De acordo com o levantamento disponibilizado pela OAB, o Tribunal de Ética e Disciplina (TED) abriu procedimentos internos disciplinares para todos os sete advogados. Mas como nenhum deles foi concluído nomes e detalhes sobre os envolvidos não podem ser divulgados. Até então, todos os procedimentos permanecem em trâmite e por isso não houve nenhuma punição máxima, que se trata da exclusão ou perda permanente do direito à advogar, nesses casos devido à ligação com organização criminosa.
Apesar da Ordem não mencionar quem foram e os prazos exatos da suspensão de cada um, a reportagem levantou informações sobre sete advogados que tiveram seus nomes expostos nos últimos anos por condutas relacionadas às facções. São eles: Alberto Lucas Nogueira Lima, Elisângela Maria Mororó, Rafael Paulino Neto, Lucas Arruda Rolim, Alaor Patrício Júnior, Samya Brilhante Lima, e o fato mais recente envolvendo o suspeito Júlio César Costa e Silva Barbosa.
Investigações da Polícia Civil mostram que parte dos advogados chegaram a ajudar na ação de fuga de detentos encarcerados nas unidades prisionais em Itaitinga.
O QUE DIZ A OAB
O diretor de Prerrogativas da OAB-CE, Márcio Vítor de Albuquerque, especifica que foram dois casos registrados em 2019, três em 2020, e dois em 2021. Segundo Márcio Vítor, quando um advogado comete alguma infração disciplinar, é obrigação da Ordem apurar na seara administrativa e, se ficar percebido um possível crime, o Tribunal de Ética e Disciplina entra em ação.
"O próprio estatuto da OAB prevê sanções, como censura, suspensão, multas, e a pior medida, a exclusão do advogado. Podemos dizer que nesses casos em específico inicialmente houve uma suspensão cautelar de 90 dias, e em alguns até mesmo prorrogação dos prazos. Alguns respondendo ao processo tiveram direito cautelarmente a advogar, mas os processos ainda podem findar em uma exclusão. Tudo isso demanda uma apuração", disse o diretor.
30 MIL ADVOGADOS NA ATIVA NO CEARÁ
O número mostra que, se comparado ao todo, casos de representantes jurídicos que se aliam às facções são raros.
BILHETES APREENDIDOS
Na última semana, Júlio César Costa e Silva Barbosa foi detido em flagrante na Unidade de Segurança Máxima do Ceará, em Aquiraz. Ele teria entregue um bilhete ao detento Paulo Henrique Oliveira dos Santos, 31, o ´Sassá´, que é apontado pelas autoridades como um dos chefes no Ceará de uma organização criminosa carioca. A reportagem apurou que na saída do atendimento ao detento, o advogado se recusou a mostrar o papel.
Conforme o próprio advogado, ele vinha exercendo função de informar aos presos o que estava acontecendo no 'mundo do crime' do lado de fora do cárcere. Um dos bilhetes tinha mensagem sobre um território dominado pela organização. Em troca de repassar a informação, o advogado recebia R$ 300 a cada encontro, contou Paulo Henrique aos policiais. Júlio segue preso até então.
Consta nos autos que o advogado tentou esconder o bilhete na saída da unidade prisionalEste não foi o primeiro flagrante de um advogado em posse de bilhetes após visita a um 'cliente' em presídio no Estado. No ano de 2019, Alaor Patrício Júnior foi preso em flagrante em um episódio similar. Alaor, também advogado, tinha quase 30 papeis nos bolsos e espalhado pelo corpo.
Todo o material foi recolhido e passou por perícia, precisamente um exame grafotécnico. Após análise, a Polícia Civil do Ceará disse que eles apresentam conteúdos com "menções de cunho criminoso com referências a organizações criminosas, tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo, ameaça, auxílio para fuga de presos".
Alaor foi solto apesar do parecer do Ministério Público do Ceará (MPCE) a favor da continuidade da prisão devido ao flagrante. Meses depois ele foi novamente preso e transferido ao Sistema Penitenciário do Ceará. O advogado admitiu a posse dos bilhetes e disse nos autos que foi forçado a entregar as mensagens, mas não poderia informar a identidade de quem o ameaçou.
OUTROS CASOS
Ainda no ano de 2019, a Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas (Draco) instaurou inquérito para apurar conduta dos advogados Alberto Lucas Nogueira Lima, Elisângela Maria Mororó, Rafael Paulino Neto e Lucas Arruda Rolim.
À época, o delegado titular Harley Filho disse que Alberto e Elisângela seriam cúmplices de um plano que visava ajudar na fuga de líderes de uma facção criminosa. Alberto Lucas era responsável por passar para detentos os detalhes do plano. Ambos levavam vida luxuosa em Recife.
Em outro núcleo estava o advogado Rafael Paulino. Para a Draco, Paulino era responsável por levar e trazer ordens de dentro do presídio. Consta nos autos do processo contra ele um relatório com diálogos mostrando Rafael na condição de membro da parte logística de uma facção carioca. Ele foi solto em março de 2020, para ficar monitorado com tornozeleira eletrônica.
Já sobre Lucas Arruda Rolim, o delegado Harley Filho disse que ele passou a ser investigado pela Draco após a prisão de uma mulher, em Maracanaú. Identificada como Claudiana, ela foi capturada com um quilo de cocaína e artefatos explosivos.
"Na análise do celular da Claudiana, nós identificamos um diálogo mantido entre ela e o advogado Lucas Rolim, em que ele indagava sobre um veículo para a fuga de um dos presos que era cliente dele. Durante o cumprimento de um mandado de busca, encontramos diversos bilhetes feitos à mão. Casou perfeitamente com o resultado da extração do celular da mulher. Ficou evidenciado que ele tinha a função de articular o interesse dos presos e repassar para o mundo externo", afirmou o investigador.
"Nós não aceitamos que haja uma mácula generalizada em desfavor da advocacia criminal. Nas unidades penitenciárias, centenas de advogados estão indo semanalmente trabalhar. Agora, se há o desvio de uma situação bem isolada, como o caso que houve nessa semana, a OAB, a Justiça, a Polícia devem apurar." - MÁRCIO VITOR ALBUQUERQUE - Diretor de Prerrogativas da OAB
Por fim, outro episódio com repercussão envolve o nome da advogada Samya Brilhante. Ela foi presa já em 2021, em Santa Catarina. A mulher é suspeita de integrar uma organização criminosa no Ceará e teria função, conforme a PC, de mensageira de chefes de facções criminosas presos para outros membros dos grupos. Ela nega pertencer a qualquer grupo criminoso.
Samya ainda em passagens pela Polícia pelos crimes de receptação e é suspeita de acessar, de forma fraudulenta, processos judiciais que se encontram em segredo de Justiça. Segundo o delegado Wilson Camelo, atualmente na Delegacia de Combate às Ações Criminosas Organizadas (Draco), a advogada ia "para dentro dos presídios conversar com as lideranças das facções e trazer orientações para os criminosos em liberdade, inclusive relacionadas a quem iria assumir determinados pontos de tráfico de drogas".
Fonte: Diário do Nordeste