Por @agnaldobastosadvocacia | Em 2014, foi aprovada no Brasil a Lei de Cotas, que determina que 20% das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos e empregos públicos sejam destinadas a pretos e pardos.
A lei faz parte de uma política de inclusão que vem se desenvolvendo no Brasil, que visa compensar uma realidade histórica de exclusão de pessoas pretas ou pardas de cargos historicamente ocupados por brancos.
A lei faz parte de uma política de inclusão que vem se desenvolvendo no Brasil, que visa compensar uma realidade histórica de exclusão de pessoas pretas ou pardas de cargos historicamente ocupados por brancos.
Até porque essa exclusão tem origem na forte escravidão negra do início da história do país.
Assim, a lei pretende garantir a ocupação desses cargos por pretos e pardos de modo a reequilibrar o padrão socioeconômico de todas as pessoas.
Porém, na prática, a aplicação das normas trazidas pela lei são bastante complexas. Isso porque a cor de uma pessoa não é algo muito objetivo.
É preciso admitir que preto ou pardo, além de serem cores de pele, são expressões de raça e, portanto, podem ser determinadas de várias formas em uma pessoa.
No entanto, a lei determina que o critério para concorrer às vagas destinadas às cotas raciais é a simples autodeclaração. Contudo, a candidatura pode ser anulada se for identificada fraude.
Assista ao vídeo abaixo para entender como funcionam as cotas raciais em concursos públicos. Em seguida, vamos entender sobre a autodeclaração.
A autodeclaração nas cotas raciais de concursos públicos
A autodeclaração nada mais é do que o ato de o próprio candidato, no momento de preencher sua ficha de inscrição, declarar que é preto ou parto. Assim, já pode concorrer às vagas reservadas para cotas raciais.
Portanto, não é preciso comprovação de sua cor para concorrer às cotas raciais. Basta que a pessoa que se entenda preta ou parda, marque essa alternativa no documento e já estará concorrendo às vagas.
Em um primeiro momento, essa “falta de fiscalização” pode soar um tanto negligente.
No entanto, o processo ocorre dessa forma justamente porque provar que a pessoa é de uma cor ou não é uma questão muito sensível.
Dessa forma, essa comprovação só ocorrerá quando houver suspeita ou denúncia de fraude.
Nesse caso, a autodeclaração visa ampliar a política de inclusão, na medida em que permite qualquer pessoa que se identifique racialmente com as cores preta ou parda possa pleitear seus direitos.
Baseando-se em uma visão de si mesmo e, portanto, das eventuais injustiças sociais que já tenha sentido em razão disso.
Sendo assim, a eventual anulação não visa, em um primeiro momento, perseguir pessoas que não se enquadrem em critérios objetivos do que é uma pessoa preta ou parda.
Mas apenas evitar que a ideologia por trás da política de inclusão seja distorcida e, assim, que pessoas que não sofram as consequências da desigualdade sejam beneficiadas de modo indevido.
Processo de anulação com direito a contraditório e ampla defesa
Após a autodeclaração, só haverá fiscalização da real condição do candidato se, primeiramente, ele for aprovado e, além disso, se houver suspeita de fraude.Nesse sentido, a Lei de Cotas traz a hipótese de anulação da candidatura quando houver fraude. Veja:
“Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis”.
Portanto, é importante observar que a lei fala em constatação de declaração falsa.
Isso significa que a mera suspeita de fraude jamais levará à anulação da candidatura ou do resultado.
Para isso ocorrer, é preciso que a organização do concurso verifique se, de fato, houve falsidade na declaração.
Sendo assim, se há constatação de declaração falsa, necessariamente há um processo de apuração de falsidade, sobre o qual o candidato deverá ter acesso, com direito a contraditório e ampla defesa.
E é justamente isso que traz a segunda parte do artigo que comentei acima da Lei de Cotas.
A lei fala em “procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e ampla defesa”.
Nesse caso, você deve entender que jamais haverá anulação da candidatura sem poder se manifestar sobre a questão antes do resultado final.
O contraditório e a ampla defesa são princípios constitucionais para garantia do direito de defesa.
Assim, qualquer procedimento administrativo ou judicial deve dar chances para que ambas as partes, em igualdade, possam defender suas razões.
Como faço para provar que sou negro ou pardo nas cotas de concurso?
Não é necessário provar desde o primeiro momento que você é negro ou pardo para concorrer as vagas destinadas às cotas raciais no concurso público. Para isso, basta se autodeclarar preto ou pardo no momento da candidatura.
Contudo, se houver suspeita de fraude na autodeclaração, a anulação da candidatura ensejará um processo administrativo, em que você terá total direito à defesa, para demonstrar que não houve fraude e, assim, que você se entende de fato como uma pessoa preta ou parda.
Nesse momento, talvez você precise comprovar que é uma pessoa preta ou parda na acepção da Lei, e faz jus às cotas raciais, pois se enquadra nos fatores socioeconômicos que ensejam a criação da política de inclusão.
De início, é importante ter em mente que a cota não é para todas as pessoas economicamente hipossuficientes, mas apenas para pessoas pretas e pardas.
O fato de eventualmente experimentar desigualdades sociais não significa que você já tenha experimentado o racismo, o que se busca reverter com essa política especificamente.
Assim, o meio mais óbvio de comprovar sua inclusão nas cotas raciais é apresentando uma foto, se for evidente que você é preto ou pardo. Ou, ainda, se apresentando pessoalmente se uma foto não for suficiente.
Contudo, a questão da raça pode ser mais subjetiva para algumas pessoas. Filhos brancos de pais negros com certeza têm mais identificação nesse sentido.
Nesse caso, se as características fenotípicas das raças preta ou parda estiverem presentes, então você pode alegar pertencer à raça, pois pode sofrer os preconceitos decorrentes disso.
Por fim, se você for filho de pais pretos ou pardos, mas for branco, ou de qualquer outra raça, e não possuir nenhum traço fenotípico, muito provavelmente não estará de fato incluído na política de cotas.
Isso porque, apesar de poder ver de perto as adversidades que o racismo gera, isso não está impresso em seu corpo e, portanto, sua inclusão pela política não é uma prioridade.
Assim, durante o processo administrativo que será conduzido para apurar fraude na autodeclaração, será possível suscitar todas essas questões.
Além disso, você deve estar disposto a defender seu posicionamento, para haver de fato a inclusão racial e para que o processo não afaste candidatos que se entendem pretos e pardos por medo da anulação.
Agnaldo Bastos, advogado especialista em ajudar candidatos de concursos públicos que sofrem injustiças e, também, servidores públicos perante atos ilegais praticados pela Administração Pública, atuando em Processo Administrativo Disciplinar (PAD) e em Ações de Ato de Improbidade Administrativa.
Agnaldo Bastos, advogado especialista em ajudar candidatos de concursos públicos que sofrem injustiças e, também, servidores públicos perante atos ilegais praticados pela Administração Pública, atuando em Processo Administrativo Disciplinar (PAD) e em Ações de Ato de Improbidade Administrativa.
Fonte: concursos.adv.br