a pluralidade, em colocar representantes da democracia. E dentro desse conceito entram as várias preocupações, que são as pessoas que representam: a AGU, a Procuradoria do DF, a advocacia criminal, entre outros que juntos, são responsáveis por atuar junto aos poderes constituídos. A desburocratização do judiciário é um ponto importantíssimo, mas não é o único. A OAB tem um braço social tão relevante quanto a defesa institucional da advocacia. A OAB tem que desempenhar todo o seu papel. Hoje, a Ordem dos Advogados não tem o mesmo respeito de tempos atrás e precisamos retornar ao protagonismo. Temos que participar dos grandes debates da sociedade.
Estarmos dentro do Congresso Nacional, da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), vendo as discussões e trazer para a nossa casa e nos posicionarmos, sem esperar manifestação do Ministério Público. A Ordem tem esse papel de defender a sociedade atuando junto ao Judiciário, ao Ministério Público, as Polícias, aos Poderes Executivo e Legislativo, com a missão de trabalhar junto e para a sociedade.
Buscando o apartidarismo, que o senhor vem falando ao longo da sua campanha?
Délio Lins: Este é um problema recorrente da OAB. A Ordem tem o papel político dela? Tem sim, e isso é importante. Mas o papel político no bom sentido. Temos que ser parceiros da sociedade, das instituições, dos poderes públicos nos bons projetos. O nosso papel social é participar desses bons projetos.
Em contrapartida, devemos ter independência suficiente e aí entra o apartidarismo, para não deixar que a nossa casa seja tomada pela política. Nesse caso, a política partidária. Temos que trabalhar em conjunto, mas separando o joio do trigo. Infelizmente esse perigo existe e se torna nefasto para a nossa casa, pois é contra o nosso papel histórico. Sempre tivemos independência, atuando de maneira firme junto aos poderes e temos que continuar dessa maneira.
Justiça Em Foco: Sobre o crescimento no número de advogados, como a OAB/DF planeja em preparar esses bacharéis iniciantes no mundo advocatício?
Délio Lins: Atualmente, somos aqui no DF 60 mil advogados inscritos. Algo próximo de 40 mil advogados aptos a exercer a profissão e cerca de 33 mil estavam aptos a votar para a escolha do Conselho da OAB/DF e a diferença é por conta da anuidade. Este problema é muito grave e sentimos muito isso durante a campanha e nos primeiros dias de gestão. Hoje o advogado não tem dinheiro e não existe mercado. Além disso, não existe uma chave mágica para resolver essa situação, que é muito grave, pois não é apenas no DF, mas em qualquer lugar do Brasil. Então, temos que trazer total apoio para esses advogados.
Uma das nossas propostas de campanha, já implementada, foi a redução do valor da anuidade para os advogados nos cinco primeiros anos de inscrição. Reduzimos o valor e hoje o advogado vai pagar a taxa de R$ 200 nos dois primeiros anos. A terceira anuidade será no valor de R$ 250. No quarto ano a quantia de R$ 300 e a quinta anuidade vai custar R$ 350. Essa redução foi elaborada pensando exatamente nesses anos que são exatamente os mais difíceis para a classe. Estamos estudando a criação de um Centro de Atendimento ao Advogado Iniciante com a atuação de diversas comissões de maneira integrada para apoiar o advogado que está chegando, com o auxílio de escritórios modelos para ensiná-lo a peticionar de maneira correta e orientar em processos eletrônicos.
Estudamos ainda uma parceria com o Sebrae para trazer cursos de Gestão de Escritório e Comportamental, para ensinar ao advogado como se comportar em uma entrevista ou diante a um juiz, um promotor ou um delegado, desenvolvendo o início da sua carreira o melhor possível, inclusive aqueles que queiram se preparar para o concurso público. A nossa casa está a postos para ajudá-los.
Algo para acrescentar?
Délio Lins: Quero agradecer e colocar a casa à disposição. A porta da Presidência vai estar sempre aberta para todos. Quem quiser pode vir aqui conversar conosco, pois queremos trazer para dentro da OAB toda a sociedade do DF. Eu espero resgatar isso na OAB, o protagonismo na sociedade civil. Um lugar pronto para defender a advocacia e mais do que isso, defender a sociedade. Um porto seguro para a sociedade.
Assista momentos da entrevista: https://www.youtube.com/watch?v=ZKoZTvNvnNg
Fonte: www.justicaemfoco.com.br