Internação involuntária passa a valer em Florianópolis a partir desta terça (5)

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Via @ndmais | Nesta terça-feira (5), entra em vigor a internação involuntária de pessoas em situação de rua em Florianópolis. Além da lei, o prefeito Topázio Neto (PSD) sancionou o decreto de regulamentação, que estabelece diretrizes para a aplicação da nova legislação.

Embora tenha sido assinada nesta segunda-feira (4), a medida só passa a valer a partir de terça-feira, pois é necessário que a ação seja primeiro registrada no Diário Oficial do Município, que é publicado ao final de cada dia.

Conforme a prefeitura, a internação será utilizada em situações em que pessoas coloquem em risco sua própria vida ou a de terceiros.

O poder público argumenta que, diante do aumento de casos de violência em Florianópolis envolvendo pessoas em situação de rua, a prefeitura avança em seu programa, que já oferecia serviços de alimentação, abrigo, higiene, apoio psicológico, saúde e capacitação para o mercado de trabalho.

“Precisamos separar quem precisa de ajuda e está disposto a recebê-la, quem precisa de intervenção policial e, agora, quem necessita de auxílio mas não tem consciência disso, pois já não consegue se auto-regular. A lei destina-se precisamente a esse último grupo”, afirmou o prefeito Topázio Neto.

O decreto que regulamenta a lei estabelece a formação de uma equipe multidisciplinar composta por profissionais da Assistência Social, Guarda Municipal e Secretaria de Saúde. Preferencialmente, a Assistência Social encaminhará a pessoa para os serviços de saúde, indicando a necessidade de internação.

Entretanto, em casos extremos de surto e violência, a Guarda Municipal poderá realizar o encaminhamento. No serviço de saúde, os profissionais irão determinar a necessidade do tratamento.

Topázio critica opositores

Topázio também criticou opositores que falam em higienização:

“higienizar pessoas é deixar elas no relento, morando na chuva, no frio, como está acontecendo. Não é possível que alguém seja contra que tiremos essas pessoas da rua e buscamos dar dignidade”, diz.

O que diz a lei de internação involuntária

A lei prevê oferecer cuidados médicos e apoio multidisciplinar às pessoas em situação de rua, especialmente aquelas afetadas pela dependência química ou transtornos mentais. O objetivo é ajudá-las a se recuperarem completamente e se reintegrarem à sociedade e à família.

O texto declara que o sucesso da iniciativa depende do compromisso da saúde pública do Município e, em particular, da Secretaria de Assistência Social.

A colaboração é essencial para uma implementação eficaz, em linha com os princípios do SUAS (Sistema Único de Assistência Social) e do SUS (Sistema Único de Saúde).

Para onde as pessoas serão encaminhadas?

A Prefeitura de Florianópolis justificou que não faria a divulgação para garantir a segurança dos pacientes.

A quem se destina a lei?

O projeto de lei se aplica a todos os cidadãos em situação de rua em Florianópolis que se enquadrem em algumas condições específicas, como dependência química, vulnerabilidade social ou incapacidade de tomar decisões devido a transtornos mentais.

Questionada, a prefeitura respondeu que quem vai definir os critérios anteriores serão os próprios médicos do município.

“A internação deve ser autorizada por um médico registrado no Conselho Regional de Medicina. Nos casos de internação involuntária, deve-se comunicar ao Ministério Público e a Defensoria Pública dentro de 72 horas”, descreve o projeto de lei.

Qual a definição de internação para a prefeitura?

Para a prefeitura, a internação humanizada é aquela realizada com humanidade e respeito, visando beneficiar a saúde do paciente e promover sua recuperação e reintegração social, podendo ser realizada com ou sem o consentimento da pessoa.

Durante a internação, os pacientes serão atendidos por uma equipe multiprofissional, respeitando suas particularidades e necessidades individuais.

O tratamento inclui aspectos psicossociais, físicos, nutricionais, integrativos e intelectuais.

A Prefeitura de Florianópolis deve oferecer atendimento intersetorial durante o período de internação, mediado pelas Secretarias Municipais de Saúde, Assistência Social e Educação, visando preparar o paciente para a reintegração na sociedade, mercado de trabalho e convívio familiar.

