O coronel, que morreu em 2015, é apontado no relatório final da Comissão Nacional da Verdade como um dos responsáveis por crimes cometidos durante a ditadura militar.
Inicialmente, a 27ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte tinha invalidado a demissão por justa causa do trabalhador, condenando o hospital a pagar os valores decorrentes da dispensa imotivada.
A instituição, no entanto, recorreu da sentença, argumentando que a conduta do empregado ofendeu o Código de Ética interno – que proíbe propaganda política e uso de camisa com "questões religiosas e/ou partidárias" – e configurou ato de insubordinação.
Além disso, o hospital alegou que o homem promoveu apologia ao ex-coronel, ligado a atos de tortura, falta grave o suficiente para quebrar a confiança necessária à continuidade do vínculo de trabalho.
Já o empregado afirmou que tinha mais de 12 anos de casa e não havia sido advertido antes da demissão. Disse também que usou a camisa "sem qualquer intenção de fazer propaganda ou política".
Apologia à tortura
A Primeira Turma do TRT-MG decidiu acolher o recurso do hospital e modificou a sentença de primeira instância, reconhecendo a validade da justa causa.
A desembargadora Adriana Goulart de Sena Orsini, relatora do caso, concluiu que o trabalhador praticou apologia à tortura e à figura de torturador e atentou contra a ordem democrática. Ela ainda considerou o contexto em que o fato ocorreu – dezembro de 2022, após o fim das eleições, quando o país registrava manifestações pedindo intervenção militar.
"Se é possível elencar um direito constitucional absoluto, este, com certeza, é o direto de não ser torturado, razão pela qual a apologia à tortura deve ser censurada e penalizada, não se tratando do mero exercício de liberdade de expressão”, destacou a relatora.
Atualmente, o processo aguarda decisão de admissibilidade do recurso de revista, um tipo de recurso exclusivo do direito do trabalho.
Quem era Ustra
Carlos Alberto Brilhante Ustra, coronel reformado e ex-comandante do DOI-Codi-SP entre 1970 e 1974 — Foto: Sérgio Lima/FolhapressO coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra foi chefe do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do II Exército, em São Paulo, órgão de repressão durante a ditadura militar.
Entre 29 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974, período em que o coronel esteve à frente do DOI-Codi, foram registradas ao menos 45 mortes e desaparecimentos forçados, de acordo com o relatório elaborado pela Comissão Nacional da Verdade.
Ustra também foi o primeiro militar brasileiro a responder por um processo de tortura cometida durante a ditadura.
"Mantenho a justa causa aplicada pelo fato de o trabalhador estar usando uma camisa do Ustra e fazendo uma apologia a um torturador e à tortura, o que inegavelmente representa afronta ao princípio-fundamento basilar da CR/88, qual seja a dignidade da pessoa humana, além de representar grave afronta ao próprio Estado Democrático de Direito, configurando inegável prejuízo a toda a coletividade”, concluiu a desembargadora Adriana Goulart de Sena Orsini.
Por Rafaela Mansur
Fonte: g1