A votação foi presencial e todos os 31 deputados presentes votaram a favor da revogação. A lei alterava a carreira dos professores e poderia abrir espaço para o fim do ensino presencial em regiões remotas, como aldeias indígenas, comunidades quilombolas e ribeirinhas.
Desde o dia 14 de janeiro, lideranças indígenas de várias etnias ocupavam o prédio da Secretaria de Educação (Seduc), em Belém, pedindo a revogação da medida e a exoneração do atual titular da Seduc, Rossiele Soares. No entanto o acordo aprovado nesta quarta-feira não previu a exoneração do secretário.
A líder indígena Alessandra Korap Munduruku comentou sobre os próximos passos da mobilização após a revogação ser aprovada.
"Agora nós vamos para a aldeia articular, cada povo vai ter a sua articulação, quilombolas, indígenas, ribeirinhos, professores do campo. Vai ser para dizer que temos que ser ouvidos, este momento é o momento de construção da lei própria para os povos tradicionais. Lei para valorizar a educação tradicional do homem do campo, mas também o homem da floresta, os povos da floresta", avaliou.
![]() |
Indígenas comemoram em frente à Alepa — Foto: Taymã Carneiro/g1 |
Segundo apuração do g1, uma reunião fechada ocorre com lideranças da ocupação para definir o retorno dos indígenas para as comunidades. A desocupação da Seduc está prevista para ocorrer ainda esta semana.
O texto chegou à Assembleia no dia cinco de fevereiro, após assinatura de um termo de compromisso entre o governador Helder Barbalho (MDB) e representantes de povos indígenas para a revogação. Inicialmente, a votação do projeto de lei estava prevista para o dia 18 de fevereiro, mas foi adiantada extraoficialmente para esta quarta-feira (12).
Mateus Ferreira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação do Pará (Sintepp), comentou sobre o próximo passo do magistério após a revogação da lei.
"O próximo passo com a revogação é montar grupos de trabalhos para discutir o que o governo apontou, o governo aponta que as gratificações não tenham efeito cascata. Que quando reajustar o salário, as gratificações não tenham o mesmo impacto de reajuste. Esse é um ponto que a gente vai discutir. Outros pontos que a gente quer discutir, é a retomada da eleição direta para a direção de escola que não está dentro dessa lei que vai ser revogada", diz.
O presidente do Sintepp também comentou que um dos pontos a serem debatidos é a retomada das aulas suplementares, pois a revogação da Lei 10.820 permite uma brecha jurídica para o governo voltar a pagar essas aulas suplementares aos professores readaptados que estão aguardando a aposentadoria e foi retirado deles.
Manifestação iria completar 1 mês
Os manifestantes temiam que a Lei 10.820/24 resultasse na implantação de aulas gravadas, transmitidas por plataformas digitais (entenda mais abaixo). Por outro lado, o governo do Estado dizia que as aulas presenciais seriam mantidas nas comunidades indígenas.
A ocupação de quase um mês na Seduc recebeu apoio de artistas como Anitta, Alok e a atriz Dira Paes pedindo a revogação da medida. A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, esteve no estado para tentar costurar um acordo com o governo no fim de janeiro, mas não houve sucesso.
O que diz a Lei 10.820/24 e o que ela mudava para a educação indígena
• Educação escolar indígena: entenda a disputa entre o governo do Pará e manifestantes
Aprovada em dezembro de 2024, a Lei 10.820/24 unificou 68 artigos do sistema de leis aplicáveis ao ensino público estadual.
Para fazer a unificação, várias leis estaduais da educação foram revogadas, como a Lei nº 7.806, de 29 de abril de 2014.
A Lei nº 7.806, conhecida como Sistema Modular de Ensino (Some), trazia regras sobre o funcionamento das aulas em áreas distantes dos centros urbanos, como as aldeias indígenas.
Segundo os indígenas, a Lei 10.820/24, ao revogar a Lei nº 7.806, extinguiu tanto o Some, quanto a extensão dele, o Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (Somei) — responsável por levar ensino médio presencial às comunidades indígenas.
Já de acordo com o governo do Pará, a Lei 10.820/24 garante, no artigo 46, a continuidade do sistema Some. Ainda segundo o governo, “áreas que já contam com o Some continuam sendo atendidas”.
A Lei 10.820/24 não mencionava o ensino indígena. A ausência, para os indígenas que ocupavam o prédio da Seduc, trazia insegurança jurídica ao não mencionar o funcionamento do Somei. Para os manifestantes, a nova lei do magistério do Pará abria uma brecha para a extinção gradativa do ensino modular presencial indígena.
Professores revogaram a greve
Na segunda-feira (10), os professores da rede estadual de ensino decidiram, em assembleia nesta suspender a greve. A categoria parou atividades em 23 de janeiro.
Os professores da rede estadual de ensino do Pará pediam (assim como os indígenas) a revogação da Lei nº 10.820. Segundo os educadores, a nova lei traz uma série de prejuízos, entre eles, mudanças na carga horária, em gratificações e no plano de carreira.
A suspensão da greve foi definida após o governador Helder Barbalho (MDB-PA) assinar termo de compromisso se comprometendo a revogar a Lei 10.820/2024, que altera o funcionamento do Sistema de Ensino Modular Indígena (Somei).
Ambos grupos eram contra a troca de aulas presenciais por aulas on-line e apontam inseguranças jurídicas com Lei nº 10.820. De acordo com as categorias, a lei altera o Some (Sistema Modular de Ensino) que garante aulas em localidades distantes e de difícil acesso, como o caso de aldeias indígenas que não possuem fornecimento de energia.
![]() |
Auricelia Arapiuns, liderança indígena da região Baixo Tapajós, no Pará, faz parte do grupo que ocupa a sede da Secretaria. — Foto: Nay Jinknss |
![]() |
Deputados definem membros das comissões da Alepa. — Foto: Ozéas Santos (AID/ALEPA) |
![]() |
Lideranças indígenas acompanham de perto, dentro da Alepa, a votação. — Foto: Taymã Carneiro / g1 |
Foto capa: Taymã Carneiro/g1
Por Taymã Carneiro, Thaís Neves, Marcus Passos, Juliana Bessa, g1 Pará — Belém
Fonte: g1