PM é punida com permanência disciplinar em quartel por publicar vídeos de atividades policiais nas redes

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Via @diariodonordeste | Uma soldada da Polícia Militar do Ceará (PMCE) foi punida com permanência disciplinar de 2 dias no quartel, por publicar vídeos nas redes sociais sobre as atividades policiais que ela tem na Corporação. A decisão administrativa, publicada em portaria no Boletim do Comando Geral da última sexta-feira (4), cabe recursos. A defesa da policial alega inocência e garante que irá recorrer.

Conforme documento obtido pelo Diário do Nordeste, a portaria cita dois vídeos que a soldada Mayara Kelly Melo Mota publicou nas redes sociais, em que "aparece fardada, nas dependências do quartel, lavando uma viatura da Corporação e, em outro vídeo, também fardada, realizando uma demonstração do uso de torniquete" (instrumento utilizado para controlar sangramentos).

A sindicante que coordenou a investigação administrativa recomendou a punição de permanência disciplinar de 2 dias para a PM, e o Comando concordou. A reportagem apurou que a investigada já tinha recebido advertência de militar superior sobre a publicação dos vídeos.

Conforme a decisão do Comando, "embora o princípio da liberdade de expressão assegure aos indivíduos o direito de manterem perfis pessoais em redes sociais, a utilização do fardamento oficial, bem como a exposição de viaturas e demais elementos característicos da atividade policial militar, constitui clara representação da instituição Polícia Militar do Ceará (PMCE), não devendo tais símbolos institucionais serem utilizados em publicações de caráter particular sem a devida autorização, sob pena de afetar a necessária disciplina e o decoro que regem a atividade militar".

O que diz a defesa da policial

A defesa de Mayara Kelly, representada pelo advogado Sabino Sá, rebate que "o vídeo em que a policial ensina seus seguidores como fazer um torniquete, na verdade, trata-se de um vídeo de utilidade pública, uma vez que o intuito é meramente informativo, educativo e partiu de vivência própria da militar, que tem um irmão policial militar, que foi atingido por disparo de arma de fogo quando atuava contra o crime organizado e veio a ser atingido na perna, na veia femoral".

"O segundo vídeo em que a PM aparece lavando uma viatura, nada mais fez do que enaltecer o trabalho das mulheres nas polícias militares, não só do Ceará, mas do Brasil, visto que hoje as mulheres trabalham onde querem, sem qualquer distinção, e Mayara na qualidade de motorista da viatura, tinha responsabilidade legal de lavar a viatura ao término do serviço." Sabino Sá — Advogado de defesa

O caso ganhou repercussão nas redes sociais, com conotação negativa para a punição. A Polícia Militar do Ceará emitiu "Nota de Esclarecimento" para destacar que "a Sindicância a qual a citada PM, que aqui, por questão de proteção a ela, não será citada, foi submetida e que culminou em sanção disciplinar, contou com ampla defesa e contraditório, e ainda possui prazo para recurso correndo, tudo previsto no Código Disciplinar PM e BM".

"A PMCE reafirma seu compromisso com a disciplina, a hierarquia, pilares básicos dessa corporação que completará 190 anos mês que vem, além do compromisso com a ética profissional e o respeito às normas institucionais e militares, principalmente no que tange aos dados de seus componentes, que trouxeram a corporação até a idade que tem", completou a Corporação.

O que é 'permanência disciplinar'?

Segundo o artigo 17 do Código Disciplinar da Polícia Militar do Ceará e do Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Ceará, "a permanência disciplinar é a sanção em que o transgressor ficará na OPM ou OBM (Organização Militar), sem estar circunscrito a determinado compartimento".

O advogado e promotor de Justiça Militar aposentado, Brasilino de Freitas, esclarece que "a permanência disciplinar é uma punição administrativa em que o militar fica no quartel onde está lotado, sem local específico, trabalhando normalmente, atendendo a Ordem Unida e serviços internos e externos".

O artigo 18 do Código Disciplinar acrescenta que, "a pedido do transgressor, o cumprimento da sanção de permanência disciplinar poderá, a juízo devidamente motivado, da autoridade que aplicou a punição, ser convertido em prestação de serviço extraordinário, desde que não implique prejuízo para a manutenção da hierarquia e da disciplina".

A investigação concluiu ainda que a policial militar cometeu uma transgressão disciplinar de natureza grave, com reincidência, mas ponderou os atenuantes de que a PM tem bom comportamento, presta serviços relevantes à sociedade e colaborou com a apuração da transgressão disciplinar.

A falta gravel é punível "com permanência disciplinar de até 10 (dez) dias ou custódia disciplinar de até 8 (oito) dias e, na reincidência, com permanência de até 20 (vinte) dias ou custódia disciplinar de até 15 (quinze) dias, desde que não caiba demissão ou expulsão", segundo o Código Disciplinar.

A Sindicância administrativa considerou também que a soldada PM Mayara Kelly Melo Mota violou os seguintes deveres militares, previstos no Código Disciplinar:

• XV - zelar pelo bom nome da Instituição Militar e de seus componentes, aceitando seus valores e cumprindo seus deveres éticos e le­gais;

• XXVII - observar as normas de boa educação e de discrição nas atitudes, maneiras e na linguagem escrita ou falada;

• XXVIII - não solicitar publicidade ou provocá-lo visando a própria promoção pessoal.

A defesa de Mayara Kelly afirmou que o enquadramento de violação dos três deveres militares "trata-se de um equívoco interpretativo, visto que as condutas praticadas pela militar, quando gravou dois vídeos e publicou em sua rede social, Instagram, não configuram condutas previstas nos referidos artigos e incisos".

