'Sensação de que mulher não tem direito ao espaço público': entenda o que é importunação sexual, veja como denunciar e leia relatos

Via @portalg1 | Desrespeitar, invadir a privacidade, provocar medo e até ferir para simplesmente satisfazer um desejo sexual. As vítimas que, na maior parte dos casos registrados, são mulheres, convivem com o medo diário de sofrerem atos libidinosos, sem consentimento, na rua, no trabalho, em festas, em meios de transporte e até em casa.

A pauta de importunação sexual é antiga, mas o crime foi tipificado apenas no final de 2018, incluindo ainda a divulgação de cena de estupro, de cena de sexo ou de pornografia.

De 2019 até setembro deste ano, no Paraná, foram distribuídos 2.340 processos envolvendo esse tipo de crime, de acordo com o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR).

Encontrar alguém que tenha passado por alguma situação de constrangimento é comum. Na terça-feira (28), um homem foi preso por suspeita de ter passado a mão em uma ciclista enquanto ela pedalava, em Palmas, na região sul do Paraná. Andressa Rosa Lustosa ficou ferida após cair na rua.

"É horrível, né?! Porque a gente tem a sensação, assim, de que a mulher não tem direito ao espaço público, de que a mulher não tem direito de pegar a sua bicicleta ou sair a pé ou, enfim, fazer o que ela quiser na rua", conta uma vítima, a jornalista Mayara Godoy.

Contudo, diante de falta de provas e até mesmo vergonha em denunciar, muitas vítimas se calam e convivem com o trauma.

Mais do que se privar de ir a certos lugares sozinhas, por precaução, várias mulheres também evitam usar certas roupas ou usam roupas mais largas, semelhantes às vestimentas masculinas, para tentar evitar toques inapropriados, olhares e falas maliciosas.

Veja alguns relatos anônimos, enviados à RPC:

"O assédio acontece diariamente e em todo lugar. Fui assediada no transporte público, já ficaram por trás encostando o órgão genital em mim, apalparam minhas nádegas. Foi a situação mais humilhante que vivi."

"Várias vezes fui pedalar com roupa masculina e cabelo escondido, por medo. Hoje só pedalo sozinha se for em lugar com muita gente e evito ao máximo sair sozinha."

"Já fui roubada, assediada verbalmente, já ouvi comentários não solicitados. Sou ciclista há três anos, e o meu namorado pedala há mais de dez e ele nunca passou por nada disso."

Quem também compartilha desse sentimento de receio e, com isso, deixa de fazer o que gosta é a cozinheira Natali Lara.

"Eu parei de correr faz um mês porque eu não consigo sair na rua porque buzinam, mexem, falam. É totalmente frustrante você não ter a liberdade de poder caminhar perto da sua casa".

A servidora pública Franciele Brangy revela que até para escolher um esporte para praticar, a preocupação é diferente quando se trata de uma mulher.

"Eu decidi fazer como um esporte no dia a dia a natação porque é em um ambiente fechado, seguro, eu me sinto melhor assim", diz.

Mayara Godoy, Franciele Brangy e Natali Lara 

O crime importunação sexual

De acordo com a promotora do Ministério Público do Paraná (MP-PR), Symara Motter, a importunação sexual foi tipificada como crime em 2018, após protestos contra o caso de um homem que ejaculou no pescoço de uma passageira do transporte público, teve a prisão relaxada e dias depois voltou a importunar outra mulher dentro do ônibus, se masturbando próximo a uma vítima.

"Esse tipo de conduta em que não havia uma violência física ou uma grave ameaça era considerada uma contravenção penal, que resultava apenas em multa na maior parte das vezes. Depois disso, foi tipificado como crime, com previsão de pena em regime fechado", afirmou.

De acordo o Código Penal, se enquadram no crime todas as situações em que há um ato libidinoso praticado contra alguém, sem a autorização da vítima, a fim de satisfazer desejo próprio ou de terceiro.

"São atos revestidos de uma conotação sexual. Se um homem se masturba para constranger uma mulher, se esfrega nela, passa a mão, mesmo que não seja em um ambiente público, é crime de importunação sexual", afirma a promotora.

Segundo ela, depois que a importunação sexual virou crime, houve um avanço no entendimento da gravidade deste tipo de constrangimento.

"Estamos conseguindo fazer com que mais pessoas entendam que este tipo de constrangimento não é natural. Encoxada, passada de mão ou alguma situação como essa, mesmo sem contato, é crime. É algo que vêm de uma cultura machista, que trata a mulher como objeto. Mas é preciso mudar. As vítimas estão mais cientes dos seus direitos e as autoridades também passaram a compreender melhor isso".

As punições

A advogada Vanessa Picouto explica que até antes de 2018, a importunação sexual era uma contravenção penal punida somente com multa.

"Hoje é punida com reclusão de 1 a 5 anos de prisão. Em geral o agressor tem uma posição superior, hierárquica em relação a vítima", pontua ela.

