De acordo com os autos, durante uma sessão do Tribunal do Júri, a promotora disse “palhaço é o senhor” ao advogado do réu, que usava um capacete de moto em plenário. Os advogados entraram com a queixa-crime pedindo a condenação da promotora pelo crime de injúria, com indenização por danos morais de R$ 20 mil para cada um.
O relator, desembargador Torres de Carvalho, disse que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é no sentido de que os delitos contra a honra reclamam, para a configuração penal, o elemento subjetivo consistente no dolo de ofender na modalidade de “dolo específico”. O magistrado não verificou dolo na conduta da promotora.
“Não se extrai das declarações da querelada o dolo específico de ofender a honra dos querelantes. A ação penal cuidava do homicídio qualificado de uma policial militar em um ponto de ônibus, à noite, por um motociclista que se aproximou e atirou em seguida, evadindo-se depois. Durante a oitiva da única testemunha presencial, o advogado, ao que parece, estaria utilizando um capacete de motociclista”, disse.
Para o relator, o áudio da sessão no Tribunal do Júri demonstra que as partes estavam em “franca discussão e debate”, e que a fala da promotora teve como contexto fatos ocorridos durante o próprio julgamento: o uso de um capacete de motociclista pelo advogado durante a oitiva da testemunha, “fato não usual”.
“A menção a ‘palhaço’ parece ser uma retorsão a igual palavra ou palavra parecida dita pelo advogado [as falas do advogado são ininteligíveis na gravação] e não foram ditas como uma ofensa à pessoa do advogado, uma injúria pessoal, mas como um comentário à conduta do profissional e externa a ele, ao fato anormal presenciado em plenário, em momento de discussão em que advogados e promotora se criticavam reciprocamente. A fala inserida na discussão, alterada e mais aquecida naquele momento, não desborda para a grave esfera criminal.”
Conforme o relator, a Lei Federal 8.625/93 prevê em seu artigo 41, V, que constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, no exercício de sua função, além de outras previstas na Lei Orgânica, gozar de inviolabilidade pelas opiniões que externar ou pelo teor de suas manifestações processuais ou procedimentos, nos limites de sua independência funcional.
“Como bem observado pelo procurador de Justiça, a suposta ofensa não excede ou ultrapassa os limites da imunidade judiciária, da qual goza a querelada durante o exercício de suas funções como promotora de Justiça. Por qualquer ângulo que se analise, o fato narrado nos autos é atípico e inexiste justa causa para o prosseguimento da ação penal, a ensejar a rejeição liminar da queixa-crime”, concluiu.
Advogados provocaram e ofenderam a promotora
Em declaração de voto, o desembargador Damião Cogan disse que os advogados é que teriam ofendido a honra da promotora, e não o contrário. Para ele, os advogados pretendiam tumultuar a sessão do júri, pois “arguiram inúmeras nulidades em plenário que já haviam sido questionadas em primeiro e segundo graus, e afastadas”.
“Era um caso muito difícil para a defesa. A prova era incontestável pela prisão em flagrante logo após, com o encontro das armas, inclusive. Então optaram os requerentes por ‘espiolhar nulidades’, e resolveram ingressar em plenário os dois advogados com capacetes de motociclista. Não era uma encenação teatral. O juiz não deveria ter deixado, já que conduta incompatível com o plenário”, afirmou.
Cogan considerou que a promotora foi provocada o tempo inteiro pelos advogados, que teriam agido com má-fé no julgamento. Assim, diante do que chamou de “aventura judiciária”, o magistrado julgou a ação improcedente com a condenação dos advogados ao pagamento de R$ 10 mil cada, a título de sucumbência. Prevaleceu, no entanto, o entendimento do relator pela rejeição da queixa, por maioria de votos.
Processo 2270992-36.2021.8.26.0000
Com informações da Conjur
Fonte: jurinews.com.br