João Victor Uchôa Sales prestou o Vestibular 2023.2 da Uece disputando às vagas reservadas aos candidatos autodeclarados pardos para o curso de Medicina do Campus de Quixeramobim. No vestibular 2024.1, o estudante se inscreveu para Ciências Biológicas.
"Mesmo após passar por três bancas, a comissão de heteroidentificação da Uece me negou como pardo para o curso de medicina, no entanto, fui considerado pardo para o curso de Ciências Biológicas na primeira banca meses depois", explica desapontado o estudante.
"Antecipando-me às pontuações pertinentes sobre o meu fenótipo, o próprio edital do certame estabelecia que seria considerado pardo pela comissão o candidato que possuísse certas características e que estas não obrigatoriamente deveriam estar associadas. Portanto, não determinava a necessidade de ter o tom de pele mais acentuado, mas sim características associadas ou não, e eu tenho", destaca.
O candidato foi foi desclassificado para o curso de medicina durante a avaliação de cotistas na Universidade Estadual do Ceará (Uece). — Foto: ReproduçãoO estudante também procurou o Ministério Público de Quixeramobim, no entanto, ele lamentou já que órgão não o deu respaldo para a sua argumentação sobre as falhas da banca da universidade.
"Além de não me ouvirem, o que tive de assistência foi um link enviado para o WhatsApp com o site do ministério. Eu estava ali como um cidadão fazendo uma denúncia de irregularidades em uma universidade pública, contudo, pessoas como eu não tenho vez, nem voz e nem atenção em um país como o nosso", lamentou.
Política de cotas étnico-raciais
A Universidade Estadual do Ceará informou ao g1 que a política de cotas étnico-raciais tem como destinatárias pessoas negras (pretas ou pardas) que, em razão de suas características fenotípicas, sofreram e sofrem discriminação e preconceito raciais que as impedem de ter acesso ao ensino superior público nas mesmas condições de pessoas brancas, o que requer ações afirmativas capazes de corrigir efeitos das desigualdades étnico-raciais, associadas a outras desigualdades sociais, como as de classe.
Universidade afirmou que "o procedimento e a comissão de heteroidentificação foram instituídos por meio da Resolução 1657/2021 do Conselho Universitário (Consu) e é nos termos desta Resolução e em respeito à lei estadual de cotas que as comissões atuam, com legitimidade para emitir parecer".
A Uece destacou que cada comissão é formada por cinco membros, atua de forma independente, avaliando objetivamente as características fenotípicas do candidato conforme descrito na resolução: “considera-se por fenótipo o conjunto de características visíveis do indivíduo, predominantemente, a cor da pele, a textura do cabelo e o formato do rosto, sobretudo do nariz e dos lábios, as quais, combinadas ou não, permitirão validar ou invalidar a condição étnico-racial afirmada pelo candidato autodeclarado negro (preto ou pardo), para fins de matrícula, de contração ou de nomeação junto à Funece/Uece”, afirmou.
E, ainda: “Não serão considerados, para os fins heteroidentificação do candidato quaisquer registros ou documentos pretéritos eventualmente apresentados, inclusive imagens e certidões referentes à confirmação em procedimentos realizados em concursos públicos federais, estaduais, distritais e municipais ou em processos seletivos de qualquer natureza”, destacou.
A instituição de ensino, por fim, lembrou que, cada vestibular ou a cada novo processo seletivo realizado pela Uece é feita tem uma nova avaliação, por uma comissão que atua de forma independente, conforme previsto na resolução.
Sobre as Comissões
Sobre as comissões, a universidade disse que elas são coordenadas pelo Núcleo de Acompanhamento da Política de Cotas Étnico-raciais (Nuapcr/Uece), órgão de assessoramento vinculado à Reitoria/Presidência da Funece/Uece.
"A comissão é preferencialmente formada por um professor, um servidor técnico-administrativo e um representante da comunidade externa, vinculados a outras instituições de ensino superior e/ou a organizações sociais, sendo, na comissão com cinco membros, incluído um representante dos estudantes e outro membro servidor da Uece (professor ou técnico-administrativo)", afirmou.
A Uece lembrou ainda que os membros, para compor as comissões, devem ter conhecimento comprovado acerca da temática de relações étnico-raciais ou ser reconhecido pela atuação em programas e em projetos que visem à igualdade étnico-racial e ao enfrentamento do racismo, devidamente capacitados por meio de cursos.
"Nos casos de não comprovação, o membro deve realizar curso de formação, oficina ou atividades organizadas e promovidas pela Uece para compreensão da temática e qualificação, conforme previsto na Resolução da Universidade", finalizou.
Por Gioras Xerez, g1 CE
Fonte: g1