Já naquele período, a profissão era sinônimo de status – apenas os membros de famílias abastadas tinham condições de arcar com as despesas do curso, fosse ele no Brasil ou em Portugal, na Universidade de Coimbra, para onde muitos brasileiros seguiam em busca de formação. Décadas mais tarde, alguns nomes expressivos da nossa história, entre eles Rui Barbosa e Luís Gama, ajudariam na familiarização da especialidade em território nacional.
Atualmente, segundo levantamento da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), existem mais de 1,2 milhão de pessoas exercendo a profissão no país – cerca de um advogado para cada 190 habitantes, excluindo estagiários e suplementares. Além disso, ocupamos a terceira posição na lista de países com o maior número de juristas do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da Índia. Há quem diga, ainda, que o prestígio do setor vem da política, afinal, 22 dos 37 ex-presidentes da República se graduaram na disciplina.
Apesar da tradição, o segmento se mantém em constante evolução. À medida que mudanças legislativas são realizadas – bem como alterações na dinâmica social – torna-se necessário que os advogados e juízes se aprofundem em novas áreas de especialização.
Pensando nisso, a Forbes reuniu 5 áreas do direito muito promissoras para os próximos anos, assim como o depoimento de profissionais atuantes. Veja, na galeria abaixo, quais são elas:
Direito de agrobusiness
O direito de agrobusiness é a área que cuida de toda atividade agrária do ponto de vista jurídico. De acordo com os especialistas, toda a operação – desde a legislação até a defesa – é elaborada a partir da “teoria da agrariedade”, ou seja, leva em consideração os riscos específicos envolvidos nessa atividade econômica, incluindo pragas, secas etc.
“O direito do agronegócio se volta para toda a cadeia do setor, desde produtores de insumos e rurais, redes de logística e armazenagem até aqueles que buscam oferecer financiamento privado nesse meio”, explica Fábio Pallaretti Calcini, advogado e professor de tributação do agronegócio na FGV (Faculdade Getulio Vargas).
Na prática, o advogado ligado ao agronegócio pode atuar em inúmeras causas, desde questões ligadas aos tradicionais contratos agrários, regularização fundiária de imóvel rural, reintegração possessória e desapropriações até temas ligados à tributação, reestruturação societárias, regulatórias e operações financeiras e estruturais ligadas ao financiamento do setor.
Em relação ao mercado, Calcini afirma que as oportunidades são crescentes. “Diante da importância econômica e social do setor, existem boas perspectivas para quem atua ou gostaria de atuar na área. Mesmo o tradicional produtor rural do campo precisa, atualmente, de uma orientação jurídica, pois, do contrário, corre inúmeros riscos em seu negócio”, diz. Apesar disso, o professor fala que faltam profissionais devidamente especializados no setor. Segundo ele, o ideal é procurar formações técnicas que contemplem as peculiaridades da legislação da área.
Direito médico
Definido como o ramo da área jurídica que estuda e regulamenta as atividades dos profissionais e instituições de saúde, o direito médico ou direito hospitalar é uma nova categoria da profissão que procura nortear a relação entre a medicina e a ciência jurídica.
Segundo Mérces da Silva Nunes, mestre e doutora em direito pela PUC-SP, autora de obras e artigos sobre direito médico, o profissional especializado poderá tanto atuar em defesa dos pacientes – como em casos de diagnósticos errados, obtenção de leitos, medicamentos etc – quanto dos médicos – sejam eles problemas de contrato, falta de segurança ou questões morais relacionadas à atividade. Além disso, a área também engloba os direitos das operadoras de planos de saúde, bem como os hospitais públicos e privados.
Durante a pandemia, a especialidade foi muito procurada para resolver desavenças relacionadas ao fornecimento de EPIs (Equipamento de Proteção Individual) e a disponibilidade de leitos de internação. Outras questões polêmicas que podem surgir no debate do direito médico é a legalização da eutanásia e do aborto, por exemplo.
“A relação médico-paciente está cada vez mais complexa e o incremento de novas tecnologias na medicina abre um campo muito grande para a atuação do advogado. Mas, independentemente da área escolhida, é imprescindível que o profissional se especialize, qualifique e adquira as competências necessárias”, conclui Mérces.
