bit.ly/2VfA9sL | Um bacharel em Direito foi condenado a pagar cerca de R$ 12 mil de custas processuais e outros R$ 89 mil de honorários sucumbenciais após seu pedido de vínculo de emprego com um escritório de advocacia em Cuiabá ser rejeitado pela Justiça do Trabalho. Sem nunca ter tido registro na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e estando com a carteira de estagiário vencida desde 2012, o bacharel relatou que durante os cinco anos em que esteve ligado ao escritório, de março de 2013 a junho de 2018, atuou de forma direta em 730 ações nos juizados especiais cíveis.
O trabalho se iniciava com a captação e indicação de clientes para o escritório, e prosseguia com a elaboração das petições iniciais e acompanhamento de todos os trâmites processuais, incluindo a elaboração dos recursos, controles dos prazos, diligências junto às varas dos juizados especiais e interlocuções com os assessores dos juízes, como também o levantamento dos valores resultantes das sentenças e acordos. Para tanto, recebia comissões equivalentes a 45% dos honorários advocatícios firmados com os clientes, o que lhe garantia rendimento mensal superior a 15 mil reais, montante que variava, chegando por diversas vezes até ao dobro desse valor.
Também segundo relatou à Justiça, o negócio nasceu com um convite do proprietário da banca de advocacia para que se implantasse um projeto para “impulsionar a captação de clientes e promover o ajuizamento de ações de natureza indenizatórias”, no qual o bacharel ocuparia a função de diretor de Núcleo de Direito do Consumidor no escritório, com rendimento de 50% dos honorários resultantes de sua atuação, percentual que posteriormente foi reduzido para 45%. Contou que, diante das condições oferecidas e por ser bacharel em Direito com experiência na área, aceitou a proposta e o projeto foi implantado e se solidificou.
Entretanto, com o passar do tempo “passou a ser visto com maus olhos no escritório, pelo fato de que auferia rendimentos superiores aos dos outros advogados do escritório, embora sendo apenas bacharel em direito”, o que culminou em sua dispensa sem aviso prévio em junho do ano passado. Foi quando decidiu buscar a Justiça do Trabalho para reivindicar o reconhecimento do vínculo de emprego e, como consequência, a anotação da Carteira de Trabalho e o pagamento de férias nunca gozadas, 13º nunca quitados, além de outros direitos trabalhistas como FGTS, verbas rescisórias e a guia para receber o seguro-desemprego. Atribuiu à causa o valor de 597 mil reais.
Em sua defesa, o escritório negou o vínculo de emprego e disse que o bacharel prestava serviços na condição de autônomo, em uma forma de parceria com o escritório, um freelancer, com a prestação de serviços eventuais, confirmando o pagamento de comissões de 45% sobre o êxito das ações judiciais decorrentes dos contratos de prestação de serviços advocatícios pactuados com os clientes indicados. Afirmou ainda que o bacharel exercia esses mesmos serviços para clientes fora do escritório e por vezes passava dias sem comparecer ao local.
EXERCÍCIO ILEGAL
Por fim, apresentou contrato de prestação de serviços jurídicos para comprovar a parceria e negar o vínculo empregatício. Ao analisar o caso, o juiz Edilson Ribeiro da Silva, em atuação na 5ª Vara do Trabalho de Cuiabá, concluiu pela ocorrência de exercício ilegal da profissão de advogado.
Conforme destacou, as atividades efetivamente cumpridas pelo bacharel comprovam o exercício em sua plenitude da profissão de advogado, inclusive com o seu nome constando das procurações e das petições apresentadas – ressalvadas, apenas as assinaturas das peças processuais que eram do advogado sócio majoritário do escritório, conduta vedada pelo Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/94). A norma estabelece que o exercício da advocacia é privativo dos inscritos na Ordem e que “São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas.”.
No mesmo sentido, a previsão no Código Penal dos crimes de estelionato e de falsidade ideológica (nos artigos 171 e 299) àquele que se identifica ou se faz passar por advogado e obtém vantagem ilícita para si ou para outra pessoa. Era este o caso do bacharel que, embora não sendo advogado nem estagiário inscrito na OAB, se apresentava assim aos clientes e nos juizados especiais, “inclusive assim dizendo expressamente o autor em seu depoimento em audiência (‘que era obrigado a colocar o seu nome nas procurações passadas pelas partes; que se não tivesse o seu nome colocado nessas procurações não conseguiria então sequer conversar com o assessores, com alguém da Vara, para poder falar sobre os processos)”.