Para os pacientes que se recuperarem e voltarem ao convívio social, a municipalidade poderá oferecer o benefício de desacolhimento por tempo determinado, vinculado exclusivamente ao paciente.

O Município também será responsável por desenvolver programas profissionalizantes para inserir os indivíduos reabilitados no mercado de trabalho.

As despesas da internação involuntária em Florianópolis

As despesas resultantes da execução serão cobertas pelo orçamento do Município, com autorização para remanejamento ou suplementação pelo Poder Executivo Municipal, que também é responsável por regulamentar a Lei conforme necessário.

Quanto ao transporte, os pacientes serão acolhidos, identificados e recolhidos por uma equipe multiprofissional, conforme informado pela Prefeitura.

Em relação ao custo final para a implantação do projeto, a Prefeitura de Florianópolis afirmou não ter essa resposta, pois depende da aprovação do projeto.

Lei Antimanicomial

Pressionado pelo Movimento da Luta Antimanicomial e inspirado na experiência italiana, o Brasil editou a Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001, mais conhecida como Lei Antimanicomial ou Lei da Reforma Psiquiátrica.

Uma das diretrizes é a reformulação das políticas de atenção à saúde mental mediante a transferência do foco do tratamento, que antes se concentrava na instituição hospitalar, para uma rede de atenção psicossocial estruturada em unidades de serviços comunitários e abertos.

Desde 2001, todo e qualquer atendimento em saúde mental deve necessariamente obedecer à Lei Antimanicomial, estatuto que traz profunda mudança paradigmática e que resgata a pessoa com transtorno mental como sujeito de direitos.

A Lei 10.216 também fez do lema do Movimento Antimanicomial um princípio normativo orientador de toda a política de atenção à saúde mental no Brasil.

Imagem mostra o IPQ (Instituto Psiquiátrico de Santa Catarina) – Foto: Arquivo/Jonata Machado/NDTV

No entanto, a internação psiquiátrica é também um dispositivo previsto nesta mesma Lei como um recurso terapêutico lícito, embora seja de caráter excepcional. Ainda de acordo com a legislação, a internação deve acontecer preferencialmente de forma voluntária.

Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, a utilização da internação para tratamento da dependência química ou do uso abusivo de drogas sofreu alterações significativas com a modificação na Lei de Drogas em 2019, por meio da Lei nº 13.840, de 5 de junho daquele ano.

Algumas das principais alterações contempladas com essas mudanças na lei incluem a necessidade de ordenar o tratamento em uma rede de atenção à saúde, com preferência para modalidades ambulatoriais, e a definição de dois tipos de internação: voluntária e involuntária.

A internação compulsória foi deliberadamente excluída como opção legal para o tratamento de usuários ou dependentes químicos.

É importante destacar que a internação involuntária só pode ser realizada em unidades de saúde ou hospitais gerais, com equipes multidisciplinares, e deve ser autorizada por médico registrado no Conselho Regional de Medicina.

Além disso, foi estabelecido um prazo máximo de 90 dias para essa modalidade de internação, sem possibilidade de prorrogação.

Defensorias são contra projeto da prefeitura

As defensorias públicas da União (DPU) e a de Santa Catarina recomendaram em 9 de fevereiro a suspensão do projeto de lei, com base na reforma psiquiátrica existente desde 2001, que adota a internação involuntária como medida excepcional. Na ocasião, a prefeitura disse que analisava a recomendação.

Segundo as defensorias, as medidas propostas pela Prefeitura de Florianópolis violam a legislação federal por instituir internações sem esgotar os recursos extra-hospitalares e sem oferecer tratamento integral ambulatorial em meio aberto.

As defensorias ainda explicam que é necessário capacitar os profissionais de saúde para lidar com as especificidades dessa população e promover a integração entre os serviços de saúde e assistência social. A ausência de diálogo e cooperação entre esses sistemas prejudica o atendimento integral à população de rua.

Por Ana Schoeller
Fonte: ndmais.com.br

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