Vanessa esclarece que quando a ação do agressor se estende para um estupro, uma conjunção carnal ou ato libidinoso mediante violência e ameaça, o Código Penal prevê punição de 6 a 10 anos.

"Quando a vítima é vulnerável vai até 12 anos de prisão. Se desse ato houver a morte da vítima, então, pode chegar a uma pena até de 30 anos".

Como denunciar?

O Paraná possui uma série de canais de denúncia para registro da violência contra mulher. Eles atendem os mais variados tipos de crimes e também oferecem acompanhamento especializado para cada situação. Confira, abaixo, a função de cada serviço e como entrar em contato.

Central de Atendimento à Mulher – 180

A Central de Atendimento à Mulher recebe denúncias de violência, orienta mulheres sobre seus direitos e faz o encaminhamento para outros serviços quando necessário. O serviço funciona 24 horas por dia, todos os dias da semana.

É possível ter acesso ao atendimento por meio de uma ligação gratuita para o número 180, por meio de um e-mail para ligue180@mdh.gov.br, pelo aplicativo Proteja Brasil ou no site da ouvidoria.

Patrulha Maria da Penha – 153

A Patrulha Maria da Penha protege, monitora e acompanha mulheres que receberam da Justiça as medidas protetivas de urgência. Vítima ou testemunhas de qualquer descumprimento das medidas protetivas podem acionar o serviço.

A Patrulha Maria da Penha está disponível nas seguintes cidades e por meio dos seguintes telefones:

• Arapongas - 153

• Araucária - 153

• Cascavel - 153

• Curitiba - 153

• Foz do Iguaçu - 153

• Londrina - 153

• Maringá - 153

• Ponta Grossa - 153

• Sarandi - 153

• São José dos Pinhais - 153

• Toledo - 190

Boletins de Ocorrência Online da Polícia Civil

A Polícia Civil do Paraná permite o registro Boletins de Ocorrência on-line para crimes de lesão corporal (violência doméstica), ameaça, injúria, calúnia, difamação e contravenção cometidos contra mulher, nos termos da Lei Maria da Penha, ou seja, no ambiente doméstico e familiar.

Para registrar a denúncia online basta acessar o site. A Polícia Civil reforça que para registro do B.O por meio do link é preciso ter mais de 18 anos e o caso deve ter ocorrido dentro do Paraná.

A PCPR orienta que se o crime está acontecendo no momento ou ocorreu há pouco, a vítima deve acionar a Polícia Militar pelo telefone 190 ou comparecer presencialmente a uma Delegacia da Polícia Civil do Paraná.

Casa da Mulher Brasileira

Em Curitiba, a prefeitura oferece o serviço da Casa da Mulher Brasileira. No local, mulheres vítimas de violência encontram serviço de acolhimento e apoio psicossocial, com assistentes sociais e psicólogas.

O serviço também oferece programas voltados à autonomia econômica das mulheres e brinquedoteca. No mesmo endereço também estão localizadas a Delegacia da Mulher, a Defensoria Pública, o Juizado de Violência Doméstica e Familiar, o Ministério Público, a Patrulha Maria da Penha.

O atendimento é exclusivo para mulheres residentes de Curitiba, na Avenida Paraná, 870, no Cabral. Os telefones para contato são: (41) 3221-2701 e (41) 3221-2710.

Delegacia da Mulher

As Delegacias de Defesa da Mulher atendem mulheres vítimas de violência doméstica, familiar ou sexual. As delegacias estão presentes em vinte municípios do Paraná.

Disque Denúncia Mulher

Mulheres vítimas de violência virtual podem buscar ajuda do Disque Denúncia Mulher por meio do telefone (41) 3210-2531.

Os crimes virtuais incluem a divulgação de imagens íntimas em sites e redes sociais sem o consentimento da vítima, a ameaça de divulgação de imagens íntimas para extorsão financeira e perseguição online (stalking).

O serviço oferece orientação de como as vítimas devem proceder, onde devem buscar ajuda e oferta atendimento psicológico às mulheres vítimas destes crimes. O Disque Denúncia Mulher orienta que a vítima de crime virtual deve salvar arquivos, e-mails, capturas de tela ou qualquer outra evidência para denúncia.

Centro de Referência de Atendimento da Mulher – CRAM

O Centro de Referência de Atendimento à Mulher (Cram) é um espaço que presta acolhimento e atendimento humanizado às mulheres em situação de violência. São oferecidos atendimento psicológico, atendimento social, orientação e encaminhamento jurídico necessários à superação da situação de violência.

Para buscar apoio basta entrar em contato por telefone ou ir presencialmente em uma das unidades.

Disque Direitos Humanos - 100

Atende situações graves de violações dos direitos humanos que acabaram de ocorrer ou que ainda estão em curso. O serviço aciona os órgãos competentes a cada situação e busca possibilitar o flagrante.

Para entrar em contato basta ligar para o número 100. O serviço funciona 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados.

Fonte: G1 PR

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