O juiz lembrou que, para a validade do contrato de trabalho, é necessária a presença dos requisitos estabelecidos pelo artigo 104 do Código Civil, em especial o objeto lícito. “Vale dizer, portanto, que a lei não permite a celebração de contrato cujo objeto envolva atividade ilegal, ou que venha a ser exercida de forma ilegal”, enfatizou.
Assim, em razão da ilicitude do objeto do contrato, da atividade do prestador de serviços e também da forma como a atividade era explorada pelo tomador dos serviços, “o contrato é nulo desde sempre, não havendo de gerar nenhum efeito no mundo jurídico”, afirmou o magistrado, acrescentando não haver “possibilidade de a Justiça do Trabalho reconhecer qualquer direito a quem se dedica e explora a atividade de forma ilegal, pois quem opta pelo exercício de atividade vedada pela ordem jurídica assume o ônus de, sem prejuízo de sofrer as sanções penais aplicáveis, não contar com a tutela do Direito do Trabalho ou de qualquer outro ramo do Poder Judiciário”. Nesse caso, impossível o reconhecimento da existência de relação de emprego, mesmo que fossem comprovados os requisitos para tal.
O que não ocorreu, conforme detalhada análise do magistrado em sua sentença, que demonstrou, ponto a ponto, a ausência, durante toda a relação entre o bacharel e o escritório, dos requisitos da subordinação, da onerosidade e o da não-eventualidade, necessários para o reconhecimento de um vínculo de emprego.
Caso, por exemplo, do requisito da onerosidade, que o juiz avaliou não presente devido ao patamar do rendimento que o bacharel obtinha. Conforme ressaltou, ao se reconhecer o salário de um empregado no patamar de 45% do faturamento bruto, estaria havendo uma “inversão da ordem das coisas, ou seja, sob pena de considerar estivesse o patrão a trabalho do empregado com o fim de proporcionar lucros a este”.
Além desse percentual, eram acrescidos mais cerca de 19,27% sobre o faturamento bruto a título de descansos semanais remunerados, férias com 1/3, 13º salário e depósitos do FGTS. Essa situação resultaria ao empregador “senão apenas prejuízos”, como explicou o magistrado, pois esse ainda teria que arcar com todos os custos do empreendimento, como os custos de água, energia elétrica, instalações e mobiliário, folha de pagamento dos demais funcionários, contribuições previdenciárias, etc.
A sentença indeferiu o pedido de justiça gratuita feita pelo bacharel e o condenou ao pagamento das custas processuais no montante de 11.959,65 reais, calculado sobre o valor por ele atribuído à causa. Ele também foi condenado a pagar os honorários sucumbenciais à advogada que defendeu o escritório, conforme as novas regras trazidas pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017).
Neste ponto, o autor deverá pagar aproximadamente 89 mil reais, equivalente a 15% do valor da causa. Como as demais sentenças proferidas nas varas do trabalho no estado, a decisão é passível de recurso ao Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT).
A conduta do escritório também mereceu a atenção do magistrado, que, da mesma forma que a do bacharel, foi classificada como ilícita em razão do objeto do contrato, ainda que fosse em parceria, como afirmou o escritório ao se defender. Conforme apontado pelo juiz, há proibição expressa no Estatuto da Advocacia e da OAB, em especial no artigo 34, que estabelece como infração disciplinar facilitar o exercício da profissão aos não inscritos na Ordem bem como “valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber”, ou ainda “ angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros” e, por fim “assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado”.
Diante das evidências de ofensas ao Código de Ética da OAB, de contravenção penal do exercício irregular da profissão e também de crimes de estelionato e de falsidade ideológica, o magistrado determinou o envio de ofícios à seccional da Ordem em Mato Grosso e ao Ministério Público Federal, para que avaliem a abertura de procedimentos que entenderem adequados, a exemplo de processo disciplinar, inquérito policial ou processo judicial.
