Segundo registros do governo federal, desde o final do ano passado, a Murano Construções recebeu cerca de R$ 1,4 milhão e há outros R$ 906 mil que já estão empenhados, quando a autoridade pública se compromete com o pagamento. Foram indicados R$ 273.177,18 para emendas de 2022; R$ 1.741.244,29 de 2023 e outros R$ 288.366,00 neste ano.
As quantias foram apontadas, principalmente, pelas bancadas parlamentares do Distrito Federal e de Goiás. Os valores são referentes à realização de obras em instituições de ensino federais, administradas pelo Ministério da Educação, e instalações das Forças Armadas. Na capital do país, as ações ocorreram no Plano Piloto e em Planaltina. Outros municípios goianos também foram contemplados.
Vale ressaltar que os dados oficiais mostram as empresas que figuram como favorecidas finais das ordens bancárias emitidas pela União, ou seja, são os nomes de quem o pagamento foi efetivado. Na imensa maioria das vezes, as pessoas jurídicas sequer aparecem nos espelhos das emendas parlamentares. Assim, as companhias são os recebedores finais dos valores, que quase sempre são intermediados por um órgão público.
Denúncia do MPF
Na acusação apresentada pelo Ministério Público Federal (MPF), o governador do Acre, Gladson Cameli, e mais 12 pessoas foram denunciadas por uma série de crimes relacionados a irregularidades em licitação e na execução de contrato com a empresa privada do DF.
Iniciadas em 2019, as práticas ilícitas teriam causado prejuízos de mais de R$ 16 milhões aos cofres públicos. O MPF falava inicialmente em prejuízo superior a R$ 11 milhões, mas notas técnicas da Controladoria-Geral da União (CGU) indicaram que os danos seriam ainda maiores.
A denúncia decorre de possíveis fraudes na contratação da Murano Construções LTDA. e na respectiva licitação para a realização de obras de engenharia viária e edificação, pelas quais a empresa teria recebido R$ 18 milhões. As supostas irregularidades nesse contrato foram apuradas no contexto de uma investigação mais ampla, denominada Operação Ptolomeu.
A Murano foi contratada graças a um mecanismo chamado “adesão à ata”, quando um órgão contrata empresa aproveitando licitação realizada por outro órgão público, vinculada coincidentemente a uma instituição de ensino federal de Goiás para a prestação de “serviços comuns de engenharia referentes à manutenção predial”.
No Acre, a empresa venceu com a ata de registro de preço, e a Secretaria de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do Estado aderiu ao documento, contratando a construtora para executar obras rodoviárias. A Murano, no entanto, não teria executado o serviço, e subcontratou outras firmas, uma delas que tem como sócio um irmão do governador.
Segundo a denúncia, “aproximadamente dois terços do valor pago correspondem a objeto totalmente estranho ao contratado, em claro desvirtuamento do princípio da isonomia”. Além disso, análises técnicas da CGU incluídas na denúncia apontam suspeita de sobrepreço de R$ 8,8 milhões e de superfaturamento de R$ 2,9 milhões.
Na acusação do MPF, Gabriel Larcher de Araújo e Hudson Marcelo Amaral de Souza, donos da Murano Construções LTDA. na época dos fatos, foram denunciados pela suposta prática de lavagem de dinheiro, peculato, corrupção ativa e organização criminosa. Atualmente, apenas o primeiro deles aparece como representante da empresa.
Em dezembro de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu desmembrar a denúncia apresentada sobre suposto esquema criminoso instalado no Poder Executivo do Acre, mantendo no tribunal apenas a acusação contra o governador do estado. A denúncia contra os outros investigados, incluindo os sócios da construtora brasiliense, foi distribuída para os juízos criminais competentes, já que eles não têm foro por prerrogativa de função.
Em relação ao caso de Gladson Cameli, o STJ aceitou a denúncia e o tornou réu em maio. Apesar disso, o colegiado entendeu não ser o caso de determinar o afastamento do governador, tendo em vista que os fatos investigados, de 2019, não são atuais o bastante para justificar a medida. Contudo, segundo a relatora da ação penal, ministra Nancy Andrighi, essa decisão não impede que a necessidade do afastamento seja reavaliada nos outros inquéritos que correm contra o político.
Sobre o contrato entre o Acre e a Murano, a ministra comentou que, além da dispensa indevida de licitação, a Controladoria-Geral da União apontou indícios de que teria havido terceirização integral e subcontratação total do objeto do contrato, o que é vedado pela legislação.
A relatora também reforçou a existência de elementos indicando que, na posição de governador, Gladson Cameli teria atuado para liberar recursos para a Murano e, dessa forma, obtido favorecimento pessoal, inclusive por meio da empresa subcontratada que era controlada pelo seu irmão.
Defesa e manifestações
Procurada pelo Metrópoles, a defesa dos sócios da Murano Construções afirmou que eles ainda não são réus na Justiça do Acre.
“A defesa técnica de Gabriel Larcher de Araújo e Hudson Marcelo Amaral de Souza apresentará em juízo todos os elementos necessários para demonstrar o equívoco da acusação e confia plenamente no Poder Judiciário do Acre”, informou o escritório Almeida Castro, Castro e Turbay Advogados em nota.
A reportagem tentou contato com os advogados que representam o governador Gladson Cameli na ação judicial que corre no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Não houve retorno até o fechamento desta matéria.
Por Jonatas Martins
Fonte: metropoles.com