A decisão, da 8ª Vara de Família de Fortaleza, considerou que “a presença do nome paterno rememora o sentimento de abandono sofrido, mantendo a mulher ligada a um completo estranho que não tem significado em sua vida, exceto pelo nome no documento”.
A mulher solicitou uma segunda via do documento pois estava em processo de mudança para outro país. Quando recebeu o documento, ela foi surpreendida com a inclusão do nome do genitor e dos supostos avós paternos. A medida, inclusive, alterou o nome que ela já usava em outros documentos com a inclusão do sobrenome paterno.
Ao questionar o cartório, ela foi informada sobre a existência de uma escritura pública de reconhecimento de paternidade, tendo sido gerada uma nova certidão. Na época, o homem (suposto pai) declarou que convivia em união estável com a mãe dela. Assim, ela ingressou na Justiça pedindo a retirada do sobrenome.
Falta de vínculo
A mulher disse que, ao longo de sua vida, ignorou a existência de tal reconhecimento e cresceu sem referência paterna, destacando que o suposto pai nunca exerceu o dever de sustento, ou prestou assistência moral e educacional.
Ela ressaltou ainda que não possui nenhum vínculo socioafetivo com ele, bem como sempre utilizou o nome sem referência ao genitor. Além disso, a mãe dela afirmou que ele não é o pai biológico.
Ela também argumentou que enfrentaria transtornos na vida civil caso passasse a usar o sobrenome paterno, pois precisaria alterar o próprio nome e da filha menor em todos os documentos já emitidos, além de inviabilizar o plano de morar no exterior com sua família.
Decisão judicial
Após diversas tentativas, o suposto genitor não foi encontrado para que pudesse se manifestar no caso, conforme o TJCE. Ao julgar o processo, a juíza Suyane Macedo de Lucena, titular da 8ª Vara de Família da Capital, destacou que a escritura pública foi lavrada quando a mulher contava com mais de três anos de idade e sem referência ao consentimento materno quanto ao reconhecimento, o que era admitido na vigência do Código Civil de 1916, sendo compreensível que as duas ignorassem a existência do documento.
A magistrada entendeu que, no caso examinado, “pouco importa a origem da paternidade impugnada, se biológica ou registral (seja por afetividade ou por erro quanto à inexistência do vínculo sanguíneo). Imprescindível, contudo, verificar se o abandono afetivo enseja a sua exclusão”.
A juíza acrescentou que manter uma filiação que a mulher “não reconhece e que nunca ocorreu no contexto fático iria de encontro à sua dignidade como pessoa, porquanto afronta sua personalidade e sua identidade construídas […] sem uma figura paterna presente, sentenciando-a ao constrangimento eterno ao rememorá-la da dor do abandono sempre que se fizesse necessário utilizar seus documentos pessoais ou de sua filha, na medida que ali constaria um pai que, na prática, a promovente nunca conheceu”.
Fonte: g1