goo.gl/fusD88 | Não foi só o vazamento do relatório da Receita Federal sobre o ministro Gilmar Mendes e sua mulher, a advogada Guiomar Feitosa, à revista Veja que foi ilegal. Pelo que está escrito no relatório, a intenção do auditor fiscal Luciano Castro é investigar a origem dos honorários pagos ao escritório da qual Guiomar é sócia.
De acordo com o documento, a intenção do auditor é investigar lavagem de dinheiro e tráfico de influência supostamente cometidos pelo ministro e sua mulher. Como Gilmar tem prerrogativa de foro no Supremo, só a Procuradoria-Geral da República poderia conferir esse tipo de informação, e mesmo assim só com autorização judicial para abertura de inquérito.
O auditor escreve no relatório que “o tráfico de influência normalmente se dá pelo julgamento de ações advocatícias de escritórios ligados ao contribuinte ou seus parentes, onde o próprio magistrado ou um de seus pares facilita o julgamento”. Antes disso, afirma que "verificou-se a distribuição de lucros e dividendos nos anos de 2014 e 2015, os quais deverão ser verificados se houve a efetiva prestação de serviços pela contribuinte".
Está claro, portanto, que a intenção do auditor é investigar quem pagou os honorários de Guiomar. Segundo o Estatuto da Advocacia, "no exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos". E o Conselho Federal da OAB já disse que os honorários se incluem nessa inviolabilidade.
A Procuradoria-Geral da República sabe disso. Em 2013, o então PGR, Roberto Gurgel, enviou parecer ao Supremo em ação que discutia as obrigações de informação de profissionais liberais previstas na Lei Antilavagem. No documento, ele deixa claro que exigir que advogados informem suas movimentações financeiras é inconstitucional por obrigá-los a violar o sigilo funcional, uma de suas prerrogativas.
"A lei, frise-se bastante nesse ponto, não alcança a advocacia vinculada à administração da Justiça, porque, do contrário, seria atingido o núcleo essencial dos princípios do contraditório e da ampla defesa", diz o parecer. "A lei não se aplica ao advogado no exercício do constitucional direito de defesa nem ao consultor que, com seu trabalho de aconselhamento, evita que litígios ocorram.”
Fuçar os honorários é manobra já comum quando o objetivo é fragilizar a defesa dos alvos dos órgãos de persecução. Em 2015, o ministro Teori Zavascki autorizou a quebra de sigilo bancário de dois escritórios para que se apurasse quem havia pago os honorários dos advogados. Detalhe é que, embora o relatório da Polícia Federal falasse em descobrir a origem dos honorários, o então PGR, Rodrigo Janot, omitiu essa parte no pedido que fez a Teori, fingindo se tratar de uma movimentação financeira qualquer. Alertado do problema, Teori reconsiderou a decisão e mandou a PGR descartar as "provas".
No mesmo ano, a CPI da Petrobras convocou a advogada Beatriz Catta Preta para que ela fosse ao Congresso revelar quem eram seus clientes e a origem dos seus rendimentos. Ela representava alguns dos principais delatores da "lava jato", e havia a suspeita de que as versões dos delatores tivesse sido combinada para prejudicar grupos políticos específicos.
Mas a estratégia, bem menos invasiva que a do auditor fiscal que agora investiga o ministro Gilmar, era ilegal. O ministro Dias Toffoli concedeu liminar para dispensar Catta Preta de ir à CPI e prestar informações do tipo.
“Além disso, que seja preservada a confidencialidade que rege a relação entre cliente e advogado, inclusive no que toca à origem dos honorários advocatícios percebidos, notadamente para resguardar o sigilo profissional dos advogados e o direito de defesa”, escreveu Toffoli, na decisão.
Do acórdão da Ação Penal 470, o processo do mensalão, consta um trecho do voto do ministro Celso de Mello que reforça as prerrogativas dos advogados no trabalho em defesa de seus clientes.
Para o ministro Celso de Mello, existe uma “cláusula de imunidade judiciária” relacionada à prática da advocacia. "Esta cláusula “reveste-se da maior relevância, ao assegurar ao advogado a inviolabilidade por manifestações que haja exteriorizado no exercício da profissão, ainda que a suposta ofensa tenha sido proferida contra magistrado, desde que observado vínculo de pertinente causalidade com o contexto em que se desenvolveu determinado litígio”, votou o decano.
Em seu voto, Celso de Mello afirmou que as prerrogativas profissionais de advogados, embora explicitadas no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94), emanam diretamente da Constituição Federal e foram fixadas “com o elevado propósito de viabilizar a defesa da integridade dos direitos fundamentais das pessoas em geral”. Ou seja, as prerrogativas servem aos cidadãos representados pelos advogados, não pessoalmente aos profissionais protegidos por elas.
“As prerrogativas profissionais não devem ser confundidas nem identificadas com meros privilégios de índole corporativa, pois se destinam, enquanto instrumentos vocacionados a preservar a atuação independente do advogado, a conferir efetividade às franquias constitucionais invocadas em defesa daqueles cujos interesses lhe são confiados”, reforça o ministro decano do Supremo, que lembrou, contudo, que a inviolabilidade não é absoluta, como não é qualquer outro direito.
Ainda de acordo com o ministro, o advogado pode fazer valer suas prerrogativas em qualquer espaço institucional — Executivo, Legislativo ou Judiciário — ou perante qualquer órgão de Estado.
"Ao advogado incumbe neutralizar os abusos, fazer cessar o arbítrio, exigir respeito ao ordenamento jurídico e velar pela integridade das garantias — legais e constitucionais — outorgadas àquele que lhe confiou a proteção de sua liberdade e de seus direitos”.