Fonte: odocumento.com.br
O trabalho se iniciava com a captação e indicação de clientes para o escritório, e prosseguia com a elaboração das petições iniciais e acompanhamento de todos os trâmites processuais, incluindo a elaboração dos recursos, controles dos prazos, diligências junto às varas dos juizados especiais e interlocuções com os assessores dos juízes, como também o levantamento dos valores resultantes das sentenças e acordos. Para tanto, recebia comissões equivalentes a 45% dos honorários advocatícios firmados com os clientes, o que lhe garantia rendimento mensal superior a 15 mil reais, montante que variava, chegando por diversas vezes até ao dobro desse valor.
Também segundo relatou à Justiça, o negócio nasceu com um convite do proprietário da banca de advocacia para que se implantasse um projeto para “impulsionar a captação de clientes e promover o ajuizamento de ações de natureza indenizatórias”, no qual o bacharel ocuparia a função de diretor de Núcleo de Direito do Consumidor no escritório, com rendimento de 50% dos honorários resultantes de sua atuação, percentual que posteriormente foi reduzido para 45%. Contou que, diante das condições oferecidas e por ser bacharel em Direito com experiência na área, aceitou a proposta e o projeto foi implantado e se solidificou.
Entretanto, com o passar do tempo “passou a ser visto com maus olhos no escritório, pelo fato de que auferia rendimentos superiores aos dos outros advogados do escritório, embora sendo apenas bacharel em direito”, o que culminou em sua dispensa sem aviso prévio em junho do ano passado. Foi quando decidiu buscar a Justiça do Trabalho para reivindicar o reconhecimento do vínculo de emprego e, como consequência, a anotação da Carteira de Trabalho e o pagamento de férias nunca gozadas, 13º nunca quitados, além de outros direitos trabalhistas como FGTS, verbas rescisórias e a guia para receber o seguro-desemprego. Atribuiu à causa o valor de 597 mil reais.
Em sua defesa, o escritório negou o vínculo de emprego e disse que o bacharel prestava serviços na condição de autônomo, em uma forma de parceria com o escritório, um freelancer, com a prestação de serviços eventuais, confirmando o pagamento de comissões de 45% sobre o êxito das ações judiciais decorrentes dos contratos de prestação de serviços advocatícios pactuados com os clientes indicados. Afirmou ainda que o bacharel exercia esses mesmos serviços para clientes fora do escritório e por vezes passava dias sem comparecer ao local.
EXERCÍCIO ILEGAL
Por fim, apresentou contrato de prestação de serviços jurídicos para comprovar a parceria e negar o vínculo empregatício. Ao analisar o caso, o juiz Edilson Ribeiro da Silva, em atuação na 5ª Vara do Trabalho de Cuiabá, concluiu pela ocorrência de exercício ilegal da profissão de advogado.
Conforme destacou, as atividades efetivamente cumpridas pelo bacharel comprovam o exercício em sua plenitude da profissão de advogado, inclusive com o seu nome constando das procurações e das petições apresentadas – ressalvadas, apenas as assinaturas das peças processuais que eram do advogado sócio majoritário do escritório, conduta vedada pelo Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei 8.906/94). A norma estabelece que o exercício da advocacia é privativo dos inscritos na Ordem e que “São nulos os atos privativos de advogado praticados por pessoa não inscrita na OAB, sem prejuízo das sanções civis, penais e administrativas.”.
No mesmo sentido, a previsão no Código Penal dos crimes de estelionato e de falsidade ideológica (nos artigos 171 e 299) àquele que se identifica ou se faz passar por advogado e obtém vantagem ilícita para si ou para outra pessoa. Era este o caso do bacharel que, embora não sendo advogado nem estagiário inscrito na OAB, se apresentava assim aos clientes e nos juizados especiais, “inclusive assim dizendo expressamente o autor em seu depoimento em audiência (‘que era obrigado a colocar o seu nome nas procurações passadas pelas partes; que se não tivesse o seu nome colocado nessas procurações não conseguiria então sequer conversar com o assessores, com alguém da Vara, para poder falar sobre os processos)”.
