O voto da maioria, em Garland v. Cargill, se fundamentou basicamente em dois argumentos. Um deles afirma que o departamento de Álcool, Tabaco, Armas de Fogo e Explosivos (ATF — Alcohol Tobacco, Firearms and Explosives) excedeu sua autoridade ao banir, por determinação de Trump, o dispositivo — o que só caberia ao Congresso fazer.
A outra argumentação, que tomou a maior parte do voto, se baseou em questões puramente técnicas. O relator do voto, ministro Clarence Thomas, se dedicou a explicar a diferença entre um fuzil semiautomático, equipado com bump stock, e uma metralhadora.
A discussão que se desenrolou entre o voto da maioria e o da minoria — este relatado pela ministra Sonia Sotomayor — é importante porque a Lei das Armas de Fogo (Firearms Act), de 1986, criminalizou a posse de metralhadoras por civis.
National Firearms Act
O voto da maioria se refere à National Firearms Act de 1934, que definiu metralhadora como “qualquer arma que dispara, é projetada para disparar ou pode ser prontamente restaurada para disparar automaticamente mais de um tiro, sem recarga manual, por uma única função do gatilho”.
Algumas cortes definiram “uma única função do gatilho” como um único acionamento do gatilho. O voto dissidente diz que isso é o que acontece com um fuzil semiautomático, equipado com bump stocks: basta o atirador acionar o gatilho uma única vez e mantê-lo pressionado, que a arma dispara rapidamente uma grande quantidade de tiros — tal como uma metralhadora.
“Qualquer um que atire com um fuzil AR-15, equipado com bump stocks, pode disparar a uma taxa de 400 a 800 tiros por minuto, com um único acionamento do gatilho”, escreveu a ministra. “E, portanto, tal arma pode ser equiparada a uma metralhadora”.
A ministra citou o poeta James Riley para sustentar seu argumento: “Quando vejo uma ave que caminha como um pato, nada como um pato e grasna como um pato, eu chamo essa ave de pato”.
O voto da minoria afirma que a decisão da maioria pode ter sérias consequências em um país em que seguidos massacres têm ocorrido nas escolas, supermercados, cinemas e shows musicais.
Lembra que o ex-presidente Donald Trump decidiu banir bump stocks depois do massacre de Las Vegas, em 2017. O atirador equipou 12 fuzis semiautomáticos com bump stocks e, de uma janela de hotel, abriu fogo contra o público de um festival de música country, matando 58 pessoas e ferindo mais de 500, em questão de minutos.
Por João Ozorio de Melo
Fonte: ConJur