"A gente leva a criança para escola achando que a criança vai estudar, que vai estar segura e, ao final, olha o que acontece", lamentou o pai de Carlos, Julisses Fleming, de 42 anos, que trabalha como porteiro e manobrista.
O adolescente morreu depois de sofrer três paradas cardiorrespiratórias na última terça-feira (16), enquanto estava internado no Hospital Santa Casa de Santos.
Quem era Carlos?
Foto: Arquivo Pessoal |
Carlos Teixeira completou 13 anos no dia 7 de abril, ou seja, dois dias antes das agressões na escola. Ele estava no 6º ano do Ensino Fundamental da Escola Estadual Professor Júlio Pardo Couto. Julisses afirmou à equipe de reportagem que o filho era um menino saudável.
Colegas pulam sobre as costas do estudante
De acordo com o pai do jovem, o filho relatou que estava de costas para a dupla e conversando com outro colega. De repente, segundo ele, os adolescentes pularam sobre o filho. "Eles não estavam conversando e brincando [entre eles]".
Adolescente conta agressão para os pais
Imagens obtidas pelo g1 mostram Carlos contando aos pais sobre a agressão. No vídeo, é possível ver um breve diálogo entre o pai do menino e o filho. Na conversa, o adolescente aparece chorando e dizendo que sente dores nas costas ao respirar.
"Carlinhos, quem foi?", perguntou o pai.
"O [nome do colega]", respondeu o menino.
"Que série?", questionou o pai.
O menino respondeu.
"Ele pulou em cima de tu?", indagou o pai.
"É", disse o adolescente.
"Te machucou e está com falta de ar?", retrucou o pai.
"Eu estou. Quando eu respiro, dói as costas", disse o menino.
"E tu nem estava brincando com ele?", perguntou o pai.
"Não", finalizou o menino.
Morte
A agressão aconteceu no último dia 9 de abril e, de acordo com o pai, no mesmo dia o adolescente reclamou de dores nas costas e falta de ar. Julisses disse que levou o filho à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Praia Grande ao menos três vezes na semana, onde o filho era medicado e, em seguida, liberado.
Os sintomas do adolescente se intensificaram na segunda-feira (15) e o pai decidiu levá-lo à UPA Central de Santos (SP), onde ele precisou ser internado e entubado. Na terça-feira (16), ele foi transferido para Santa Casa de Santos e morreu após três paradas cardiorrespiratórias.
Causa da morte
Declaração de óbito de adolescente em Praia Grande (SP) traz como causa da morte uma broncopneumonia bilateral — Foto: Reprodução |
Julisses afirmou que os médicos disseram que a suspeita era de que a causa da morte seria uma infecção no pulmão. Em nota, a Santa Casa de Santos confirmou a transferência da UPA Central, mas disse não ter autorização para dar mais informações sobre o caso.
A Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP) afirmou que o caso foi registrado como morte suspeita e é investigado pelo 1º Distrito Policial (DP) de Praia Grande. O corpo de Carlos passou por necropsia -- procedimento médico que examina a causa da morte -- nesta quinta-feira (18).
O g1 teve acesso à declaração de óbito que vai servir como base para o atestado, que leva de 30 a 90 dias para ficar pronto. No documento, a causa da morte consta como broncopneumonia bilateral, um tipo de inflamação nos alvéolos, estruturas dos nossos pulmões responsáveis pela troca de oxigênio com o sangue.
Especialistas explicam
A pedido do g1, os médicos clínicos Carlos Machado e Marcelo Bechara analisaram o caso com base nas próprias experiências profissionais e nas informações passadas pela equipe de reportagem. Ambos afirmaram que o excesso de peso nas costas pode ter levado a um trauma -- lesões causadas por um evento traumático externo ao corpo e que acontece de forma inesperada.
De acordo com Carlos Machado, o trauma pode ter sido uma fratura ou esmagamento da vértebra na coluna cervical, torácica e até na costela.
"Se ele estiver com uma dessas lesões, [...] podia estar furando o pulmão, o que dificulta a respiração e, respirando menos, faz com que tenha secreção acumulada, que é uma infecção pulmonar", afirmou o profissional.
Marcelo Bechara acrescentou que, pelo mesmo motivo, ocorre uma parada cardiorrespiratória. "O excesso de peso nas costas podem ter levado a um trauma que pode levar a um pneumotórax [...], [quando] o pulmão não consegue ventilar e uma hora chega a parada cardíaca mesmo", disse ele.
Bullying
Carlos sofria bullying com frequência e já tinha sido agredido em outras oportunidades dentro da escola estadual. Segundo Julisses, toda vez que o filho relatava uma agressão, ele comparecia na escola. No entanto, nenhuma atitude era tomada por parte da direção.
O pai do menino contou que chegou a solicitar uma reunião de pais, mas não teve retorno. Desta forma, ele diz que chegou a dar um spray de pimenta para o filho conseguir fugir dos agressores. “Mas não adiantou. [...] Estou destruído”, afirmou Julisses.
Imagens mostram outra agressão
Um vídeo mostra um dos episódios em que o garoto foi vítima dentro da unidade escolar. Em nota, a Secretaria de Educação do Governo de São Paulo (Seduc-SP) informou que as imagens foram gravadas no dia 19 de março, ou seja, três semanas antes de Carlos morrer.
"A Pasta repudia toda e qualquer forma de agressão e de incitação à violência dentro ou fora das escolas. Na época, ao tomar ciência do caso apresentado, a gestão escolar acionou Conselho Tutelar e os responsáveis do aluno. Também registrou o ocorrido no aplicativo do Conviva".
Prefeitura e Secretaria da Educação
A Seduc afirmou que lamenta profundamente o falecimento do estudante. "A Diretoria de Ensino de São Vicente instaurou uma apuração preliminar interna do caso e colabora com as autoridades nas investigações".
A Prefeitura de Praia Grande disse que lamenta profundamente a ocorrência com o aluno e se solidariza com os familiares e amigos do jovem.
A administração municipal afirmou que solicitou junto à secretaria de Estado uma apuração completa dos fatos, já que a unidade de ensino é estadual. A pasta explicou ainda que também já está analisando todos os procedimentos adotados no atendimento efetuado no pronto-socorro da Cidade.
Protesto
Morte de adolescente agredido pelas costas em escola gera protesto
Um grupo se reuniu em frente à Escola Estadual Professor Júlio Pardo Couto na quinta-feira (18) para pedir Justiça no caso de Carlos. As imagens mostram dezenas de pessoas gritando "Justiça". Uma mulher, que não foi identificada, disse o seguinte: "Hoje tem uma mãe chorando. Amanhã pode ser eu".
Também é possível ver equipes da Polícia Militar (PM) e da Ronda Ostensiva Municipal (Romu) fazendo uma barreira em frente à unidade de ensino. A PM informou ao g1 que a viatura da ronda escolar pediu apoio de outras equipes da corporação e da Guarda Civil Municipal (GCM), por volta das 16h11.
Velório
O corpo de Carlos foi liberado pelo IML na quinta-feira (18) após passar por uma necropsia. A previsão é de que o velório e o sepultamento aconteça nesta sexta-feira (19) no cemitério de Praia Grande.
Fonte: g1