O juiz lembrou que, para a validade do contrato de trabalho, é necessária a presença dos requisitos estabelecidos pelo artigo 104 do Código Civil, em especial o objeto lícito. “Vale dizer, portanto, que a lei não permite a celebração de contrato cujo objeto envolva atividade ilegal, ou que venha a ser exercida de forma ilegal”, enfatizou.
Assim, em razão da ilicitude do objeto do contrato, da atividade do prestador de serviços e também da forma como a atividade era explorada pelo tomador dos serviços, “o contrato é nulo desde sempre, não havendo de gerar nenhum efeito no mundo jurídico”, afirmou o magistrado, acrescentando não haver “possibilidade de a Justiça do Trabalho reconhecer qualquer direito a quem se dedica e explora a atividade de forma ilegal, pois quem opta pelo exercício de atividade vedada pela ordem jurídica assume o ônus de, sem prejuízo de sofrer as sanções penais aplicáveis, não contar com a tutela do Direito do Trabalho ou de qualquer outro ramo do Poder Judiciário”. Nesse caso, impossível o reconhecimento da existência de relação de emprego, mesmo que fossem comprovados os requisitos para tal.
O que não ocorreu, conforme detalhada análise do magistrado em sua sentença, que demonstrou, ponto a ponto, a ausência, durante toda a relação entre o bacharel e o escritório, dos requisitos da subordinação, da onerosidade e o da não-eventualidade, necessários para o reconhecimento de um vínculo de emprego.
Caso, por exemplo, do requisito da onerosidade, que o juiz avaliou não presente devido ao patamar do rendimento que o bacharel obtinha. Conforme ressaltou, ao se reconhecer o salário de um empregado no patamar de 45% do faturamento bruto, estaria havendo uma “inversão da ordem das coisas, ou seja, sob pena de considerar estivesse o patrão a trabalho do empregado com o fim de proporcionar lucros a este”.
Além desse percentual, eram acrescidos mais cerca de 19,27% sobre o faturamento bruto a título de descansos semanais remunerados, férias com 1/3, 13º salário e depósitos do FGTS. Essa situação resultaria ao empregador “senão apenas prejuízos”, como explicou o magistrado, pois esse ainda teria que arcar com todos os custos do empreendimento, como os custos de água, energia elétrica, instalações e mobiliário, folha de pagamento dos demais funcionários, contribuições previdenciárias, etc.
A sentença indeferiu o pedido de justiça gratuita feita pelo bacharel e o condenou ao pagamento das custas processuais no montante de 11.959,65 reais, calculado sobre o valor por ele atribuído à causa. Ele também foi condenado a pagar os honorários sucumbenciais à advogada que defendeu o escritório, conforme as novas regras trazidas pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017).
Neste ponto, o autor deverá pagar aproximadamente 89 mil reais, equivalente a 15% do valor da causa. Como as demais sentenças proferidas nas varas do trabalho no estado, a decisão é passível de recurso ao Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT).
A conduta do escritório também mereceu a atenção do magistrado, que, da mesma forma que a do bacharel, foi classificada como ilícita em razão do objeto do contrato, ainda que fosse em parceria, como afirmou o escritório ao se defender. Conforme apontado pelo juiz, há proibição expressa no Estatuto da Advocacia e da OAB, em especial no artigo 34, que estabelece como infração disciplinar facilitar o exercício da profissão aos não inscritos na Ordem bem como “valer-se de agenciador de causas, mediante participação nos honorários a receber”, ou ainda “ angariar ou captar causas, com ou sem a intervenção de terceiros” e, por fim “assinar qualquer escrito destinado a processo judicial ou para fim extrajudicial que não tenha feito, ou em que não tenha colaborado”.
Diante das evidências de ofensas ao Código de Ética da OAB, de contravenção penal do exercício irregular da profissão e também de crimes de estelionato e de falsidade ideológica, o magistrado determinou o envio de ofícios à seccional da Ordem em Mato Grosso e ao Ministério Público Federal, para que avaliem a abertura de procedimentos que entenderem adequados, a exemplo de processo disciplinar, inquérito policial ou processo judicial.
Fonte: odocumento.com.br