Formada há 25 anos em psicologia, Rosilene conta que sempre sonhou em se graduar em Direito, mas deixou o sonho de lado aos 17 anos quando passou na faculdade, porém sem condições de arcar com a mensalidade.
Anos depois, ela se formou em psicologia graças a uma bolsa de estudos. "Eu brinco que até aos 50 anos fui psicóloga e agora dos 50 aos 100 eu vou ser advogada”, ela afirma.
Rosilene relembra que brincava com Henrique, desde quando o filho era criança, que iria entrar na faculdade com ele para os dois seguirem o sonho do diploma em Direito e depois se tornarem juízes.
No dia em que o filho foi prestar o vestibular, Rosilene contou a uma funcionária da faculdade a história que gostaria de cursar Direito e foi convidada a fazer a inscrição na hora e fazer a prova.
“Era só para brincar, eu não pensava que ia passar nunca. Estou formada há 25 anos e foi uma surpresa. Ele ganhou 90% de bolsa e eu ganhei 70% de desconto, não tinha como não fazer. Eu digo que foi um presente de Deus fazer a faculdade dos dois juntos”, ela se admira.
Rosilene durante estágio da faculdade. (Foto: Arquivo Pessoal)A mãe conta que Henrique sempre se orgulhou e deu apoio a ela para seguir o sonho da segunda faculdade, porém durante dois anos Rosilene preferiu não dizer aos colegas que eram mãe e filho para que ele criasse a própria identidade e não fosse visto às sombras da mãe.
“Isso foi uma escolha minha. Como eu tinha medo que as pessoas ‘zoassem’ ele, nós nos separamos. Ele ficou em um grupo e eu em outro. Depois que descobriram que éramos mãe e filho, foi uma grande festa na turma, eu fui acolhida”, ela se recorda.
Dificuldades no caminho
A dupla começou a faculdade em 2019, antes da pandemia de Covid-19. Ela relembra que o lockdown foi uma época que exigiu muita disciplina dos dois sobre o estudo.
“Mas foi o que nos manteve com saúde mental, muitos colegas trancaram”, ela lamenta.
Sobre o preconceito etário, como aconteceu com a mulher de 40 anos que foi criticada por jovens em uma universidade no interior de São Paulo, Rosilene diz que, no caso dela, o julgamento veio de pessoas mais velhas.
“Muitos amigos diziam ‘Nossa, como você tem coragem de se expor, de carregar caderno?’ No sentido de se aposentar, vai ser avó. Já os meus colegas [da turma] diziam que queriam que os pais fizessem o mesmo”, ela assegura.
Na sala de aula, os alunos se admiravam e achavam legal que uma pessoa que tinha outra profissão queria seguir o sonho de juventude.
"Eu não aproveitei nenhuma disciplina, fiz tudo do zero porque eu queria. Eu via como a realização do sonho", conta Rosilene.
Henrique (de branco) e Rosilene (de roxo) em confraternização com colegas. (Foto: Arquivo Pessoal)A psicóloga conta que o apoio de pessoas próximas foi fundamental para que permanecesse na faculdade e pondera que, infelizmente, nem todos os adultos contam com isso e desistem devido à rotina.
“Eu fui muito bem acolhida, mas é difícil para quem já tem rotina. Nesse período eu perdi a minha mãe, se ela não tem apoio é difícil”, afirma.
Na avaliação da psicóloga, o envelhecimento no Brasil é tido como um fator desfavorável diante da sociedade, com a perda de espaço e valor.
“Quando alguém rompe com isso e diz que vai conquistar, eu imagino a pressão. As meninas eram novas, bonitas e ricas. Eu não sei qual é a situação financeira dessa mulher [que sofreu preconceito etário em SP], mas deve ser difícil”, avalia ela sobre o preconceito etário.
Planos para o futuro
Rosilene conta que sonha em ser juíza, assim como o filho, e trabalhar na área de direito trabalhista porque acredita que a população desconhece assuntos importantes do tema.
“Eu via muito essa necessidade de informação das pessoas durante o atendimento no consultório”, recorda.
Henrique já passou nas duas fases da prova da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e Rosilene vai realizar a segunda prova em breve. “Para mim é mais difícil, mas estou otimista”, ela torce.
Estudantes discriminam colega em SP
Três estudantes de biomedicina, da Unisagrado, em Bauru (SP), postaram um vídeo nas redes sociais, no início de março, em que debocham de uma colega de 40 anos e afirmam que ela deveria se aposentar.
Após a repercussão do caso, as jovens se desculparam e se desligaram da faculdade. A mulher vítima do preconceito etário disse que chorou após saber do vídeo, porém decidiu continuar na graduação. Ela foi acolhida pelos colegas de turma, que elogiaram a perseverança.
Por Thalya Godoy
Fonte: midiamax.uol.com.br