Nesta segunda-feira (15/1), o artista saiu do cartório exibindo as duas vias do registro oficial que garantem esse direito no papel. Gabhi se sente confortável com o tratamento tanto pelos pronomes ele/dele como ela/dela. A reportagem usará ele/dele sem razão específica.
Eram 12h20 quando Gahbi chegou acompanhado da mãe, Vera Adelaide, ao cartório Marcelo Ribas no Venâncio Shopping. Lá, já estava a amiga Cíntia Cecílio, que atuou como advogada do caso para conseguir o direito na certidão. “Ai, gente, que nervoso”, suspirou ao ser chamado para o guichê 14. Quando saiu daquele ambiente, Gabriel Rodrigues Borges, do sexo masculino, não existia mais oficialmente; agora é Gabriel Rodrigues Lopes de Siqueira Borges, do sexo não-binário.
O ator da novela da TV Globo “Elas por Elas” já era notícia muito antes. O intérprete de Polvilho foi a primeira pessoa a conseguir, em uma ação individual na Justiça do Distrito Federal a ter o reconhecimento como sem a marcação de gênero.
“Eu queria conseguir me reconhecer no documento, oficialmente. Há um preconceito camuflado de burocracia e eu precisava passar por essa barreira”. Além da retificação de gênero, Gahbi – nome artístico – também acrescentou o sobrenome da mãe e da avó materna. “Por uma questão até de machismo, não se registrava com os nomes da mãe e eu queria ter comigo”, declarou.
Gahbi exibe nova documentação Hugo Barreto/Metrópoles @hugobarretophotoGahbi abraça documentação com novas informações Hugo Barreto/Metrópoles @hugobarretophotoGahbi saiu do cartório oficialmente como uma nova pessoa Hugo Barreto/Metrópoles @hugobarretophotoAos 35 anos, Gahbi pôde enfim se reconhecer como é em documentos Hugo Barreto/Metrópoles @hugobarretophoto“Nem todo mundo vai entender a importância de um dia como hoje; mas quantas vezes tentaram negar a nossa existência, minha e de pessoas como eu? Ter essa existência registrada burocraticamente é documentar que a gente existe como cidadão”, aponta. A ideia é que a partir da certidão, Gahbi possa alterar outros documentos, como o RG, carteira de motorista, passaporte etc.
A conquista veio em dezembro 2022, mas só foi possível mesmo ter acesso ao documento retificado agora em janeiro. É que a própria agenda de Gahbi foi puxada com estreias na TV e em filmes, todos gravados fora de Brasília.
Apoio materno
Questionada sobre o que entende sobre o gênero não-binário, a mãe de Gahbi, Vera Adelaide, disse que não entende o significado totalmente ainda. “Não é sobre entender, é sobre o que faz com que ele seja feliz, com o que ele se identifica e o que for eu apoio”, disse. “A gente tem que realizar o que tem vontade, o que vai nos fazer bem”.
Vera Adelaide foi criada em uma família tradicional de Pirenópolis, mas isso nunca foi um limitador do apoio que deu ao filho ao longo da vida. “Ele também faz apresentação como drag queen. Eu que comprava as perucas muitas vezes. Eu quero ver o meu filho feliz. Estou aqui hoje com ele porque sei a importância que é”, contou.
Gahbi recebeu o documento das mãos do atendente Rômulo Ximenes, que se emocionou ao entregar a certidão ao ator. “É uma conquista para a comunidade. Eu sou um homem gay e me emociona ver as conquistas acontecendo”, declarou.
“As pessoas muitas vezes não entendem o que significa para alguém se identificar como se reconhece”, alegou a amiga Cíntia Cecílio. Ela não advoga no momento, mas foi a advogada de Gahbi no caso e, na época, era presidente do conselho de diversidade da Ordem dos Advogados do Brasil. “É um direito particular, isso é, não impacta em nada a sua vida se o Gahbi se entende como homem, mulher, não-binário. É uma questão da vida dele”, ressaltou.
“Não é pedindo nada que as outras pessoas não tenham. Se identificar como se reconhece, casar com quem deseja não é um direito a mais. Não estamos pedindo aqui menos imposto, não, pagamos inclusive o mesmo valor e só queremos ser tratados com igualdade”, reforçou.
Como fazer
Gahbi disse que descobriu que poderia fazer a retificação na certidão de nascimento ao ver uma reportagem sobre o assunto no Rio de Janeiro.
Em setembro de 2023, uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) instituiu novos procedimentos para a alteração extrajudicial do nome civil da pessoa natural e aprimorou regras de averbação de alteração de nome e/ou gênero de pessoas transgênero
Na prática, qualquer pessoa com mais de 18 anos poderá solicitar, pessoalmente, a mudança de nome a um cartório de registro civil sem a necessidade de uma ação judicial — a solicitação por videoconferência equipara-se à presencial.
É necessário levar a certidão de nascimento, cópia do RG, CPF, comprovante de residência, certidões cível, criminal, eleitoral e de protesto, além de declaração de não haver ação judicial sobre o pedido.
Por Jade Abreu
Fonte: metropoles.com