A turma de desembargadores da 6ª Câmara Cível analisava uma ação para reparação de danos morais movida por uma jovem que denunciou ter sido assediada sexualmente pelo pastor Davi Passamani, criador da igreja A Casa. Ele já foi denunciado por situações semelhantes por três ex-membros da congregação.Pastor criador da igreja A Casa, Davi Passamani
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Pastor Davi Passamani, em prints, importuna sexualmente uma fiel
Reprodução/Redes SociaisPastor Davi Passamani, em prints, importuna sexualmente uma fiel
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Durante sua fala, em um primeiro momento, Silvânio reclamou do que chama de “caça aos homens”, o que estaria impedindo o relacionamento entre homens e mulheres.
“Essa caça às bruxas, caça aos homens. Daqui a pouco não vai ter nenhum encontro. Como você vai ter relacionamento com uma mulher, se não tiver um ‘ataque’? Vamos colocar ‘ataque’ entre aspas”, afirmou o desembargador.
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No final de sua fala, Silvânio formula uma pergunta questionando se a vítima não teria sido “muito sonsa”.
“Uma outra pergunta também que eu faço, essa moça aí, ela mesma falou que é ‘sonsa’, ela mesma usou essa expressão, que não está compreendendo a coisa. Se ela não foi muito sonsa nesse…? No século que a gente está. É outra dúvida”.
Silvânio indeferiu o pedido da vítima, mas pediu vistas do processo para análise, podendo mudar seu voto na próxima sessão, que acontece na manhã desta terça-feira (26/3). O placar entre os outros desembargadores está empatado (2 a 2) e a decisão final vai depender de Silvânio mudar seu voto.
“Racismo virou modismo”
Ainda no mesmo julgamento, o desembargador Jeová Sardinha (à direita na foto), que também discordava da vítima no caso, reclamou do que chamou de modismo em relação a denúncias de assédio sexual e racismo.
“Eu, particularmente, tenho uma preocupação muito séria com o tal do assédio moral – como gênero sexual, como espécie do gênero – e racismo. Então, esses dois temas viraram modismos. Não é à toa, não é brincadeira, que estão sendo usados e explorados com muita frequência”.
Jeová Sardinha segue dizendo que a interpretação sobre assédio e racismo é subjetiva e diz que é “um pouco cético com essas questões”.
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Falas inaceitáveis
O caso julgado em que as falas dos desembargadores foram feitas é sobre um pedido de indenização para instituições que acolhem mulheres vítimas de violências, e não sobre o assédio da vítima em si. O processo do assédio na área criminal dessa denunciante foi arquivado por falta de provas.
A advogada da jovem, Taísa Steter, defendeu que as falas dos desembargadores são inaceitáveis e que os magistrados têm o dever de afastar suas crenças no momento do julgamento.
“Enquanto advogada, espero que haja uma análise séria quanto às provas do processo. Enquanto mulher, espero que as falas dos desembargadores sejam corrigidas, já que o contexto misógino contribui pela intimidação de outras vítimas que ainda estão no anonimato”, afirmou.
A presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB, Fabíola Ariadne, lembrou que existe um protocolo para julgamento com perspectiva de gênero e que deve ser observado em todos os tribunais, desde março de 2023.
“Esse protocolo traz uma série de orientações para evitar a reprodução de preconceitos e estereótipos no Judiciário, inclusive nos casos de assédio. Muita mulheres deixam de procurar a justiça, justamente por medo de serem revitimizadas, de se verem julgadas como vítimas em detrimento de seus algozes”.
Julgamento complexo
Procurado pelo Metrópoles, o desembargador Silvânio afirmou que durante o julgamento, que considera complexo, levantou hipóteses para explorar a verdade real do processo e garantir que todos os lados sejam analisados.
“Esclareço que fiz questionamentos na busca do amadurecimento e da compreensão integral do caso em questão. Minha abordagem, ao levantar hipóteses e situações hipotéticas, tem como objetivo explorar a verdade real do processo, garantindo que nenhum aspecto seja negligenciado de ambos os lados”.
Já o desembargador Jeová Sardinha disse que sua fala durante o julgamento foi com o objetivo de enfatizar uma análise cuidadosa e contextual de cada caso de racismo e assédio, mas que não falava a respeito do caso específico da denúncia contra o pastor.
“Antes de tudo quero falar que reconheço a seriedade e a prevalência do machismo e do racismo em nossa sociedade. Minha intenção, naquele contexto, ao abordar temas delicados como assédio e racismo, foi enfatizar a importância de uma análise cuidadosa e contextual de cada caso, para evitar julgamentos precipitados e erros. Entendo que a escolha de minhas palavras ditas no calor de voto verbal, até com erros de vernáculo, não dizem respeito ao caso concreto”, afirmou Sardinha.
Mais de uma vítima
Davi Passamani foi denunciado pelo Ministério Público no caso de outra vítima, em 2020, e houve a suspensão condicional da pena, por ser uma pena de menos de dois anos e por não ser reincidente. Já em 2023, o pastor foi denunciado por uma terceira vítima e o caso está em fase de inquérito.
No começo deste ano, a ex-esposa de Davi abriu uma ação contra ele por estar sendo perseguida pela internet e presencialmente, durante o processo de separação do casal. O judiciário concedeu medida protetiva para ela e a filha. Em dezembro do ano passado, Passamani deixou a A Casa e fundou uma nova congregação chamada A Porta.
Em nota, o advogado Leandro Silva, que representa o pastor Davi Passamani, informou que as acusações contra ele são falsas e disse que tudo é uma conspiração para tirá-lo da direção da igreja.
“A defesa do pastor Davi Passamani declara que todas as acusações formalizadas ou veiculadas na mídia são falsas e provará que tudo é fruto de uma conspiração para destituí-lo da direção da Igreja Casa e apropriação de seu patrimônio. Em breve, tudo será esclarecido”.
Por Thalys Alcântara
Fonte: metropoles.com