Empresa pode demitir por justa causa funcionário racista ou homofóbico?

Via @uoleconomia | Em 23 de junho, as notícias relacionadas ao Corinthians não tiveram muita relação com o que aconteceu dentro de campo. O assunto foi o ato de injúria racial cometido pelo jogador Danilo Avelar durante uma partida do jogo online CS: GO. No dia seguinte, o jogador admitiu a ofensa e pediu desculpas. 

Dois dias depois, o apresentador da RedeTV! Sikêra Jr. foi responsável por um ataque à comunidade LGBTQIA+ que tem causado prejuízos à emissora. O apresentador também assumiu a injúria e se desculpou quatro dias depois.

O que as empresas podem fazer quando funcionários cometem atos desse tipo? O UOL consultou especialistas para entender se os patrões podem demitir funcionários por atos de racismo e homofobia dentro ou fora do ambiente de trabalho. 

Vale demissão por justa causa? 

A resposta depende se a ofensa foi feita dentro ou fora do ambiente de trabalho. 

Para Sérgio Cardim, advogado especializado em direito trabalhista, um empregado com um contrato formal de trabalho que comete um ato de racismo ou homofobia no exercício da profissão está sujeito a uma dispensa por justa causa.

Fora do ambiente de trabalho, porém, o advogado entende que não tem como usar esse motivo para punir o empregado. "Pode mandar embora, sim, mas sem justa causa. Rescinde o contrato, mas pagando todos os direitos", afirma Cardim. 

No caso do jogador do Corinthians, Cardim avalia que não cabe justa causa porque o ato foi cometido fora do ambiente de trabalho e sem prejuízos ao clube. 

"Se não trouxe nenhum prejuízo financeiro, como perda de patrocínio para o clube, então não caberia justa causa", diz o advogado.

Bruna Gärner, advogada e consultora do escritório PGLaw na área de ética empresarial e governança corporativa, diz que, se Avelar fosse condenado em um eventual processo por injúria racial, a demissão por justa causa seria um caminho natural. 

"A condenação criminal do empregado é uma das hipóteses que permitem a demissão por justa causa", diz a advogada. Avelar, porém, não foi processado até agora. 

A advogada afirma que, se o ato fosse cometido em ambiente de trabalho, durante um jogo, por exemplo, a situação poderia ser diferente porque a lei prevê que qualquer conduta em serviço que viole a imagem da empresa é passível de demissão por justa causa.

Além disso, casos de indisciplina e insubordinação também permitem que a empresa use esse expediente. 

O que a empresa pode e deve fazer nesses casos 

Segundo Gärner, é importante que as empresas estabeleçam um código de ética que defina qualquer tipo de preconceito como condenável e passível de punição. 

"Se o funcionário, de alguma forma, não segue esse código, ainda que fora do horário de serviço, ele pode, sim, ser demitido por justa causa", afirma.

Com a demissão por racismo ou homofobia, via justa causa ou não, a empresa continua obrigada a pagar ao empregado os valores relacionados a dias trabalhados no mês, férias, 13º salário e outros direitos adquiridos. 

Em caso de justa causa, a empresa só está isenta de pagar as multas relacionadas ao saldo do FGTS. 

Estevão da Silva, presidente da Associação Nacional da Advocacia Negra (Anan), diz que, em caso de o funcionário ser acusado de um crime como os de racismo ou homofobia, a empresa precisa averiguar se aquilo aconteceu de fato, instaurando um processo administrativo ou uma sindicância. 

"É importante que a empresa tome alguma medida, porque, quando ela não se posiciona, está sendo conivente e indiretamente apoiando aquela atitude", diz o advogado.

No dia em que Danilo Avelar foi acusado na internet do ato de racismo, o Corinthians emitiu comunicados via redes sociais indicando que estava "apurando os fatos e o contexto" e se pronunciando contra "qualquer manifestação de conotação racista". 

Depois que o jogador assumiu ter cometido o ato, o clube disse ainda que estava buscando as "medidas cabíveis para o encerramento do vínculo". 

Procurado pelo UOL, o clube disse, via assessoria de imprensa, que está conversando com a equipe do atleta e que continua "analisando o caso".

Não há definição, porém, sobre como ou quando deverá ser encerrado o contrato com o jogador. O jogador está em tratamento médico e não atua desde outubro de 2020. Questionado sobre quais os motivos que impedem a demissão do jogador até aqui, o clube não se pronunciou. 

E no caso de danos financeiros à empresa? 

Casos como o de Sikêra Junior, da Rede TV!, são mais fáceis de serem punidos pelas empresas, segundo os especialistas.

O apresentador ofendeu a comunidade LBTQIA+ ao vivo em seu programa na RedeTV!., Alerta Nacional. A postura de Sikêra e a repercussão do caso levaram ao cancelamento de contratos entre patrocinadores e a emissora. 

Gärner diz que a RedeTV! tem a possibilidade de solicitar a demissão por justa causa se o contrato for pelo regime CLT, ou a interrupção do contrato de prestação de serviço, se o regime utilizado for de pessoa jurídica. 

Além disso, a emissora também teria o direito de pedir indenização por lucros cessantes e danos morais depois da debandada de patrocinadores.

A advogada diz ainda que houve negligência por parte da emissora, que mantém Sikêra no ar. Para ela, a RedeTV! teria um problema agora se tentasse fazer com que o apresentador arcasse com uma indenização por danos a sua imagem. 

"A emissora se recusou a tomar uma providência em relação ao que aconteceu, e isso é levado em conta no tribunal na hora de definir eventuais indenizações", afirma. 

Para Toni Reis, presidente da Aliança Nacional LGBTI+, o que impede a RedeTV! de tomar iniciativas mais duras são as cifras que envolvem o contrato entre a rede de televisão e o apresentador.

Ao vivo, Sikêra disse ganhar R$ 500 mil, além de valores relacionados a merchandising que ele faz durante o Alerta Nacional, o que poderia colocar seus rendimentos próximos de R$ 1 milhão por mês. A RedeTV! tem direito a parte dos anúncios captados pelo programa. 

Com a atitude de não punir o apresentador, a RedeTV! foi incluída em processo contra Sikêra pela Aliança Nacional LGBTI+ por homofobia. 

Além disso, a emissora perdeu patrocinadores por força das ações do movimento. "Estamos fazendo uma campanha muito grande com todos os patrocinadores do programa do Sikêra. Nós queremos que ele se desmonetize e já conseguimos que 53 empresas retirassem seus patrocínios", disse Reis.

Fonte: economia.uol.com.br

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