Direito digital
Apesar de ser apelidada de “terra de ninguém”, a internet hoje já conta com uma extensa legislação, foco de estudo de quem atua com direito digital. A área abrange as relações entre pessoas físicas e jurídicas no universo virtual, fazendo interação com outros ramos do direito. “No Brasil, assim como fora, há um conjunto de normas, diretrizes, aplicações e portarias que regem tudo que acontece online”, pontua Marco Antônio de Araújo Jr., advogado especialista em direito de novas tecnologias pela Universidade Complutense de Madrid.
Os profissionais do direito digital costumam atuar principalmente como consultores de normas, ajudando empresas a se manterem em dia com as legislações vigentes no meio virtual, como a Lei Geral de Proteção de Dados, por exemplo. Também é possível trabalhar em conjunto com outras áreas, como o direito penal, civil e autoral, em casos de violação de privacidade, uso inapropriado de imagem e roubo de propriedade intelectual, como plágios.
Segundo relatório da Arkose Labs, empresa especializada em segurança da informação, o Brasil, ao lado dos Estados Unidos, Rússia, Indonésia, Filipinas e Reino Unido, está entre os países mais afetados por fraudes digitais no mundo. Desse modo, a demanda por profissionais especializados tende a crescer nos próximos anos. “Esse cenário reforça a necessidade de advogados que possam atuar de forma preventiva e reparadora”, afirma Araújo.
Mediação
A mais destoante entre as áreas do direito é a mediação. Isso porque a especialidade atua fora do Poder Judiciário, por meio de um método privado de resolução de conflitos. Nesse setor, uma terceira pessoa ajuda as partes envolvidas no problema a encontrar uma solução ou acordo de maneira confidencial.
De acordo com Carlos Alberto Vilela Sampaio, diretor-geral e sócio da CAMES (Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada), podem ser levados para mediação conflitos societários, disputas familiares, questões trabalhistas e qualquer discussão que envolva direitos. Para isso, basta que os envolvidos façam essa opção previamente em um contrato.
Dessa forma, o mediador acaba atuando como um facilitador na comunicação entre as partes, muitas vezes interrompendo a escalada do conflito. Por meio da escuta ativa, o profissional deve buscar identificar o interesse real por trás das posições assumidas pelos dois lados. “O mediador devidamente capacitado sabe que a posição assumida pelas partes, muitas vezes, é só a ponta do iceberg, existindo quase sempre uma história que levou os envolvidos a chegarem naquela situação”, comenta o advogado.
Para Sampaio, a mediação é um mercado em franca expansão no Brasil, sendo vista pelos profissionais como uma saída para aliviar parte da alta demanda do Poder Judiciário. No entanto, é importante que os advogados se especializem para não acabarem agravando ou anulando as questões. “Ainda há muita confusão envolvendo o conceito, o que acaba acarretando em procedimentos mal executados que se parecem mais com uma conciliação do que propriamente com mediação”, afirma.
Direito ambiental
De olho nas pautas de sustentabilidade, o direito ambiental é a área que protege o meio ambiente do impacto das ações humanas. Por meio de mecanismos legais de defesa, os profissionais garantem a tutela de áreas de preservação, bem como o cumprimento de leis e metas que visem a preservação da natureza.
“Muitos acreditam que essa área do direito é feita para barrar o desenvolvimento econômico. Na verdade, é o contrário. Está na Constituição que o bem mais tutelado é a vida. Logo, se não garantirmos um meio ambiente ecologicamente equilibrado para todos, teremos sérios problemas para sobreviver”, afirma Alessandro Azzoni, advogado e membro da comissão de direito ambiental da OAB-SP.
Neste mercado, é possível atuar em duas frentes: prevenção ou punição. A primeira diz respeito ao emplacamento de medidas que controlem as mudanças climáticas e o uso de recursos naturais. Já a segunda se refere a casos de descumprimento de tais ordens, onde inicia-se um inquérito criminal contra a empresa ou pessoa.
Além disso, um dos principais braços do direito ambiental é o ESG (Ambiental, Social e Governança, em português), conjunto de critérios adotados por companhias para reduzir seus impactos sociais e ambientais. “O custo da recuperação é muito maior do que o da prevenção. Portanto, o direito ambiental tem como objetivo garantir esse equilíbrio com discussões jurídicas e legislativas que garantam a proteção do meio ambiente e o desenvolvimento econômico”, diz Azzoni.
Dessa forma, os advogados da área podem encontrar oportunidades tanto em órgãos regulatórios quanto em consultorias para empresas. Segundo o especialista, o avanço da economia verde e de pactos ambientais demonstram que o tema continuará gerando demanda nas próximas décadas.
Fonte: forbes.com.br