Fonte: Conjur
De acordo com o documento, a intenção do auditor é investigar lavagem de dinheiro e tráfico de influência supostamente cometidos pelo ministro e sua mulher. Como Gilmar tem prerrogativa de foro no Supremo, só a Procuradoria-Geral da República poderia conferir esse tipo de informação, e mesmo assim só com autorização judicial para abertura de inquérito.
O auditor escreve no relatório que “o tráfico de influência normalmente se dá pelo julgamento de ações advocatícias de escritórios ligados ao contribuinte ou seus parentes, onde o próprio magistrado ou um de seus pares facilita o julgamento”. Antes disso, afirma que "verificou-se a distribuição de lucros e dividendos nos anos de 2014 e 2015, os quais deverão ser verificados se houve a efetiva prestação de serviços pela contribuinte".
Está claro, portanto, que a intenção do auditor é investigar quem pagou os honorários de Guiomar. Segundo o Estatuto da Advocacia, "no exercício da profissão, o advogado é inviolável por seus atos". E o Conselho Federal da OAB já disse que os honorários se incluem nessa inviolabilidade.
A Procuradoria-Geral da República sabe disso. Em 2013, o então PGR, Roberto Gurgel, enviou parecer ao Supremo em ação que discutia as obrigações de informação de profissionais liberais previstas na Lei Antilavagem. No documento, ele deixa claro que exigir que advogados informem suas movimentações financeiras é inconstitucional por obrigá-los a violar o sigilo funcional, uma de suas prerrogativas.
"A lei, frise-se bastante nesse ponto, não alcança a advocacia vinculada à administração da Justiça, porque, do contrário, seria atingido o núcleo essencial dos princípios do contraditório e da ampla defesa", diz o parecer. "A lei não se aplica ao advogado no exercício do constitucional direito de defesa nem ao consultor que, com seu trabalho de aconselhamento, evita que litígios ocorram.”
Exemplos da "lava jato"
Fuçar os honorários é manobra já comum quando o objetivo é fragilizar a defesa dos alvos dos órgãos de persecução. Em 2015, o ministro Teori Zavascki autorizou a quebra de sigilo bancário de dois escritórios para que se apurasse quem havia pago os honorários dos advogados. Detalhe é que, embora o relatório da Polícia Federal falasse em descobrir a origem dos honorários, o então PGR, Rodrigo Janot, omitiu essa parte no pedido que fez a Teori, fingindo se tratar de uma movimentação financeira qualquer. Alertado do problema, Teori reconsiderou a decisão e mandou a PGR descartar as "provas".
No mesmo ano, a CPI da Petrobras convocou a advogada Beatriz Catta Preta para que ela fosse ao Congresso revelar quem eram seus clientes e a origem dos seus rendimentos. Ela representava alguns dos principais delatores da "lava jato", e havia a suspeita de que as versões dos delatores tivesse sido combinada para prejudicar grupos políticos específicos.
Mas a estratégia, bem menos invasiva que a do auditor fiscal que agora investiga o ministro Gilmar, era ilegal. O ministro Dias Toffoli concedeu liminar para dispensar Catta Preta de ir à CPI e prestar informações do tipo.
“Além disso, que seja preservada a confidencialidade que rege a relação entre cliente e advogado, inclusive no que toca à origem dos honorários advocatícios percebidos, notadamente para resguardar o sigilo profissional dos advogados e o direito de defesa”, escreveu Toffoli, na decisão.
Ação Penal 470
Do acórdão da Ação Penal 470, o processo do mensalão, consta um trecho do voto do ministro Celso de Mello que reforça as prerrogativas dos advogados no trabalho em defesa de seus clientes.
Para o ministro Celso de Mello, existe uma “cláusula de imunidade judiciária” relacionada à prática da advocacia. "Esta cláusula “reveste-se da maior relevância, ao assegurar ao advogado a inviolabilidade por manifestações que haja exteriorizado no exercício da profissão, ainda que a suposta ofensa tenha sido proferida contra magistrado, desde que observado vínculo de pertinente causalidade com o contexto em que se desenvolveu determinado litígio”, votou o decano.
Em seu voto, Celso de Mello afirmou que as prerrogativas profissionais de advogados, embora explicitadas no Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94), emanam diretamente da Constituição Federal e foram fixadas “com o elevado propósito de viabilizar a defesa da integridade dos direitos fundamentais das pessoas em geral”. Ou seja, as prerrogativas servem aos cidadãos representados pelos advogados, não pessoalmente aos profissionais protegidos por elas.
“As prerrogativas profissionais não devem ser confundidas nem identificadas com meros privilégios de índole corporativa, pois se destinam, enquanto instrumentos vocacionados a preservar a atuação independente do advogado, a conferir efetividade às franquias constitucionais invocadas em defesa daqueles cujos interesses lhe são confiados”, reforça o ministro decano do Supremo, que lembrou, contudo, que a inviolabilidade não é absoluta, como não é qualquer outro direito.
Ainda de acordo com o ministro, o advogado pode fazer valer suas prerrogativas em qualquer espaço institucional — Executivo, Legislativo ou Judiciário — ou perante qualquer órgão de Estado.
"Ao advogado incumbe neutralizar os abusos, fazer cessar o arbítrio, exigir respeito ao ordenamento jurídico e velar pela integridade das garantias — legais e constitucionais — outorgadas àquele que lhe confiou a proteção de sua liberdade e de seus direitos”.
Fonte: Conjur