Brasilino de Freitas ressalta que "o militar tem uma profissão restritiva, mesmo. Eles têm restrições, que precisam acatar. Inclusive, porque é imposta por ordem do Comando". Uma das restrições, segundo o promotor de Justiça Militar aposentado, é filmar e expôr a rotina dos quartéis.

Para a defesa da policial militar, "o Comando da Corporação despreza ou desconhece a portaria interministerial nº 2/2010, da Secretaria de Direitos Humanos do Ministério da Justiça, que estabeleceu diretrizes de Valorização da dignidade da liberdade de expressão e da imagem social dos profissionais da segurança pública, quando estabelece inúmeras diretrizes de garantia dos direitos humanos dos profissionais de Segurança Pública, dentre eles a garantia da liberdade de expressão".

"A defesa reafirma a inocência da policial militar Mayara Gomes, e logo que foi intimado da decisão, utilizará dos recursos legais, contando com a sensibilidade e o senso de justiça do Comandante Geral, para anular a injusta punição", conclui o advogado Sabino Sá.

Confira a nota da defesa na íntegra:

"A defesa da policial militar Mayara Kelly Gomes, recebeu com surpresa a decisão de punição administrativa, 02 dias de permanência disciplinar, quando a militar deverá ficar aquartelada, distante de sua família e de dois filhos menores que necessitam de seus cuidados.

Acusação de que a referida policial teria transgredido normas disciplinares previstas no art. 8º, inc. XV, XXVII e XXVIII, art. 13º §1º, inc. X, da lei 13.407/2003, código disciplina dos militares estaduais, trata-se de um equívoco interpretativo, visto que as condutas praticadas pela militar, quando gravou dois vídeos e publicou em sua rede social, Instagram, não configuram condutas previstas nos referidos artigos e incisos.

Destaque que o vídeo em que a policial ensina seus seguidores como fazer um torniquete, na verdade, trata-se de um vídeo de utilidade pública, uma vez que o intuito é meramente informativo, educativo e partiu de vivência própria da militar, que tem um irmão policial militar, que foi atingido por disparo de arma de fogo quando atuava contra o crime organizado e veio a ser atingido na perna,  na veia femoral, nesta oportunidade o irmão dela fez o torniquete, sendo este o responsável pelo policial ter sobrevivido ao disparo, pois, o torniquete evitou a grande perda de sangue que se iniciou com o disparo sofrido.

O segundo vídeo em que a PM aparece lavando uma viatura, nada mais fez do que enaltecer o trabalho das mulheres nas polícias militares, não só do Ceará, mas o Brasil, visto que hoje as mulheres trabalham onde querem, sem qualquer distinção, e Mayara na qualidade de motorista da viatura, tinha responsabilidade legal de lavar a viatura ao término do serviço.

Como visto esses dois vídeos que a Mayara publicou, não configuram a transgressão prevista no art. 13, inc. X, uma vez que ela não publicou fatos, documentos ou assuntos administrativos, que prejudicassem ou concorrerem para o desprestígio da instituição. Não se observa nos vídeos a publicação de documento interno, não se observa a divulgação de informações de interesse técnico administrativo ou judicial, não se vê nos vídeos divulgação de informação de operações policiais de técnicas policiais de combate ao crime, por exemplo.

Logo, as condutas em hipótese alguma amolda-se aos tipos legais, razão pela qual não poderia emergir qualquer punição, que injustas apenas desmotiva, revolta e embrutece os militares.

É certo que a liberdade de expressão dos militares, é mitigada, porém como tudo no direito brasileiro não é absoluta, a liberdade de expressão, mitigada, proíbe o policial de fazer críticas contra seus superiores ou contra as autoridades públicas e judiciais, o que não foi o caso da Mayara. Também o militar não pode divulgar informações internas da corporação técnicas de ações policiais ou qualquer tipo de documento ou informação que possa causar prejuízo a corporação e a sociedade. Os conteúdos divulgados relatam a rotina profissional da militar, não possui natureza técnica ou administrativa sensível, tão pouco causou prejuízo ou possui potencial significativo para causar desprestígio, prejuízo a corporação, as operações policiais, por pura ausência de qualquer divulgação de informação sigilosa ou técnica policial sigilosa, seja administrativa ou judicial.

Diga igual modo, Mayara não feriu os deveres militares, previstos no art. 8º, inc. XV, que tratam do zelo que eu o militar tem que ter com bom nome da instituição, Mayara nada fez que prejudicasse o nome da PMCE; também não feriu o dever militar constante do inciso XXVII, observar a boa educação, as atitudes, as maneiras e a linguagem escrita e falada, Mayara não foi deseducada, não usou linguajar chulo ou expressões incompatíveis com a função de um policial militar , por fim , Mayara não utilizou o vídeo para promoção pessoal, pois suas redes sociais que contam com milhares de seguidores já existia antes de ingressar nos quadros da corporação, diga-se suas redes sociais não são monetizadas.

Finalmente, diga-se, que o comando da corporação despreza ou desconhece a portaria interministerial nº 2/2010, da secretaria de direitos humanos do Ministério da Justiça que estabeleceu diretrizes de Valorização da dignidade da liberdade de expressão e da imagem social dos profissionais da segurança pública, quando estabelece inúmeras diretrizes de garantia dos direitos humanos dos profissionais de Segurança Pública dentre eles a garantia da liberdade de expressão.

A defesa reafirma a inocência da policial militar Mayara Gomes, e logo que foi intimado da decisão, utilizará dos recursos legais, contando com a sensibilidade e o senso de justiça do comandante geral, para anular a injusta punição."

Fonte: diariodonordeste.verdesmares.com.br

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