De acordo com o relator, em nome dos ensinamentos bíblicos, o esposo e a líder religiosa de um templo cristão utilizavam os preceitos da fé como justificativa para violentar física e psicologicamente a vítima. Os atos tiveram início logo após o casamento, em fevereiro de 2014, quando a vítima teve de ser levada a uma unidade de saúde para cuidados médicos.
Consta ainda que a violência doméstica foi tão expressiva que o esposo da vítima perdeu o cargo, recém-empossado à época do fato, em âmbito administrativo por decisão dos membros do CNMP.
Segundo o voto do relator, desembargador Francisco Borges, durante o casamento arranjado pela tia e pastora, a vítima de 19 anos abandonou o curso de odontologia e, por mais de 5 meses, padeceu de diversas torturas. O ex-procurador e a líder religiosa agrediam a jovem com tapas no rosto, surras de cinto, de cipó, não a alimentavam e a obrigavam a dormir no chão. De acordo com os autos, tais castigos eram para a vítima se tornar uma esposa obediente ao esposo, à deus e às doutrinas da congregação. Além disso, as surras praticadas pela pastora tinham o consentimento do ex-procurador e, às vezes, ocorriam na presença dele.
Ainda de acordo com o voto, por quase tudo que a jovem fazia ou falava era castigada, e submetida a tratamento degradante. Os abusos aconteciam dentro da igreja, onde o casal congregava, morava e que também foi utilizada como cárcere da jovem. O sofrimento só acabou quando ela, mesmo debilitada, conseguiu fugir, num momento de descuido da pastora. Depois de passar a noite ao relento, a vítima foi socorrida por uma pessoa desconhecida que a acolheu e pediu ajuda a uma advogada, a qual realizou o primeiro encaminhamento do caso para as autoridades até culminar com a proteção e liberdade da ofendida.
Para o relator, a vítima tinha a pastora como uma referência de vida, porém, após o seu casamento, veio a decepção, uma vez que foi a pessoa que a acusava, punia, humilhava, entre outros, sob alegação de a vítima não seguir seus ensinamentos, assim como os bíblicos.
"A religião foi usada como forma de violência de gênero e de subjugação, a despeito dos verdadeiros ensinamentos bíblicos que apregoam a não-violência. A tristeza e revolta se instalou na vítima diante do comportamento do réu, já que era agredida fisicamente e destratada para demonstrar à comunidade que estavam tomando atitude ante o comportamento que, segundo eles, não se ajustava à doutrina e não era coerente com o papel de esposa na palavra de deus, e por isso deveria ser punida com surras e maus tratos."
A decisão manteve a acusação pelos crimes de lesão corporal e cárcere privado com pena de dois anos e seis meses de reclusão e um ano e quatro meses de detenção, respectivamente, em regime aberto.
O Tribunal não divulgou o número do processo.
Informações: TJ/RO
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Fonte: migalhas.com.br