Apenas Nunes Marques e André Mendonça, ambos indicados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), se manifestaram favoráveis ao marco temporal até o momento. O tema era criticado pelo ex-mandatário.
Entenda o julgamento
• O marco temporal é uma tese jurídica que estabelece que povos indígenas só podem reivindicar as terras que ocupavam na data da promulgação da Constituição, em outubro de 1988. Os povos originários criticam a norma, afirmando que ela valida invasões e usurpações de seus territórios. Do outro lado, ruralistas defendem o marco como um mecanismo de segurança jurídica.
• Na sessão de hoje, o ministro Luiz Fux seguiu a ala contrária ao marco temporal, já composta pelo relator, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli, que votou ontem (20). Para eles, a proteção dos direitos indígenas sobre as terras independe de um marco temporal.
Indenizações ainda são debatidas
• Apesar da maioria, os ministros possuem divergências entre si sobre as indenizações que podem ser pagas a proprietários que ocuparam terras indígenas de boa-fé, ou seja, sem histórico de esbulho (usurpação) ou conflito.
• Fachin propôs que a indenização deve ser paga somente pelas benfeitorias no terreno. Moraes, por sua vez, foi além e disse que a indenização também deve alcançar a terra nua e deve ser paga previamente ao processo de demarcação.
• O voto de Moraes foi visto com preocupação por lideranças indígenas, que temem atraso nas demarcações se o pagamento da indenização for critério prévio ao processo.
• A AGU (Advocacia-Geral da União) também demonstrou temor e afirmou que os pagamentos poderiam levar a um "gasto incalculável", como mostrou o UOL.
• Cristiano Zanin, por sua vez, deu um voto semelhante ao de Moraes, mas defendendo que a indenização não deve ser vinculada à demarcação e que o pagamento não caberá somente à União, mas também aos estados e municípios que tenham promovido a titulação indevida. Toffoli acompanhou o colega.
Indicados por Bolsonaro votam a favor de marco
• Até o momento, somente André Mendonça e Nunes Marques defenderam a necessidade de um marco temporal. Ambos foram indicados por Bolsonaro, que durante sua presidência criticou a possibilidade de o STF derrubar a tese. A pressão do Planalto contribuiu para o caso ser adiado - o julgamento teve início em 2021.
• Para Nunes Marques, o marco temporal é a solução que "concilia" os interesses dos indígenas e dos proprietários de terras. Mendonça afirmou que a tese é um critério objetivo que "imuniza" riscos de conflitos e garante segurança jurídica.
"Posses posteriores à promulgação da Constituição Federal não podem ser consideradas tradicionais, porque isso implicaria o direito de expandi-las ilimitadamente para novas áreas já definitivamente incorporadas ao mercado imobiliário nacional." Nunes Marques, ministro do STF
Na contramão do STF, Senado discute PL pró-marco
• Na contramão do entendimento da maioria da Corte, a CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado começou a discutir um projeto de lei que fixa o marco temporal como critério para demarcação de terras indígenas.
• Ontem (20), a senadora Eliziane Gama (PSD-MA) pediu vista (mais tempo de análise) e os governistas assinaram coletivamente o pedido. Com isso o texto será apreciado na próxima quarta (27).
• O secretário dos Povos Indígenas, Eloy Terena, afirmou ao UOL que vê a possibilidade da proposta do Congresso cair, mesmo se aprovado.
"É uma questão que mesmo que o Congresso aprove esse projeto, ele vai, querendo ou não, ser judicializado e decidido no âmbito do STF." Eloy Terena, secretário dos Povos Indígenas
Decisão do STF terá repercussão geral
• A decisão do Supremo sobre marco temporal servirá para solucionar disputas judiciais em todas as instâncias do país. Há 226 processos parados aguardando a solução da Corte.
• O caso específico envolve uma disputa entre o governo de Santa Catarina e indígenas do povo xokleng, que reivindicam um território na região central do estado.
• Em janeiro de 2009, cerca de cem deles ocuparam uma área onde hoje está a reserva biológica do Sassafrás, uma área de proteção ambiental. O governo pediu a reintegração de posse, e obteve em primeira instância, mas a Funai recorreu, e o caso chegou ao Supremo em 2016.
Por Paulo Roberto Netto
Fonte: noticias.uol.com.br