Na mensagem, Diego diz que não contrata “gordo, petista, preto, feminista e viado”. A frase foi dita a um colega de profissão que pretendia contratar uma auxiliar negra, gorda e com cabelos curtos. A defesa afirma que a conversa foi tirada de contexto.
O material foi recebido pelo cabeleireiro Jeferson Dornelas no dia 12 de janeiro. Ele explica que alugava parte do salão de Diego, no bairro de Perdizes, na zona oeste de São Paulo, onde atendia clientes.
Jeferson pretendia contratar uma assistente negra, gorda e com cabelo curto, mas ela declinou à oferta.
Em uma conversa pelo WhatsApp, Diego teria reagido sobre o pedido de demissão da assistente. “Falei que a moça não iria trabalhar mais [porque] ela recebeu outra proposta. A resposta foi esse áudio”. Ele disse que o cabeleireiro já havia dado indícios deste comportamento, mas nunca verbalizado desta forma.
No áudio, Diego diz: “Eu coloquei uma regra ‘pra’ mim. Eu não contrato gordo, petista e não contrato preto. No caso do preto, alguns se fazem de vítima da sociedade. No caso da mulher tem duas coisas. Gorda e preta. Ela não cuida nem do próprio corpo. Como vai ter responsabilidade na vida? Essa minas que usam cabelo curto é [sic] feminista. A gente não sabe. Eu não sei. Não ‘tô’ generalizando, dizendo que todas são, mas tem uma grande probabilidade de ser feminista. Feminista é um saco, mano! Você não pode falar nada. Esqueci de falar, mano. Não contrato mais viado. Só se a pessoa estiver mentindo”.
Jeferson fez um boletim de ocorrência. “Meu psicológico está abaladíssimo. É muito triste ouvir uma coisa dessas”, afirma. Ele foi procurado por Diego pedindo um acordo sobre o caso e dizendo que estaria disposto a uma retratação.
O cabeleireiro acusado tem, ao menos, dois perfis em redes sociais com milhares de seguidores. Após a circulação dos áudios, as redes foram fechadas.
O ativista de direitos humanos Antonio Isuperio apurou e divulgou a ocorrência. Para ele, a atitude foi “criminosa e é muito simbólica, porque é o que sempre soubemos que acontece, mas nunca acreditaram em nós”. Isuperio divulgou o ocorrido e formalizou uma denúncia ao Ministério Público de São Paulo.
Jeferson Dornelas vai depor na Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância, em São Paulo.
Ele afirma que pretende, apenas, dar sequência na ação penal, sem intenção de indenização. A CNN aguarda respostas sobre o caso do Ministério Público, Polícia Civil de São Paulo.
A mulher citada na conversa é Ana Carolina Alves de Souza. Ela esteve no salão dias antes e fez um teste de trabalho com Jeferson.
Diego estava no local. Ana diz que se sentiu constrangida com “a cara que ele fazia olhando para mim, como se eu estivesse incomodando de estar no espaço dele”.
Ela afirma que soube da conversa após a repercussão na internet e que fará um boletim de ocorrência contra Diego Beserra. Ana diz que está “arrasada, triste e sem reação”. “Arrasada por ser julgada pela cor da minha pele, do meu cabelo, do meu corpo e me desmereceu como mulher”.
Segundo a lei que tipifica crimes de discriminação e preconceito de raça, atualizada em 2023, a situação pode configurar crime por “negar ou obstar emprego em empresa privada”.
O texto prevê que o juiz do caso deve considerar discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.
Também há entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a equiparação da homofobia ao crime de racismo. A pena pode variar, segundo o Código Penal, de dois a cinco anos de detenção. As mudanças na lei foram sancionadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em janeiro, no mesmo em que as mensagens de WhatsApp deste caso foram trocadas.
O que diz a defesa
A reportagem tentou contato com Diego Beserra, sem sucesso. A defesa, porém, explicou que os áudios foram retirados de contexto.
Segundo os advogados, na conversa completa, teria sido Jeferson quem começou a falar sobre a aparência e comportamento da funcionária. A equipe jurídica diz ainda que nem toda ofensa, mesmo que amoral, configura crime.
No áudio, Diego teria dividido experiências com outros funcionários no passado. Jeferson nega a versão de Diego. A defesa explica que Diego tem sido vítima de incitação ao ódio, calúnia, ameaça e difamação após a divulgação dos áudios.
Um segundo defensor explicou à reportagem que está apurando o ocorrido e que vai se manifestar após tomar ciência de todo caso.
Fonte: cnnbrasil.com.br