A pensão, depois dos 21 anos, é garantida para filhas mulheres de militares. O processo quer esclarecer se vale também para filhas nascidas homens e que fizeram a transição de gênero.
Nesta primeira etapa, o tribunal não vai discutir se o pagamento da pensão nesse caso é legal ou não.
O que é discutido neste primeiro momento é se uma futura decisão dos ministros no caso terá repercussão geral. Ou seja: se vai gerar uma súmula a ser seguida por tribunais de todas instâncias em situações semelhantes.
O julgamento começou nesta sexta-feira (12), no plenário virtual, ambiente eletrônico de deliberações. Está previsto para acabar no dia 19 de abril, se não houver pedido de vista (mais tempo de análise) ou de destaque (leva o caso para julgamento presencial)
O caso específico que gerou o julgamento
Os ministros analisam uma disputa judicial envolvendo uma mulher transexual, filha de um militar da Marinha, que morreu em 1998.
A pensão do pai foi concedida quando ela quando era menor de idade, aos 11 anos. Até então, sua documentação tinha o nome anterior, no sexo masculino. Em 2008, após 21, o benefício foi encerrado.
Posteriormente, ela obteve uma decisão da Justiça que permitiu a mudança do nome e dos documentos, para adequá-los à sua identidade de gênero.
O processo neste sentido tinha sido apresentado em 2012. Até então, a única via para obter a mudança era judicial. A decisão do Supremo, que permitiu a mudança no registro civil para transgêneros em cartório, só ocorreu em 2018.
O pedido para manter o pagamento foi negado nas instâncias inferiores da Justiça, sob o argumento de que, na época da morte do pai - o que gerou o direito à pensão - ela não havia alterado o seu registro civil.
O caso chegou ao Supremo após o recurso da defesa da filha do militar, que argumentou que a negativa do direito afeta princípios constitucionais, como a dignidade da pessoa humana, igualdade e a promoção do bem de todos, sem preconceito e discriminação.
Para os advogados, a pensão deveria ser assegurada a todas as filhas maiores solteiras, independentemente do momento em que o Poder Público passou a reconhecê-la como pessoa do gênero feminino.
O que está em discussão
O processo debate a seguinte questão: para receber uma pensão de militar na condição de filha maior solteira, uma mulher trans deve ter feito a mudança do registro civil antes de ter direito ao benefício?
Para o presidente Luís Roberto Barroso, relator do caso, a questão envolve os impactos da mudança dos documentos de pessoas trans sobre o exercício de direitos.
"A discussão diz respeito aos efeitos do ato de alteração de registro civil sobre direitos da personalidade e sobre o acesso a direito social. Trata-se de matéria que transcende os interesses específicos das partes deste processo, alcançando a definição da extensão da proteção constitucional da seguridade social às pessoas transexuais", afirmou.
Plenário virtual
Neste primeiro momento, os ministros vão discutir se a questão colocada no processo tem relação com as previsões da Constituição. Se houver maioria nessa linha, em um segundo momento o caso vai a julgamento, em data a ser marcada.
Barroso concluiu que o tema deve ser analisado pelo Supremo, a partir do que prevê a Constituição. Além disso, pontuou que há diferentes entendimentos sobre a questão em julgamentos nas instâncias inferiores.
"A existência de interpretações diversas sobre os efeitos e a natureza do ato de alteração de registro por pessoas transexuais para fins previdenciários evidencia a relevância jurídica da controvérsia. Mais além, o conflito potencial entre, de um lado, a segurança jurídica e, de outro lado, a tutela do direito à igualdade e ao direito ao reconhecimento dos transexuais, demonstra a natureza constitucional da questão submetida ao Supremo Tribunal Federal. Trata-se de matéria com repercussão geral, sob todos os pontos de vista (econômico, político, social e jurídico), em razão da relevância e transcendência dos direitos envolvidos", pontuou.
Por Fernanda Vivas
Fonte: g1