Essa possibilidade foi conferida pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, que na quarta-feira (14/9) fixou tese em recursos repetitivos admitindo a remição ficta (hipotética) da pena para aqueles que se viram prejudicados a partir de março de 2020.
A remição da pena por estudo ou trabalho está prevista no artigo 126 da Lei de Execução Penal (Lei 7.210/1984), cujos parágrafos trazem critérios para contagem do tempo a ser descontado da reprimenda final.
Ao interpretar a norma, a jurisprudência do STJ sempre concluiu que o fato de o Estado não proporcionar meios para os apenas trabalharem ou estudarem não é suficiente para conferir a eles remição ficta da pena.
Relator do repetitivo, o ministro Ribeiro Dantas propôs um distinguishing (distinção) para o caso em que o Estado não pôde proporcionar meios de trabalho ou estudo unicamente em razão da crise sanitária decorrente da Covid-19.
Para ele, negar aos presos que já trabalhavam ou estudavam antes da epidemia o direito de continuar a remir sua pena se revelaria injusto, com base no princípio da individualização da pena, da isonomia, da fraternidade e da dignidade da pessoa humana.
Aplicou, ainda, a teoria da derrotabilidade da lei, segundo a qual a aplicação de uma norma pode ser negada sempre que uma exceção relevante se apresentar, mesmo quando presentes todas as condições para sua aplicabilidade.
"O princípio da dignidade da pessoa, com o princípio da isonomia e da fraternidade, não permitem negar aos indivíduos que tiveram seus trabalhos ou estudos interrompidos pela superveniência da pandemia o direito de remitir parte da pena tão somente por estar privados de liberdade", afirmou o ministro Ribeiro Dantas.
O voto recomenda que a concessão da remição de pena na epidemia seja feita a partir do exame de cada caso e só aplicável àqueles que, antes da crise sanitária, já cumpriam as atividades previstas no artigo 126 da LEP.
"Não se está a conferir uma espécie de remição ficta pura e simplesmente ante impossibilidade material de trabalhar ou estudar. O benefício não deve ser direcionado a todo e qualquer preso, mas somente àqueles que já estavam trabalhando ou estudando e, em razão da Covid-19, viram-se impossibilitados de continuar com suas atividades", concluiu.
Tese aprovada
Nada obstante a interpretação restritiva que deve ser conferida ao artigo 126, parágrafo 4º da LEP, os princípios da individualização da pena, da dignidade da pessoa humana, da isonomia e da fraternidade, ao lado da teoria da derrotabilidade da norma e da situação excepcionalíssima da pandemia da Covid-19 impõem o cômputo do período de restrições sanitárias como de efetivo estudo ou trabalho em favor dos presos que já estavam trabalhando ou estudando e se viram impossibilitados de continuar seus afazeres unicamente em razão do estado pandêmico.
REsp 1.953.607
Por Danilo Vital
Fonte: ConJur