STJ considera amamentação como trabalho e reduz pena de mãe presa por tráfico de dr0g4s

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Via @portalg1 | O Superior Tribunal de Justiça (STJ) reduziu a pena de uma mãe presa após considerar a amamentação da filha recém-nascida como trabalho na creche da Penitenciária de Mogi Guaçu (SP), função que garantiria automaticamente a diminuição do tempo de prisão.

A mulher foi presa em abril de 2023 após ser condenada a cumprir pena de 13 anos e 4 meses de prisão por tráfico de drogas, além do pagamento de multa de quase R$ 72 mil. A bebê nasceu em setembro do mesmo ano e foi amamentada por 6 meses, como é garantido por lei, até ser retirada da mãe.

⚖️ A lei penal brasileira determina que as pessoas presas podem diminuir o tempo de sua pena em 1 dia para cada 3 dias trabalhados ou estudados. Assim, como a mulher amamentou por 6 meses, a Defensoria Pública de São Paulo pediu a redução de 2 meses na condenação.

Para o ministro do STJ Messod Azulay Neto, a presa tem direito de ter a amamentação considerada como trabalho dentro da cadeia. O magistrado citou que a mulher teria a redução da pena assegurada caso ela trabalhasse na creche do presídio.

"Desigualdade seria impedir a remição pelo cuidado do próprio filho, enquanto se concede a remição pelo cuidado dos filhos de outras detentas", sustenta Azulay Neto.

Setor usado pelas mães no presídio de Mogi Guaçu, em São Paulo — Foto: Fernando Evans/g1 e Defensoria Pública

Outro ponto destacado pelo STJ é o fato de que a amamentação não gera remuneração ao preso, como um trabalho formal desempenhado dentro ou fora da prisão. "A ausência 'expressão econômica' não impede o reconhecimento da remição", diz o ministro.

Mãe e filha foram separadas em março de 2024: a mulher foi transferida para a Penitenciária Feminina de Sant'Ana, que fica na Zona Norte da cidade de São Paulo. Já a bebê foi levada aos cuidados da avó materna, em Piracicaba (SP), a 160 km da capital. O pai também está preso.

Em São Paulo, estado em que a mulher está presa, estão presas atualmente 54 grávidas e 44 mulheres que amamentam os seus bebês recém-nascidos (leia mais ao fim da reportagem). Ao todo, foram 61 partos registrados em presídios paulistas em 2024.

Defensoria: decisão inédita nacionalmente

A Defensoria Pública de São Paulo afirma que é a primeira vez que um tribunal nacional reconhece a economia do cuidado -- trabalho não remunerado que envolve cuidar de crianças, idosos, pessoas com deficiência e do lar -- para reduzir a pena de uma mãe que amamentou um filho na prisão.

O defensor Bruno Shimizu, coordenador do Núcleo Especializado de Situação Carcerária, considera que o STJ "cumpriu o mandamento de igualdade de gênero previsto na Constituição Federal".

"Ainda que a lei de execuções penais não traga previsão específica nesse sentido, é uma discriminação evidente que a amamentação, essa atividade socialmente essencial e desgastante física e mentalmente, não seja reconhecida. Em uma sociedade patriarcal, feito a nossa, o cuidado acaba quase sempre sendo atribuído às mulheres", afirma.

Com a decisão, a mulher terá antecipado em dois meses o direito a ir do regime fechado para o semiaberto -- em que a pessoa estuda ou trabalha durante o dia e à noite dorme na prisão -- e, depois, de ser solta de forma definitiva -- ao terminar o cumprimento da pena, agora previso para abril de 2029.

⏳ A conta para se saber o tempo que o preso ficará atrás das grades até progredir de regime depende de alguns fatores, como o tipo de crime praticado, se têm bom ou mau comportamento, registro de trabalho e estudo dentro da prisão.

No caso da mulher, ela é reincidente, responde por tráfico de drogas (deve-se cumprir ao menos 40% da pena antes de ter direito à progressão) e tem prazo mínimo aumentado antes de ir para semiaberto ou aberto.

Decisão similar em SP

Já houve decisão similar no Tribunal de Justiça de São Paulo, em 2024. Na época, a Justiça paulista reduziu o prazo para conceder progressão do regime fechado para o semiaberto de uma mulher presa por ela ter amamentado seu filho. Foi uma decisão inédita no estado, naquele momento.

Há um trecho específico para grávidas que estão presas na lei de execuções penais. Ele assegura que a gestante ou lactante tenha tratamento humanitário no parto e pós-parto. A grávida pode ter prisão em regime fechado alterado para prisão domiciliar se o crime não for cometido com violência, grave ameaça à vítima ou cometido contra seu filho ou dependente.

A lei não determina, porém, qual prazo mínimo de convívio entre mãe e bebê até a separação -- como aconteceu neste caso.

São Paulo tem no momento 54 mulheres grávidas e 44 presas com seus bebês recém-nascidos, segundo dados da Secretaria da Administração Penitenciária (SAP), do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos). Ao todo, foram registrados 61 partos em presídios paulistas ao longo de 2024.

Segundo a SAP, as presas grávidas passam por exames de pré-natal, teste de antígenos, vacinação, orientações pós-parto e têm estrutura para fazer a amamentação. Ao g1, a pasta afirmou que todas as unidades penitenciárias femininas possuem estrutura para acolher gestantes e bebês, além de oferecer kits de higiene pessoal e íntima para as presas.

"Os presídios dispõem de equipe básica de saúde, composta por médico, enfermeiro, dentista e auxiliar de enfermagem, em parceria com os municípios onde estão situados", informa a SAP.

Por Arthur Stabile, Isabela Leite, g1 e GloboNews — São Paulo
Fonte: g1

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