Condenado, mas em liberdade; veja a pena aplicada ao diretor de clínica onde mulheres eram abusadas

Via @diariodonordeste | O diretor de uma clínica de reabilitação onde um grupo de mulheres relataram ter sofrido abusos sexuais, maus-tratos e cárcere privado voltou à liberdade. A Justiça proferiu sentença para Fábio Luna dos Santos. Ele foi condenado pelo crime de cárcere privado e absolvido da acusação de maus-tratos. A decisão do último dia 21 de janeiro de 2022 ainda inocentou por completo a mãe do denunciado que, conforme as vítimas, agia como comparsa dele no cometimento dos crimes.

A pena definitiva para Fábio neste processo é de dois anos, 11 meses e 18 dias de reclusão. No entanto, ele já está solto. O magistrado considerou que o réu é primário, tem conduta social favorável e justificou o crime como tentativa de proteger as vítimas de acidentes e agressões quando em surto psicótico.

Segue em andamento no Judiciário a ação penal que trata dos crimes sexuais supostamente praticados pelo diretor na Casa de Acolhimento Água Viva, na cidade do Crato.

Vítimas que passaram meses internadas no abrigo contaram à reportagem do Diário do Nordeste ter sofrido abusos em diversas ocasiões. "Passava a mão no meu corpo, segurava minha perna, tocava nas partes íntimas por cima das roupas", disse uma delas. Agora, com a notícia da liberdade de Fábio, elas temem sofrer represálias e se dizem "desprotegidas pelo Estado".

VULNERABILIDADE

Conforme o Ministério Público do Ceará (MPCE), em agosto de 2021 policiais encontraram no prédio 34 mulheres com idades de 30 a 91 anos, em situação de extrema vulnerabilidade, sendo a maioria com alguma enfermidade mental. O local contava com "quartos minúsculos que mais pareciam celas e com grades, sem banheiro".

A acusação apontou que as vítimas faziam as necessidades fisiológicas em baldes e eram obrigadas a permanecerem trancadas durante a noite, além da presença de cachorros que ali estavam para evitar a fuga das internas.

A chegada das autoridades ao abrigo só foi possível por meio de uma frase revelada no pedaço de papel que culminou em uma investigação da Polícia Civil do Ceará. Elizângela (nome fictício) conseguiu que o papel com pedido de socorro chegasse à irmã e a família relatou o caso à Delegacia da Mulher e a um médico psiquiatra.

No bilhete entregue pela mulher em cárcere, ela pede que a tirem do local com urgência / Foto: Arquivo Pessoal

A delegada Kamila Brito, titular da Delegacia de Defesa da Mulher de Crato (DDM) chegou a mencionar que a cena encontrada no local causou impacto e comoção: "as condições eram sub humanas, ainda mais para pessoas com deficiência mental. Elas tinham até mesmo o cabelo cortado contra vontade própria. São relatos absurdos e tristes".

À época do flagrante, a policial acrescentou que, em depoimento, Fábio Luna teria dito aos investigadores que trancafiar as pacientes era normal, e que ele fazia aquilo para segurança das mulheres, para que elas não cometessem suicídio. Já sobre os crimes sexuais, Fábio negou à Polícia ser autor dos atos.

O diretor também teria dito aos policiais civis que as internadas tinham a libido alta e que ele era assediado todos os dias, porque "acreditavam serem casadas com ele".

O QUE A DEFESA ALEGOU

Os advogados que representam o sentenciado e a mãe dele no caso alegaram a fragilidade das declarações das vítimas e que a doença mental que as acometem poderia provocar falsas percepções da realidade. "Os réus defendem que as declarações das vítimas não restaram confirmadas por outros elementos de prova, como também não se tem certeza da veracidade de suas afirmações diante da enfermidade mental que as acomete", segundo trecho da defesa.

A Justiça decidiu que pelos depoimentos colhidos não prosperava a denúncia contra Margarida Maria Luna, mãe do diretor, porque ela não tinha gerência na Casa de Acolhimento Água Viva. "Todavia, em relação ao crime de cárcere privado, a prova se mostrou farta e robusta em face apenas do acusado", porque as declarações das ofendidas foram coerentes e corroboradas pelos depoimentos colhidos com os policiais que participaram das diligências.

Consta nos autos que as vítimas chegaram a ser levadas a igrejas da cidade na tentativa de vincular o que Fábio fazia a um discurso religioso de proteção, como forma de manutenção da dominação das vítimas. Quando familiares questionavam se havia algo de errado acontecendo, a desculpa era que não se tratava de um problema de saúde, mas sim algo espiritual.

A reportagem entrou em contato com a defesa de Fábio Luna, que se posicionou por meio de uma nota conjunta: "A defesa técnica do Sr. Fábio Luna dos Santos, em respeito ao segredo de justiça aplicado a este feito, se limita a dizer que essa primeira sentença representa um forte indicativo da fragilidade que permeia a pretensão acusatória construída neste caso, uma vez que as provas produzidas na instrução processual conduziram à absolvição do nosso cliente em relação a um dos crimes imputados".

Ainda conforme os advogados Reno Feitosa Gondim, José Fontenele Lopes Júnior e Antônia Danielly Araújo dos Santos, "no que concerne à condenação subsistente, a defesa técnica demonstrará seu inconformismo através da via recursal cabível, pois entendemos que tal pretensão também não deve prosperar".

Fonte: Diário do Nordeste

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